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Opinião

Tecnologia e o Transporte 4.0

*Marcelo Duarte

 

Estradas com monitoramento em tempo real de congestionamentos, informando rotas alternativas aos condutores; a pesagem, em movimento, de carretas carregadas; e a gestão automatizada de todas as rodovias e das linhas de ônibus intermunicipais. Estas são apenas algumas das ações que já estão em funcionamento na Coreia do Sul, melhorando a vida do cidadão.
 

Os sul-coreanos utilizam Sistemas Inteligente de Transporte (ITS, sigla em inglês), que são baseados nos pilares da chamada Revolução Industrial 4.0: internet das coisas, big data (armazenamento de dados), sistemas autônomos e a computação em nuvens (“cloud computing”). Entende-se por ITS a aplicação integrada de tecnologias avançadas utilizando sistemas, computadores potentes, sensores e a comunicação com o objetivo de melhorar a segurança e a eficiência do transporte.   
 

As inovações tecnológicas, tão distantes da nossa realidade de Mato Grosso, temos que admitir, foram apresentadas em evento na capital Seul, durante o "Programa de Compartilhamento de Conhecimentos e Experiências do Desenvolvimento da Infraestrutura Coreana para Autoridades de Alto Nível", no qual participei a convite do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).
 

De fato, Mato Grosso precisa superar desafios - ainda básicos - antes de alcançarmos o nível de desenvolvimento sul-coreano. Por aqui, trabalhamos para tirar do papel a pavimentação de estradas. E temos obtido sucesso nesse quesito. Conseguimos concluir 1.7 mil km de asfalto - em pouco mais de dois anos e meio de gestão -, considerando as obras de construção e reconstrução do antigo pavimentado recebido deteriorado.
 

Planejamento - No entanto, ao ver a potência que se tornou a Coreia do Sul, vem à mente o seguinte questionamento: como um país tão pequeno, que possui o tamanho do Estado de Pernambuco e tem só 10% da extensão de Mato Grosso, conseguiu chegar a este nível? A resposta é simples: investimento em inovação tecnológica e planejamento. Além do alinhamento da política governamental com a atividade empresarial, com regras claras e objetivos comuns, como dissemos no artigo passado. 
 

Em termos de infraestrutura logística, a Coreia do Sul tem, por exemplo, o Aeroporto Internacional de Incheon, um dos mais movimentados do Mundo. Desde 2015, o aeroporto é classificado, consecutivamente, como o melhor do mundo. Lá dentro é possível encontrar cassino, campo de golfe, dormitórios e jardins internos.
 

Em Mato Grosso, é bem verdade que estamos distantes disto. Mas acreditamos que estamos trabalhando no rumo certo. No próximo leilão federal, por exemplo, foi incluída a concessão do Aeroporto Marechal Rondon. Empresas europeias demostraram interesse em participar. Inovamos, neste caso, ao convencer o Governo Federal de aceitar que a empresa vencedora converta o dinheiro da outorga para obras em outros quatro regionais menores (Rondonópolis, Barra do Garças, Sinop e Alta Floresta). Isso nunca foi feito no Brasil. Saímos na frente.
 

Comparar com a Coreia do Sul com o Brasil pode soar injusto. Afinal, o país asiático tem uma malha ferroviária, que inclusive conta com várias linhas de trem bala, possui mais de 100 mil km de rodovias, o que equivale a praticamente metade das rodovias do nosso país, além de modernos portos e um dos sistemas de transporte urbano mais eficientes do mundo.   
 

Investimentos - Destaco que mesmo tendo uma infraestrutura invejável, certamente os sul-coreanos continuarão fazendo novos investimentos na sua ampliação. Mas uma das grandes áreas de investimentos que os asiáticos vêm fazendo na sua infraestrutura, nos últimos anos, não envolve asfalto, o aço ou cimento.  
 

Além das possibilidades já citadas no artigo, destaco que em termos de ITS existem na Coreia do Sul a possibilidade de uso das informações coletadas nas rodovias, por meio dos sensores, para definição da necessidade de investimentos governamentais. Outro caso interessante diz respeito a gestão total do sistema de transporte urbano intermunicipal, com o pagamento eletrônico, contendo informações ao vivo da quantidade de passageiros em cada trem ou ônibus e detalhes da viagem.
 

Em tempos de recursos escassos para investimentos em infraestrutura, a adoção de sistemas inteligentes de transporte é uma solução muito interessante. Afinal, eles custam uma pequena fração dos investimentos em infraestrutura. Segundo os analistas coreanos, com os quais conversei, estes investimentos em inteligência de transporte representam somente 1% do custo da infraestrutura. Estes sistemas podem otimizar os investimentos já feitos, direcionar políticas públicas, além de melhorar a eficiência e a segurança das dos usuários das vias.
 

Teremos que vencer alguns obstáculos históricos para entrarmos definitivamente na era das tecnologias 4.0 no nosso setor de infraestrutura e logística.  Primeiramente, ressalto que precisamos compreender melhor os dados que já possuímos, analisando-os e automatizando suas análises. Em segundo lugar, precisamos, com a ajuda do BID, que já se prontificou em coordenar, rever os planos de transporte intermunicipal em parceria com a Ager. Além disso, elaborar um Plano Estadual de Logística e Transportes para Mato Grosso.  
 

A partir destes estudos, ficarão mais claras as necessidades do setor de transporte, mas também de contratação de sistemas e equipamentos, bem como a capacitação de pessoas para a implantação dos sistemas. Temos que ter este cuidado, pois não são raras às vezes que o poder público contrata algo superdimensionado, ou subdimensionado ou subaproveitado por falta de planejamento.
 

Visão de Estado - Importante dizer, com base na troca de experiências na Coreia do Sul, que estas transformações demandam uma visão única de estado – não de Governo. O planejamento e a continuidade foram fundamentais para os avanços em tão pouco tempo. Neste contexto, as recentes parcerias firmadas pelo Governo do Estado, por meio da Secretaria de Estado de Infraestrutura e Logística (Sinfra) com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e com o Escritório das Nações Unidas para Serviços de Projetos (Unops) são importantíssimas. 
 

Estas instituições estão acreditando no Governo, mas também na capacidade do Estado construir soluções para avançarmos no setor de logística e infraestrutura também a médio e longo prazo, focando na melhoria não só da eficiência no transporte de cargas, mas também na humanização do transporte e na consequente recuperação da atividade econômica e da qualidade de vida da população. Acredito que, apesar das enormes diferenças, podemos, sim, aprender com exemplos inspiradores, como o da Coreia do Sul, que deixou o subdesenvolvimento nos últimos 30 anos e se tornou uma das maiores potencias econômicas do Mundo.

 

*Marcelo Duarte é secretário de Estado de Infraestrutura e Logística de Mato Grosso (Sinfra-MT), presidente do Conselho Nacional de Secretários de Transportes (Consetrans), mestre pela Universidade de Lincoln (Nova Zelândia), com curso de gestão pela Universidade de Harvard, nos Estados Unidos (EUA). É graduado em Administração pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) e Master in Business Administration (MBA) pela Fundação Getúlio Vargas (FGV).

 
 
 
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