Olhar Direto

Sexta-feira, 29 de março de 2024

Opinião

A maldade por trás da PEC 55/2016

Muito se fala sobre a PEC do Novo Regime Fiscal (PEC 55/2016),  em tramitação no Senado Federal,  aprovada na Câmara Federal com o antigo número PEC 241/2016.

Este pequeno texto não tem a pretensão de esgotar o assunto, nem mesmo ditar a verdade absoluta dos fatos, apenas apresentar algumas pequenas reflexões sobre o tema tão debatido nos últimos dias.

De acordo com o projeto proposto, existirão 05 limites de gastos para cada um dos seguintesPoderes e Órgãos:

1 – Poder Executivo;
2 – Poder Judiciário;
3 – Poder Legislativo;
4 – Ministério Público;
5 – Defensoria Pública.

Acontece que cada um desses Órgãos/Poderes escolhe como deve realizar seus gastos, definindo o que é prioridade em seu planejamento de aquisições, contratações, investimentos, etc.

O Poder Executivo é o que determina como é administrado o dinheiro que vai para a educação, saúde, infra-estrutura, segurança pública, bolsa família, minha casa minha vida, enfim, a grande maioria dos serviços públicos e programas sociais.

Os demais: Poder Judiciário, Poder Legislativo, Ministério Público e Defensoria Pública, administram os recursos para o funcionamento de suas atividades.

Seus recursos visam desde a construção de novos prédios (novas varas do Poder Judiciário ou novas sedes da Defensoria Pública), aquisição de móveis, até a aquisição de cafezinhos para os Senadores e Deputados (Poder Legislativo).

Observe que cada Órgão/Poder administra seus recursos de forma independente um do outro.

Portanto, aquela máxima de: “tire o cafezinho dos Deputados e transfira esses valores para a Saúde”, não encontra obstáculo na PEC, mas é constitucionalmente  impraticável, já que cada Órgão/Poder irá administrar segundo as suas necessidades.

No Direito Constitucional isso se chama autonomia administrativa e financeira.

Cada um dos limites será corrigido para a cada ano com base na variação do IPCA, um dos índices oficiais do governo federal.

Segundo o IPCA de 2015, a inflação no ano passado atingiu o acumulado de 10,67%, então se a PEC já estivesse em vigor, seria aumentado esse percentual no orçamento de cada uma daqueles Órgãos neste ano de 2016.

Porém, raciocina comigo: o governo fala que a inflação em 2015 foi de apenas 10,67%, isto quer dizer que se você pagava R$ 100,00 na conta de energia elétrica, ela subiu este ano apenas para R$ 110,67.

Pergunto, foi isso o que aconteceu?

Claro que não! 

Isso porque muitos produtos e serviços tem seus preços aumentados bem acima da “inflação oficial”.

Outro exemplo: vários materiais que são adquiridos para serem utilizados em procedimentos médicos na saúde pública, por hospitais, policlínicas e postos de saúde (SUS), tem a sua variação vinculada ao valor do dólar, de modo que o preço pode aumentar muito mais, bem diferente da “inflação oficial”.

Veja, a PEC tem o objetivo de criar um TETO de gastos, limitada à“inflação oficial” dos próximos 20 anos.
Agora imagine, o que poderá ser comprado com o mesmo valor, atualizado apenas pela “inflação oficial”, depois de 20 anos nas áreas da saúde e educação?

Se já existe hoje uma deficiência na saúde e educação pública, imagine daqui 20 anos, com muito menos recursos.

Isso mesmo, o dinheiro para saúde e para a educação pública será simplesmente corroído pela inflação, não aquela “inflação oficial”, mas por aquela inflação da energia elétrica, do combustível, do dólar, do feijão.

Ah sim, lembre-se do aumento no preço do feijão.

É interessante notar que não se sujeitarão aos limites os gastos relativos às eleições (de interesse de todos os políticos) e os gastos com as empresas estatais (ex: Petrobrás – que teve tantos recursos desviados conforme amplamente divulgados na imprensa).

Agora observe a parte boa da pec:

Se os limites forem ultrapassados por qualquer um daqueles Órgãos/Poder (e com certeza serão já que será praticamente impossível administrar com a diminuição gradativa de recursos que serão corroídos pelos próximos 20 anos), haverá punições severas para os gestores:

1 – os servidores não terão reajuste de seus salários (quem é servidor pode esquecer o direito ao aumento de sua remuneração, RGA, etc);

2 – não serão criados cargos públicos e nem serão contratados pessoal para a prestação de serviços públicos (quem de alguma forma trabalha em órgão público, exemplo estagiários, terceirizados, dentre outros,  abra bem seus olhos, pode vir demissão por aí);

3 – não serão realizados concursos públicos (quem sonha e estuda para concurso público, pode esquecer);

4 – não haverá criações ou expansões de programas sociais ex: bolsa família, minha casa minha vida ou linhas de financiamento (fies), dentre outros (quem sonha com o aumento desses benefícios ou em ser aprovado para recebê-los, também pode esquecer);

5 –não haverá concessões ou ampliações de incentivo fiscais para empresas. (para os empresários também serão cortados os incentivos fiscais que podem auxiliar na geração de empregos e  circulação de riquezas);

Parece-me que as punições são para toda a sociedade e não para os gestores, não é verdade?

Olha só, se a PEC ataca: os serviços públicos, os servidores, as empresas, os empresários, aqueles que utilizam os serviços de saúde e educação, então quem sobra? Para onde irão as reservas que se pretende economizar?

Irei responder, antes, porém, não posso deixar de registrar o pior de todos os  ataques dessa PEC, em minha singela opinião, atingem diretamente a educação e a  saúde, citarei parte do texto legal e logo abaixo e comentarei:
 
“ART. 105. NA VIGÊNCIA DO NOVO REGIME FISCAL, AS APLICAÇÕES MÍNIMAS EM AÇÕES E SERVIÇOS PÚBLICOS DE SAÚDE E EM MANUTENÇÃO E DESENVOLVIMENTO DO ENSINO EQUIVALERÃO:

I - NO EXERCÍCIO DE 2017, ÀS APLICAÇÕES MÍNIMAS CALCULADAS NOS TERMOS DO INCISO I DO § 2º DO ART. 198 E DO CAPUT DO ART. 212, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL”; E  

[De acordo com o artigo acima, em 2017 haverá a aplicação de 15% das receitas nos serviços de saúde e 18% dos impostos para a educação, conforme determina a Constituição Federal].  

II - NOS EXERCÍCIOS POSTERIORES, AOS VALORES CALCULADOS PARA AS APLICAÇÕES MÍNIMAS DO EXERCÍCIO IMEDIATAMENTE ANTERIOR, CORRIGIDOS NA FORMA ESTABELECIDA PELO INCISO II DO § 1º DO ART. 102 DESTE ATO DAS DISPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS TRANSITÓRIAS.”

[A partir de 2018 será aplicado apenas o IPCA “inflação oficial”, desvinculando a conquista que a Constituição da República trouxe de fixação mínima dos recursos públicos nos serviços de saúde e educação pública]. 

Então como será a educação pública e a saúde pública da nossa pátria amada Brasil daqui 20 anos?

Como construir uma nação com o sucateamento da saúde e da educação nos próximos 20 anos?

Ah, um detalhe, o Governo Federal demonstrou sua “flexibilidade”, o projeto proposto poderá ter uma revisão daqui 10 anos.

Detalhe:  será uma revisão de método.

O que é o método?

Talvez o índice.

Quem sabe até lá não inventam um índice que corrige um pouco menos a ”inflação oficial” do que o IPCA.
Só mais um pequeno detalhe:

Como aceitar um projeto que tem como objetivo definir o orçamento (leia-se administrar o país) pelos próximos vinte anos, quando o governo que está propondo tem apenas mais 02 (dois) anos pela frente?

Como pode esse Governo Federal ter a pretensão de decidir o futuro, a atuação,  a administração dos próximos 05 (cinco) Presidentes ?

Isso é correto ? a mim não me parece justo !

Lembra-se do que falei acima: que a PEC ataca toda a sociedade desde o serviço público, os servidores públicos, as empresas, os empresários, até os alunos das escolas e os doentes que necessitam do SUS?

Então quem sobrou? Para onde irá a “economia” dos recursos públicos? Quem será beneficiado com a PEC 55/2016?

Simples, a PEC não fala nada de limitar os gastos com juros e amortização de dívidas: todo o dinheiro público “economizado” não será investido em nada, será apenas usado para pagar os JUROS aos BANCOS.

Se você que está lendo este artigo for dono de algum Banco, parabéns a PEC 55/2016 será muito boa para você.

Agora se você faz parte dos 99% dos brasileiros que não possuem um Banco, pergunto: Por que defender a PEC 55/2016 ?    

Enquanto isso, na crise econômica pela qual estamos passando, só ouvimos falar nos casos de corrupção e nos altos lucros dos Bancos ...

Leia você mesmo o texto original da PEC:

http://www.senado.leg.br/atividade/rotinas/materia/getTexto.asp?t=201940&c=PDF&tp=1
 
Rodrigo de Freitas é bacharel em Direito, pós-graduado em Direito Público, técnico judiciário do Tribunal Regional Eleitoral de Mato Grosso e diretor jurídico do Sindicato dos Servidores do Poder Judiciário Federal do Estado de Mato Grosso.
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