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Sexta-feira, 19 de abril de 2024

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Do auge à queda: a trajetória de poder de Cunha em 5 capítulos

Três anos atrás, Eduardo Consentino da Cunha era praticamente um anônimo para o grande público, mas um velho conhecido da gestão Dilma Rousseff e das entranhas da política brasileira.


Personagem cuja trajetória remonta à campanha de Fernando Collor de Mello, em 1989, e ao governo de Anthony Garotinho no Rio de Janeiro no fim da década de 1990, o deputado estava apenas em seu terceiro mandato em 2013, ano cujos protestos de junho derrubaram a avaliação da maioria dos governantes - incluindo Dilma, até então surfando em ondas inéditas de popularidade.

Enquanto a maioria dos políticos analisava como responder ao clima de insatisfação generalizado no país, Cunha iniciava ali, ao menos de forma mais explícita, seu caminho para se tornar um dos políticos mais poderosos do país.

Certamente não imaginava, porém, que toda essa visibilidade caminharia para a renúncia, às lágrimas, da presidência de uma Casa que até pouco tempo atrás todos diziam estar sob seu completo domínio.

"Resolvi ceder aos apelos generalizados dos meus apoiadores, diante da interinidade bizarra da Casa. Somente minha renúncia pode por fim a isso", disse Cunha ao renunciar à presidência da Câmara na tarde desta quinta-feira.

Relembre, em cinco tópicos, os fatos que construíram um personagens mais controversos da história recente do país.

1) Ascensão

Ao assumir a liderança do PMDB, em fevereiro de 2013, Cunha foi responsável por uma guinada no então tranquilo relacionamento entre o governo Dilma e a base aliada na Câmara.

O ponto alto da tensão foi evidenciado na discussão da MP dos Portos, em maio do mesmo ano, medida provisória que definiu novas regras para o setor portuário.

Acusado de atuar a favor das empresas do setor, Cunha liderou uma rebelião contra o governo, que acabou obrigado a fazer concessões para conseguir a provar a proposta - que, assim, demandou longas e tensas sessões no Congresso.

No fim, o processo expôs a primeira cisão pública entre ele e a presidente: o deputado a acusou de descumprir acordos ao vetar alguns pontos da MP.

A partir de então, o peemedebista articulou um bloco de parlamentares insatisfeitos de vários partidos da base aliada e da oposição. E, em 2014, começou a defender abertamente que o PMDB rompesse com o PT.

O "blocão" dificultou a vida do governo na Câmara, e como seu principal representante, Cunha foi alçado ao noticiário e paulatinamente se fortaleceu entre as grandes forças políticas.

2) Poder

A Operação Lava Jato era uma grande nuvem negra se aproximando da classe política brasileira - e os boatos já davam conta de que o peemedebista tinha sido seriamente implicado nas investigações.

Mas embalado pelo status de opositor - ainda que não oficial - do governo e por uma fácil reeleição nas eleições de 2014, Cunha venceu facilmente a disputa para comandar a Casa em fevereiro de 2015, mesmo sob forte oposição do PT, que tentou emplacar Arlindo Chinaglia no posto.

A aposta da gestão de Dilma Rousseff na tentativa frustrada de impedi-lo de assumir o cargo apontava um temor que depois provou fazer sentido.

Como presidente da Câmara, ele tomou em suas mãos o controle da pauta da Casa e aplicou várias derrotas à gestão petista - em algumas das vezes, seu amplo e célebre conhecimento das regras do Legislativo permitiram que recolocasse em votação parte das poucas propostas em que havia perdido, provocando críticas de seus opositores.

À época, o peemedebista também recebia elogios pelo ritmo intenso de votações que imprimiu. O ano de 2015 se tornou o recordista no número de propostas votadas na Câmara desde 1991.

Sua força se manteve mesmo quando as investigações da Lava Jato já o encurralavam: Cunha rompeu oficialmente com o governo e começou a cortejar publicamente os movimentos pró-impeachment, mas, segundo os bastidores políticos, negociava com os dois lados uma estratégia para sua salvação.

A moeda de troca: aceitar ou não um pedido de impeachment de Dilma, suspense que durou quase todo o segundo semestre do ano passado e teve o desfecho que conhecemos: a petista aguarda julgamento fora do cargo, para o qual pode nunca mas voltar.

3) Declínio

Embora provasse frequentemente sua força, Cunha começou a sofrer seguidos desgastes públicos.

Aos poucos, delatores da Lava Jato foram o implicando cada vez mais no escândalo de corrupção da Petrobras.

Sua situação piorou quando o Ministério Público da Suíça informou seus pares brasileiros sobre milhões depositados no país europeu, atribuídos ao deputado.

O problema é que ele havia negado, em depoimento à CPI da Petrobras, possuir contas bancárias no exterior. Diante disso, PSOL e Rede entraram com um pedido de cassação no Conselho de Ética da Câmara, argumentando que ele havia quebrado o decoro parlamentar ao mentir para seus colegas.

Cunha até hoje sustenta que não mentiu - diz que os valores eram geridos por trusts (fundações que administram recursos de terceiros) e, logo, que ele é apenas um beneficiário.

O processo interno contra ele, porém, acabou caminhando, mesmo que a passos lentos. E as apurações da Lava Jato avançaram de tal modo que ele acabou se tornando réu do caso no STF - já são duas ações, e podem vir mais por aí.

4) Resistência e aceitação do pedido de impeachment

A queda de Cunha era defendida por muitos há meses - e não eram poucos os que acreditaram, em vários momentos, que ela estava próxima.

Mas a verdade é que o peemedebista se provou resistente - contando para isso com a ajuda de uma verdadeira tropa de choque de deputados aliados agindo em sua defesa.

Por meio de manobras regimentais, esse grupo fez o processo no Conselho de Ética voltar ao ponto zero quando já se encaminhava para uma conclusão. Como resultado, a análise de seu caso se tornou a mais longa do colegiado: foram oito meses de exaustivas discussões, recursos e tentativas de anular a ação.

As composições no conselho, aliás, são apontadas como estopim do início do impeachment, em dezembro de 2015: Cunha acolheu o pedido de afastamento de Dilma na mesma semana em que o PT anunciou que votaria contra ele.

Ao dar início ao processo, ele ganhou mais tempo no poder: na oposição, era forte o sentimento de que o peemedebista teria papel fundamental na condução dos trâmites na Casa, o que de fato ocorreu.

Pelas mãos de Cunha, a escolha da comissão que analisaria o caso teve uma reviravolta - no lugar de uma composição pró-governo, ele articulou a eleição de uma chapa avulsa.

Além disso, o deputado imprimiu velocidade ao processo e manejou o calendário para que a votação pelo plenário ocorresse no dia 17 de abril, um domingo, atraindo as atenções de todo o país.

5) Queda

A partir do dia 17 de abril, o impeachment virou assunto do Senado, levando o mundo político a questionar qual seria o papel de Cunha daí em diante.

A resposta não levou muito tempo: cerca de duas semanas depois, ele acabou afastado da presidência da Casa e do mandato pelo STF.

O ministro Teori Zavascki, responsável pela Lava Jato no STF, atendendo a pedido do procurador-geral da República Rodrigo Janot, entendeu que ele usava sua posição para constranger pares e atrapalhar investigações contra si. A decisão acabou ratificada, por unanimidade, pela corte.

Um mês depois, o juiz Sergio Moro tornou a mulher de Cunha, Cláudia Cruz, ré em um processo, acusando-a de ser favorecida pelos valores depositados na Suíça.

E as notícias negativas não pararam por aí: depois de oito meses de manobras, o Conselho de Ética da Câmara finalmente votou o parecer recomendando sua cassação.

A verdade é que o argumento do trust não surtiu efeito: com base em assinaturas suas e em comprovantes de pagamentos de despesas sua família, o conselho aprovou no mês passado parecer recomendando sua cassação - foram 11 votos a 9, quando as apostas eram de um empate ou vitória dele.

Com isso, suas opções de manobras praticamente se exauriram: restou apresentar um recurso à CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) pedindo a anulação do processo sob o argumento de cerceamento de defesa.

O relator do pedido, o deputado Ronaldo Fonseca (Pros-DF), emitiu parecer defendendo que a votação pelo Conselho de Ética seja anulada - cuja aprovação é avaliada como improvável pela maioria.

Nesse meio tempo, Cunha anunciou sua renúncia nesta quinta, abrindo espaço para sua sucessão no comando da Casa.

Caso as previsões se confirmem na CCJ, o plenário deve decidir sobre sua cassação nas próximas semanas. Serão necessários 257 votos, a maioria simples da Casa, para que ele perda seu mandato.

Restará ainda saber qual papel ele assumirá, a depender da evolução dos processos dos quais é alvo na Lava Jato - uma das dúvidas é se ele continuará aliado de Temer, com quem se encontra periodicamente, ou se representará uma ameaça.
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