“Sem prova plena, verdadeira, completa e convicente da participação dos acusados no fato criminoso, impossível uma condenação”. Assim entendeu o juiz Lídio Modesto, da Quinta Vara Criminal de Cuiabá, ao proferir a absolvição de dois acusados de roubarem 176 kg de ouro da “Mineradora Maney Casa de Pedra”, de propriedade do ex-governador Silval Barbosa e do ex-prefeito de Cuiabá, Mauro Mendes. A decisão foi proferida no último dia 09.
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De acordo com os autos, o processo criminal foi instaurado em face de Luiz Benedito Pereira Marinho, que se apresentou espontaneamente à delegacia de polícia, confessando o roubo de 176 quilos de ouro que teria cometido com Valdinei Mauro de Souza (um dos sócios da empresa). Segundo Luiz Benedito, seria Valdinei o responsável por arquitetar e ordenar que a execução do roubo.
De acordo com o réu confesso, ele roubava 2kg de ouro por dia à mando de Valdinei e deixava o fruto do crime em sua residência, para que este buscasse. O declarante ainda revelou que foi por conta dos roubos foi demitido por justa causa, após ser flagrado pelas câmeras de monitoramento do garimpo.
Valdinei Mauro, por sua vez, declarou que a suposta confissão de Luiz Benedito não passa de denúncia infundada “com intenção de prejudicar a mim e meus sócios (...) acredito que Luiz Benedito tenha sido influenciado a fazer tais denuncias por um ex-sócio meu”, declarou às autoridades.
Assim, para o magistrado, “tais relatos não conduzem a nenhuma certeza da autoria do delito imputado aos acusados, logo, não há prova da existência do fato”. Sendo assim, orientou-se pela jurisprudência do assunto que diz: “O processo penal é orientado pela busca da verdade real, que deve ser plena, razão pela qual os indícios e conjecturas não bastam para a condenação’ e ‘não havendo prova de ter o réu concorrido para o crime de resistência, impositiva a sua absolvição’”.
Os dois acusados foram absolvidos.
Veja a íntegra da decisão:
Com Resolução do Mérito->Improcedência
SENTENÇA
1. Relatório.
O presente feito foi instaurado para apurar a prática do delito descrito no art. 155, § 2º, incisos II e IV, c/c art. 69, ambo do Código Penal, praticado pelos acusados Luiz Benedito Pereira Marinho e Valdinei Mauro de Souza, vulgo Nei, uma vez que, em tese, teriam subtraído a quantidade total de aproximadamente 176 quilos de ouro em prejuízo da vítima/empresa Mineradora Maney Casa de Pedra.
Depreende-se dos autos que o indiciado Luiz Benedito apresentou-se espontaneamente na DEPOL e se auto incriminou quanto ao delito, e ainda delatou Valdinei Mauro (um dos sócios da empresa/vítima), informando que o mesmo lhe mandava subtrair as peças de ouro bruto.
Por fim, consta nos autos que os sócios da empresa mineradora, ao serem ouvidos perante a i. autoridade policial, negaram as ocorrências do delito supramencionado.
O Ministério Público Estadual, com base no incluso procedimento inquisitorial, requereu pela absolvição dos indiciados, nos termos do art. 386, incisos II e V, do Código Penal, vez que há ausência de prova da existência do fato delitivo, bem como inexiste provas no caderno informativo, conforme consta na manifestação acostada às fls. 80/85.
É o relatório do necessário.
2. Fundamentação.
Após compulsar minuciosamente os autos, chego ao convencimento de que razão assiste o Ministério Público Estadual, e que os acusados devem ser absolvidos da imputação criminosa, pois não constam no caderno probatório provas de existência do fato delitivos, e em consequência de que os acusados tenham concorrido para a suposta prática delitiva.
Tenho como certo que um magistrado não pode condenar qualquer pessoa com a convicção abalada, tendo em vista a incerteza do cometimento do crime amealhado.
Em seu termo de declarações prestado perante a i. autoridade policial, o indiciado Luiz Benedito declarou que: “(...) que o declarante voltou a ser procurado por Nei, para que trabalhasse com ele na Mineradora Casa de Pedra, onde é sócio de Mauro Mendes e Silval Barbosa; que nessa mineradora trabalhou por quatro meses onde Nei utilizava o declarante para desviar aproximadamente dois quilos de ouro por dia; que foi demitido por justa causa da mineradora, acusado de roubo de ouro, ao ser flagrado pelas câmeras de monitoramento do garimpo; que o declarante explica que após resumir o ouro, levava em média dois quilos do material resumido para sua casa, onde Nei ia buscar (...)” (sic).
O acusado e também vítima Valdinei, por sua vez, relatou: “(...) que não passam de denúncias infundadas com intenção de prejudicar a mim e meus sócios (...) acredito que Luiz Benedito tenha sido influenciado a fazer tais denuncias por um ex-sócio meu (...) havia uma desconfiança que Luiz estaria nos furtando, por isso passamos a vigiá-lo e acabamos flagrando-o com dezessete gramas de ouro azogado e acabou nos entregando outras quarenta gramas de ouro que ele havia escondido; que essa é a razão de Luiz ter sido demitido (...)” (sic).
Os outros sócios, Mauro Mendes Ferreira e Jéssica Cristina de Souza, informaram que as declarações do acusado Luiz Benedito são infundadas.
Tais relatos não conduzem a nenhuma certeza da autoria do delito imputado aos acusados, logo, não há prova da existência do fato.
No que tange a incerteza quanto ao envolvimento do acusado na prática delitiva, nosso Tribunal tem assim decidido, acompanhando farta orientação da doutrina e da jurisprudência sobre o assunto, transcrevo:
“APELAÇÃO CRIMINAL – SEQUESTRO QUALIFICADO PELA PRIVAÇÃO DA LIBERDADE POR MAIS DE QUINZE DIAS, EM CONCURSO DE PESSOAS E AGRAVADO PELO MOTIVO TORPE – AUSÊNCIA DE PROVAS DA COAUTORIA OU PARTICIPAÇÃO – BUSCA PELA VERDADE REAL – RECURSO PROVIDO. O processo penal é orientado pela busca da verdade real, que deve ser plena, razão pela qual os indícios e conjecturas não bastam para a condenação (TJMT, ED nº 29047/2014). “[...] Não havendo prova de ter o réu concorrido para o crime de resistência, impositiva a sua absolvição, com fundamento no art. 386, inciso V, do CPP. Recurso Provido.” (Ap 112915/2013, DES. MARCOS MACHADO, SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL, Julgado em 27/08/2014, Publicado no DJE 02/09/2014).
O douto Desembargador Paulo Inácio Dias Lessa já decidiu assim:
“Uma condenação não pode estar construída sobre a areia, representando o possível, o provável. Ao contrário, sua edificação há de ser lançada sobre a rocha firme da certeza.” (25/5/94 - Apcrim nº. 418/93 - Capital).
Assim sendo, sem prova plena, verdadeira, completa e convicente da participação dos acusados no fato criminoso, impossível uma condenação.
3. Dispositivo.
Pelo exposto, ABSOLVO os acusados LUIZ BENEDITO PEREIRA MARINHO E VALDINEI MAURO DE SOUZA, devidamente qualificados nos autos em exame, nos termos do artigo 386, incisos II e V, do Código de Processo Penal.
Transitando em julgado a presente sentença, procedam-se as baixas e anotações de estilo, arquivando-se os autos, comunicando-se aos órgãos competentes.
P.R.I.C.
Cuiabá-MT, 09 de janeiro de 2017.