Olhar Direto

Quinta-feira, 18 de abril de 2024

Opinião

Os Acenos de FHC para o PT: incoerência

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso – FHC, tem se manifestado recentemente sobre possibilidade do PSDB ter o apoio do PT em eventual segundo turno ou  vice-versa. "Espero que o PSDB vá para o segundo turno e acho que o PT espera a mesma coisa, mas dependendo das circunstâncias, eu não teria nenhuma objeção a isso", disse em entrevista à rádio Jovem Pan, em referência à possível frente contra Bolsonaro.

Somente tolos e os que desconhecem como funciona a narrativa do PT para aceitarem a tese esdrúxula de que o PSDB é um partido de direita. Sérgio Coutinho em seu livro  “A Revolução Gramscista no Ocidente” esclarece como se organizou a esquerda brasileira, destacando os partidos segundo suas posições estratégicas. Grosso modo, podemos dividi-la em dois blocos distintos: esquerda revolucionária e a esquerda reformista e seus partidos de maior expressão.

A esquerda revolucionária pode ser sub-dividida em quatro correntes: a marxista-leninista (PC do B, PCB, PSTU, PCO, PPS E PSB); anarquista (movimentos sectários – ONGs, movimentos alternativos); campesina (movimentos rurais – MST e outros); socialista heterodoxo (nasserista – PT).

A esquerda reformista, por sua vez, pode ser dividida em duas correntes: fabianista (social democracia inglesa – Fabiana – PSDB) e a internacional socialista (social democracia da II Internacional – PDT).

O PT foi fundado em 1979 por sindicalistas do ABC paulista.  A ata de fundação foi assinada por intelectuais, professores, religiosos e representantes de sindicatos no prédio do Colégio Sion, escola de elite criada em 1901, no Bairro de Higienópolis – SP (GARSCHAGEM, 2015). Reputo ser o PT o mais complexo, ideologicamente falando, posto que,  mesmo definindo-se como socialista e ser radical na política (sempre fez uma ferrenha oposição até assumir o poder), adotanto, portanto um “socialismo autóctone” (sem referenciar explicitamente à doutrina marxista). Ao mesmo tempo, abraça como estratégia política de tomada de poder o gramscismo. Possui uma rede de intelecutais orgânicos muito ativa que fornecem a base doutrinária ao partido. Essa heterodoxia diz respeito ao seus objetivos revolucionários, porém, mascarados sob uma prática reformista (aos moldes da social democracia fabiana, cuja corrente é representada pelo PSDB). Daí a convergência.

Portanto, engana-se quem pensa que o PT assumiu o poder para implantar o socialismo no Brasil. A missão do PT, via Lula, era fortalecer e aparelhar o Estado para, no futuro, socializar a nação. Nos treze anos que ficaram no poder, várias são as ações que podem ser identificadas com esse objetivo. À guiza de exemplo, o PT aumentou o número de ministérios e aparelhou a administração pública. No primeiro mandato, Lula nomeou 15 mil pessoas para cargo de confiança e, no segundo, aumentou para 23 mil. A utilização da Petrobrás para desvio de bilhões de reais também está nesse contexto (fazer caixa para o partido). Como disse o historiador Marco Antonio Vila em seu livro “A década perdida”, o PT transformou a máquina estatal em correia de transmissão do partido, de acordo com os princípios leninistas. Era a estratégia adequada para colocar o Estado a serviço dos petistas.

Já o PSDB nasceu em 1988 de uma dissidência de esquerda do PMDB, logo depois de promulgada a Constituição. Define-se como social-democrata, contudo, não conseguiu filiação junto à Internacional Socialista (FHC perdeu a disputa para Leonel Brizola em 1979). FHC, seu maior expoente, é adepto da social-democracia inglesa, Fabian Society, fundada em 1883 por um grupo de intelectuais. Durante seu governo, FHC encampou um programa de privatizações de estatais e foi acusado pela oposição esquerdista de realizar uma política “neoliberal”. Na verdade, neoliberalismo é o nome que a esquerda que não está no poder dá para a esquerda que está no poder quando esta empreende o chamado “capitalismo de compadrio”. Trata-se de converter monopólios e oligopólios estatais, transformando-os em monopólios e oligopólios privados. Em seguida, por meio de agências reguladoras, fazem com que as poucas empresas vencedoras preocupem-se mais em atender as exigências do governo do que, propriamente, atender as necessidades dos clientes, arruinando a concorrência e perventendo as leis de mercado.

Taxado de neoliberal, FHC, com o DNA socialista, empreendeu a “luta” de um dos pilares do marxismo: a igualdade material. Assim, deu início aos programas de bolsas sociais: bolsa-escola, bolsa-renda, bolsa-limentação, auxílio-gás, salário mínimo para idosos e deficientes etc. O PT, de forma oportuna, no primeiro ano do governo do presidiário de Curitiba, unificou as quatro primeiras bolsas citadas na famosa “bolsa-família”, ampliando-a e propagandeando como legítimo autor. Qual o problema com programas de transferência direta de renda? Quando efetuados por governos responsáveis e como parte de uma plano temporário de mínimo existencial, é legítimo. No caso brasileiro, serviu como meio para alavancar a permanência no poder de um grupo político, reforçando e consolidando a mentalidade estatista da população: o Estado, cada vez mais, visto como o grande assistencialista e provedor.

Assim, fica evidente que entre o PT e o PSDB existem mais pontos de convergência do que divergência. É característica do pensamento revolucionário pensar dialeticamente, ou seja, tratar um tema já relacionando-o com seu contrário e realizar a síntese dos dois. É assim que esses partidos, discordando da economia de mercado e propriedade privada, agem politicamente no sentido de tolerar o mercado ao mesmo tempo em que o submete ao seu poder político. Controle é a palavra-chave desses grupos socialistas.

É difícil compreender porque o tema é por demais complexo. A verdade é que a linha ideológica do PT e do PSDB não é implantar o socialismo como fez Chaves na Venezuela, posto que, felizmente no Brasil, as Forças Armadas não foram cooptadas. Assim, é preciso que você QUEIRA o socialismo (última pesquisa aponta Lula com 37,3% de intenções de voto). Como assim? Através da “luta pela hegemonia”, ou seja, a busca por uma reforma intelectual e moral da sociedade, via ocupação de espaços na mídia, escolas, universidades, igreja, sindicatos etc e, ainda, pelos chamados “aparelhos privados de hegemonia”, mais conhecidos como ONGs. Como explica Sérgio Coutinho, essa “penetração cultural” vem acontecendo há pelo menos trinta anos, intensificando-se a partir dos anos noventa, e se projeta em três frentes: superação do senso comum, neutralização dos aparelhos de hegemonia da burguesia e ampliação do Estado. 

O aparecimento de um candidato como Jair Bolsonaro, que tem se revelado um defensor da implantação de uma política econômica de caráter liberal, aliado a um pensamento de características conservadoras quanto aos costumes, acendeu a lâmpada de alerta em intelectuais como FHC e outros. Entre um Bolsonaro, que representa a antítese de seu alinhamento ideológico e Lula (cuja divergência é apenas de grau), não há dúvidas de que o sociólogo discípulo de Florestan Fernandes (filiado no PT em 1986) convergirá em apoiar o grupo político do presidiário.
Isso posto, não há incoerência na postura de FHC!


Julio Cezar Rodrigues é economista e advogado (rodriguestcbm@gmail.com)
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