Olhar Direto

Quinta-feira, 28 de março de 2024

Opinião

Será apenas uma utopia republicana?

Cientistas Políticos de todos os lugares do mundo sonham todos os dias com um Estado que de fato pudesse funcionar, não só na teoria, mas também na prática. Um Estado liberal, democrático, social e republicano:

Liberal, porque garantiria os direitos civis, como o direito de ter uma propriedade inviolável, o direito de ir e vir, direito de expressar suas opiniões, o direito de ter um comércio, o direito de não sofrer abuso de poder por parte das autoridades e por aí vai.

Democrático, porque garantiria os direitos políticos, como o direito de votar e ser votado, de eleger representantes públicos e de até instituir leis através de projetos de iniciativa popular. 

Social, porque também garantiria os direitos sociais, como o direito à Habitação, à Alimentação, à Educação, à Saúde, à Segurança, à Justiça e etc.

Por fim, republicano, porque garantiria o direito de os cidadãos participarem da política e exercerem o controle social juntos as instituições públicas; a fim de proteger o patrimônio político, econômico, cultural e ambiental...

Entretanto, essa ficção jurídica, na prática, está longe de alcançar a teoria idealizada por aqueles filósofos políticos, sobretudo, nos países subdesenvolvidos, nos quais a educação dos cidadãos foi mutilada ao ponto de se ter uma sociedade civil desunida, desorganizada, com uma consciência política fragilizada e o que é pior: cheia de preconceitos e pré-juízos de valores. Isso, por falta de uma educação de qualidade universalizada que o Estado Brasileiro nunca teve a coragem de ofertar, pois sempre foi controlado por uma oligarquia política nada solidária.    

Assim, consequentemente, dessa sociedade desestruturada nasce uma classe política corporativista, corrupta, individualista que só pensa em tirar proveito do Estado para beneficiar os interesses privados, apropriando-se do patrimônio público como se fosse sua propriedade particular.

Contudo, diante disso surge a revolta popular que, na maioria das vezes, infelizmente, é movida por opiniões radicais que não conseguem propor uma mudança efetiva na prática. Desta forma, no meio dessa revolta e do descontentamento geral, surgem os que almejam uma intervenção militar, como se essa saída fosse resolver todos os problemas políticos e econômicos do país.

Mesmo que, para isso, tivesse que sacrificar a própria democracia, os direitos civis e qualquer proteção jurídica que o cidadão tem para evitar os abusos de poder cometidos por autoridades – abusos esses que são conceituados como os atos humanos de se prevalecer de cargos para fazer valer vontades particulares.

No entanto, a democracia é um sistema que se opõe a este tipo de atitude. A verdade é que um Estado militarista não garantiu uma vida de estabilidade e segurança para as pessoas nem durante a ditadura militar e muito menos na atualidade.

Porém, isso não quer dizer que os militares não sejam importantes para o país. Pelo contrário, eles são de suma importância para garantir a Lei e a Ordem Pública, mas dentro dos limites que o Estado constitucional apregoa para eles, ou seja, em suas respectivas áreas de atuação.    

Então, diante de todos os segmentos da sociedade: seja de esquerda ou de direita, radicais ou pacifistas religiosos, intervencionistas e até monarquistas, cabe aqui a parábola dos porcos-espinhos, do pensador Arthur Schopenhauer:

Durante a era glacial, muitos animais morriam por causa do frio. Os porcos-espinhos, percebendo a situação, resolveram se juntar em grupos, assim se agasalhavam e se protegiam mutuamente, mas os espinhos de cada um feriam os companheiros mais próximos, justamente os que ofereciam mais calor. Por isso decidiram se afastar uns dos outros e começaram de novo a morrer congelados.

Então, precisaram fazer uma escolha: ou desapareciam da Terra ou aceitavam os espinhos dos companheiros. Com sabedoria, decidiram voltar a ficar juntos. Aprenderam assim a conviver com as pequenas feridas que a relação com uma pessoa muito próxima podia causar, já que o mais importante era o calor do outro. E assim sobreviveram.

Ou seja, diante da ingerência e da irresponsabilidade daqueles que deveriam representar o Estado, a intolerância e o radicalismo não podem prevalecer. Não é através da desordem, da perturbação da ordem pública, da violência contra terceiros e o ataque gratuito às instituições públicas... é que a sociedade vai mudar. Existem caminhos legais para que a Justiça ocorra dentro do Estado Democrático de Direito. Por outro lado, os agentes políticos também não podem criminalizar os movimentos sociais legítimos da sociedade que, por sua vez, reivindicam direitos da população.

Portanto, o que pode mudar a vida das pessoas são Políticas de Estado que possam efetivamente funcionar. Porém, para tanto, há que se promover uma revolução ética e moral das instituições públicas brasileiras, bem como o fortalecimento da sociedade civil organizada para, dessa maneira, exercer os direitos republicanos, participando da vida política e, através desses meios legais, exercer o controle social dos agentes políticos.

Uma cartilha cidadã que muitos países – que estão em busca do desenvolvimento sustentável - já vêm aplicando há algum tempo. Contudo, é preciso ressaltar, mesmo que seja evidente, que o Brasil também já instituiu o Estado Democrático de Direito, mas ainda padece por ter uma sociedade civil desmobilizada e, consequentemente, uma classe política desprovida, justamente, daqueles valores republicanos.   

    
Marcelo Ferraz é jornalista e escritor. Autor de livros à venda nos sites da Amazon, da Editora Carlini & Caniato e da Livraria Cultura.
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