Olhar Direto

Sexta-feira, 19 de abril de 2024

Opinião

Rir e chorar

Na espécie animal os humanos são os únicos seres que nascem com a capacidade de rir e de chorar. Melhor dizendo: somos os únicos que vertemos lágrimas e gargalhamos. 

Pena que não possamos usar como deveríamos essas duas válvulas de escape e de equilíbrio emocional. 
As regras que regem o nosso comportamento em público são ditadas pela sociedade em que vivemos, e elas cerceiam a nossa espontaneidade de rir e chorar em qualquer lugar ou a qualquer hora. 

Uma cultura arcaica, mas que vem se prolongando através dos anos, nos ensina que a sisudez é sinal de confiabilidade e bons modos e que o choro é sinal de fragilidade. 

Somos condicionados desde os primeiros anos de vida a abafar todo e qualquer sentimento mais forte.  Para o gênero masculino então!, é absolutamente vedada a manifestação pública de fraqueza causada pelo choro. 
As mulheres, consideradas historicamente como histéricas, foram um pouco mais liberadas nesse quesito. Elas, com coragem e destemor, choram sem nenhum constrangimento. Dominam como ninguém a arte de chorar em público. 

No entanto, as mulheres são muito mais cobradas socialmente no tocante às gargalhadas escancaradas, sempre consideradas vulgares. 

Séculos e séculos se passaram e as coisas não mudaram muito nesse sentido. 

Mulheres gargalhantes ainda transmitem, em algumas rodas, a sensação de promiscuidade.  Homens chorões a de afeminados. 

Diante desse quadro obsoleto, reprimimos o que há de mais eficiente para o equilíbrio emocional, exatamente o chorar e o rir. Essa é a maneira de como deveria se processar a nossa catarse no cotidiano. 

Quem nunca experimentou o imenso alívio que o mergulho intenso no pranto consegue trazer em momentos de grande infelicidade? É como se saíssemos totalmente renovados do fundo de um poço. 

O mesmo acontece com a gargalhada escancarada, quase pornográfica, também difícil de ser retirada do baú das hipocrisias da vida. 

Após estudos científicos na área da neurologia, atualmente sabemos que ambos os estados liberam enzimas importantes para o nosso equilíbrio físico e mental e, tal como em outras repressões, se transformam em danos irreversíveis se não liberadas.  

Nós que vivemos em países do futuro, ainda não prontos, temos obrigação de vivenciar o riso e o choro para que possamos nos manter razoavelmente saudáveis diante das instabilidades corriqueiras a que somos submetidos nesses quinhentos anos de baixos, mais que de altos. 

Isso talvez explique a necessidade de festas populares, a exemplo do Carnaval, com toda a sua alegria fabricada pela ausência de alguns dias de repressão. 

Felizmente a nossa raça miscigenada tem muito da ingenuidade da criança, conseguindo assim extravasar os seus sentimentos de uma forma mais livre.

O mesmo se aplica a todas as outras repressões, inclusive a mais doentia, a sexual, com as quais lidamos bem melhor que os países ditos desenvolvidos. 

Sorte nossa, porque nesses quinhentos anos de desencontros e desmandos, não fossem essas nossas características mais primitivas seríamos o maior conglomerado de neuróticos da face da Terra. 

Por uma dessas ironias do destino, essa alienação generalizada é o que nos salva, ao mesmo tempo em que nos condena.

Gabriel Novis Neves
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