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Opinião

Como o pensamento de esquerda falseia a realidade

Julio Cezar Rodrigues

Celson Amorim, 75 anos, é Diplomata de carreira. Ocupou por duas vezes o cargo de Ministro das  Relações Exteriores do Brasil nos governos de Lula (2003-2010) e Itamar (1993-1994). Tambem foi ministro da Defesa no primeiro mandato de Dilma Rousseff (2011-2014). Foi filiado ao PMDB e atualmente pertence aos Quadros do PT. Trata-se, portanto, de um funcionário público de alto escalão e com excelente formação intelectual.

Pois bem, em entrevista concedida ao site UOL[1] em 05/01/2018, nosso ex-chanceler, do alto de sua experiência em relações internacionais, avalia a política externa do atual governo. Segundo Amorim o Brasil perdeu protagonismo e liderança mundial nas relações comerciais e mediação de paz nos conflitos internacionais. Entende que o Brasil, no Governo Lula, exerceu um “protagonismo”,  e uma “liderança” na América do Sul no cenário internacional. Não vou adentrar ao mérito da política externa adotada pelo Brasil nos Governos Petistas. Em minha humilde opinião, considerando os fatos noticiados durante aquela era, se o Brasil tivesse optado por não ter nenhuma política externa, talvez não tivéssemos sentido falta.

A entrevista elucida, para aqueles que ainda não entendem como pensam os petistas, como os intelectuais orgânicos do PT deixam de exercer a atividade cognitiva independente, ou seja, o livre exercício do pensamento, dado o grau de intoxicação da ideologia revolucionário em suas mentes. Fatos objetivos da realidade, possíveis de serem apreendidos até por uma criança, quando filtrados pela mente petista, são enevoados por uma aura fantasmagórica convertida em uma linguagem que não consegue simplesmente dizer que “A” é “A”, e pronto.

Questionado pelo entrevistador com uma pergunta objetiva – “A Venezuela é uma ditadura?” – cuja resposta é binária (sim ou não) sendo que qualquer brasileiros médio que tenha acesso ao mínimo de informações jornalísticas sabe que a responsta é positiva, nosso “intelectual revolucionário” disse que “a questão é complexa”. De acordo com a análise de Amorim, o problema da Venezuela é causado pela queda dos preços do petróleo e pelo “boicote da maior potência do mundo”. É claro que o Repórter imediatamente percebeu que o entrevistado estava “enrolando” e fez a pergunta novamente: “Mas o senhor considera a Venezuela uma democracia?”. Resposta: “Não estou falando isso. Mas também não considero o Brasil uma democracia”. Surpreendido com a resposta o entrevistador então pergunta se ele não considera Venezuela e Brasil democracias? Ao que Amorim responde com esta pérola: “Democracias plenas não. Também nem sei onde há democracia plena. Há graus de democracia. Lá, eles adotaram um outro caminho. Não estou defendendo, mas estou explicando. Não é uma invenção do [Hugo] Chávez [ex-presidente da Venezuela, morto em 2013] que houve um golpe de Estado patrocinado pelos EUA”.

Infelizmente o entrevistador não perguntou para nosso ilustre chanceler se ele considera o período do Governo militar no Brasil (1964/1985) como uma ditadura. Seria interessante para ver até onde Amorim iria com sua retórica. Certamente, dado a desonestidade intelectual da grande maioria dos “pensadores” de esquerda, precisamente na ênfase em distorcer a história e recontá-la aos seus moldes, tentaria convercer-nos que o período citado foi sem dúvida uma ditadura, enquanto a Venezuela é uma democracia que ainda procura sua via.

Também não sei onde há “democracia plena”. Talvez seja apenas uma utopia. Contudo, excelentíssimo Sr Celso Amorim, vou responder ao Senhor que a Venezuela não é uma democracia. O Governo é ditatorial, uma vez que o equilíbrio entre os três poderes foi rompido há muito. O executivo tem absoluto domínio sobre as instituições e usa o monopolio estatal da força para subjugar toda uma nação aos interesses do Governante. Ainda bem que o Senhor não estava nem “defendendo” tampouco “explicando”, uma vez que comparar a democracia brasileira com o caos Venezuelano é um atentado à inteligência do brasileiro médio.

A fala do ex-ministro não surpreende quem tem um mínimo de conhecimento de como funciona o pensamento revolucionário, do qual o ilustre Senhor é parte integrante. Por estar preso aos dogmas do partido de matriz marxista, Amorim não pode “trair” a seita petista que vê o quadro político na Venezuela como um “mal necessário” ao restabelecimento da ordem interna quebrada pelo império americano[2]. Conforme explica Flávio Gordon, o PT e sua rede de simpatizantes formais e informais são exemplares na tentativa de subverter todos os critérios de juízo racional e todos os princípios morais socialmente consagrados, reduzindo-os, tal como propusera Antonio Gramsci, à razão do partido.[3] Com efeito, afirmar o óbvio (a Venezuela é uma ditadura da pior espécie) subverteria e enfraqueceria o discurso político da esquerda sul americana, congregados no Fórum de São Paulo, sob a liderança de Lula. Esquerda essa que busca, no Brasil, assumir novamente o poder que foi afogado no mar de corrupção atualmente ainda sob persecução criminal.

A verdade, como nos ensina o filósofo Olavo de Carvalho, é o fundamento cognitivo universal e permanente de validação dos juízos. Assim, pergunta-se: o Senhor Celso Amorim, sob tal parâmetro para desvelar a verdade da inverdade, estaria nos apresentando uma realidade objetiva da Venezuela? Se a esquerda não consegue, diante de fatos que acontecem no tempo presente, fazer a correta avaliação e fundamentar um pensamento honesto para validar um juízo de valor relativamente simples (existem centenas de imagens que mostram as agruras e desespero do povo Venezuelano) imaginem quanto se arvoram a contar a história sobre fatos pretéritos (Comissão da Verdade por exemplo).

Este pequeno comentário sobre a entrevista do Ex-Ministro é apenas um exemplo dentre milhares que podem ser observados em cada fala de um membro da esquerda nacional. Veja como o PT e demais partidos de esquerda se comportam e se comportaram diante das grandes questões em nosso País. Vejam qual foi o posicionamento do PT quando da votação da Constituição de 1988, do Plano Real e das reformas que o Brasil precisa. Uma pesquisa simples (excetuando os livros do MEC claro) mostrará que o Governo do Sr. João Goulart (defendido pela esquerda atual) simplesmente acobertou a ação criminosa e intervencionista do regime cubano no Brasil. Foi o autor dessa traição que os militares derrubaram em 1964 com o apoio da sociedade civil. Os planos de implantação do socialismo por via armada antecederam e foram a causa do contragolpe militar, ao contrário do que ensina a cartilha da intelligentsia da esquerda tupiniquim[4].

Conforme costumo sempre lembrar, em ano eleitoral os discursos extrapolam as fronteiras do bom senso e da realidade. Estejamos alertas!
 

Julio Cezar Rodrigues é advogado e economista (rodriguesadv193@gmail.com)

[1] Disponível em https://noticias.uol.com.br/internacional/ultimas-noticias/2018/01/05/brasil-desperdica-chance-de-lideranca-diante-do-provincianismo-de-trump-diz-celso-amorim.amp.htm. Acessado em 06/01/2018.
[2] Sobre a verdadeira natureza do imperialismo americano, ver Olavo de Carvalho (O jardim das Aflições).
[3] Flávio Gordon. Corrupção da Inteligência. Editora Record. 2017.
[4] Ver em Corrupção da Inteligência de Flavío Gordon esta tese, calcada em historiadores confiáveis e de renome.
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