Olhar Direto

Quinta-feira, 25 de abril de 2024

Opinião

A Era da Insegurança Contratual

É inviável a fixação do período do surgimento dos contratos, na medida em que sua ocorrência confunde-se com a própria evolução moral da humanidade.

Poderíamos dizer que inclusive antecede ao ser humano moderno, o homo sapiens, uma vez que a vida em sociedade pressupõe a existência de composições e acordos, e outras subespécies humanas já viviam em sociedade avançadas e complexas milhares de anos atrás, como é o caso do Homo Neanderthalensis.

Naturalmente que esse é um debate que deve ser realizado por antropólogos e não é o escopo deste artigo, mas entendo ser interessante a visualização da discussão para compreendermos quão antigo é o instituto dos contratos.

Pois bem, é possível buscar um período histórico em que a sistematização dos contratos tornou-se nítida para os investigadores.

O direito romano foi um dos primeiros a sistematizar o direito contratual, quando distinguiu contrato de convenção. A última representava gênero, do qual o contrato e o pacto eram espécies. Hodiernamente, entretanto, tais expressões não são mais empregadas como sinônimos, apesar da praxe de se designar os contratos acessórios de pactos (pacto comissário, pacto antenupcial, etc.).

Uma das maiores contribuições à sistematização dos direitos contratuais foi conferida pelo movimento iluminista francês, que firmara a vontade racional do homem, determinando, assim, uma valorização da “força obrigatória do contrato”, levando à consequência da consagração do brocardo latino pacta sunt servanda.

Com a elevação da “autonomia da vontade” à categoria de preceito máximo refletiu-se amplamente em toda a concepção dos contratos até o final do século XIX e início do seguinte, pois era consenso o pensamento de que sempre que houvesse um contrato, as partes teriam discutido livremente suas condições e em situação de igualdade.

Com os dois princípios basilares do direito contratual, sendo a “autonomia da vontade” e a “força obrigatória dos contratos”, fica praticamente norteado e muito bem estruturado todo o funcionamento do direito contratual.

Entretanto, com o agigantamento mastodôntico do tamanho dos Estados por todo o mundo querendo regular e limitar todas as áreas da vida do ser humano, iniciou-se uma corrida Estatal pela criação de limitações legais à livre contratação entre indivíduos, além de incontáveis limitações ao empreendedorismo.

Ninguém menos que o próprio Miguel Reale, que encabeçou a comissão elaboradora do projeto de lei que deu origem ao atual Código Civil, confessou que o uso da vaga e imprecisa expressão "função social" foi proposital, com o intuito de permitir "soluções equitativas".

Seja lá qual será a solução equitativa que cada juiz tem em sua cabeça, até porque somos todos diferentes, e pensamos diferentes.

Assim, positivou-se a famigerada “função social do contrato” determinando que os contratos não podem ser utilizados de forma “abusiva” causando dano às partes, excedendo seu fim econômico, social de boa-fé ou bons costumes.

Não havendo agressão a direito de terceiros, não há que o Estado intervir na vontade das pessoas quando livremente contratam.

Ora, se nenhuma das partes está com uma arma apontada na cabeça ao assinar os contratos, e possuem a liberdade completa de contratar ou recusar, não há porque o Estado se meter na livre vontade das pessoas em contratarem com quem quiserem e se quiserem.

E se a estão contratando, é porque ambas acreditam piamente que é o melhor para si.
A “função social do contrato” é expressão tão ampla e subjetiva que dá enorme margem a interpretações das mais diversas para a posterior interpretação do contrato pelas partes, destruindo completamente a segurança jurídica fornecida pelo contrato.

Estamos em uma momento histórico em que o contrato já não possui valor algum, e ninguém sabe se o que foi livremente contratado será  cumprido ou não.
 
 
Manoel Guilherme Cavalcanti é Advogado especializado em Direito Empresarial e Civil.
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