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Índios loiros e de pele clara chamam atenção em aldeia no Acre

G1

Na Aldeia Nova Mudança, localizada na cidade de Santa Rosa do Purus (AC), a 300 km da capital Rio Branco, três crianças da etnia Kaxinawá destoam do restante da comunidade. De uma família de 8 irmãos, Vanessa, de 5 anos, Orlando, de 3, e a pequena Eleiana, de 1 ano, foram os únicos que nasceram com a pele clara, cabelos loiros e olhos castanhos.

A suspeita é que as crianças tenham albinismo, uma mutação genética que se refere à incapacidade de uma pessoa fabricar corretamente a melanina.

Tímida e meio assustada, a mãe das crianças, Elza Kaxinawá, acha que as características dos filhos não fazem deles "diferentes". Mas destaca que as crianças sofrem com o forte calor e a exposição ao sol.

"Vieram assim, não sei o que aconteceu. Eles são normais, só reclamam do sol e, às vezes, ficam doentes, têm coceiras por causa dos mosquitos e alergias. Fora isso, são iguais aos outros", disse.

A coordenadora regional da Fundação Nacional do Índio no Acre (Funai) e do Alto Purus, Maria Evanízia, disse que o órgão, por enquanto, não está fazendo nenhum estudo sobre índios albinos no Acre. "Pode estar ocorrendo algum tipo de mutação genética. No Acre, entre a população indígena, esses foram um dos primeiros casos que nós tomamos ciência", disse.

Mistura racial

Procurado pelo G1, o especialista Marcus Maia, coordenador do Programa Pró-Albino, da Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD), de São Paulo, explicou que ainda não existem estudos que comprovem a existência de albinismo em aldeias. "O caso não é comum."

Segundo Maia, que também é professor de dermatologia na Santa Casa de São Paulo, só seria possível dizer que as crianças são "albinas puras" (ou fruto de mutação genética), se fosse comprovado que essa etnia não se misturou com outras.

"No caso desses índios, precisaria ser investigado primeiro se houve casamentos ou ligações entre índios e outras pessoas de outras raças, principalmente entre pardos e negros, porque aí nós temos a possibilidade de ter sido colocado na aldeia o gene do albinismo. Como essa comunidade é pequena, eles provavelmente tiveram casamentos consanguíneos muito próximos. O gene do albinismo pode ter sido implantado dentro da aldeia e não surgiu por uma mutação", disse.

Genética e tipos de albinismo

Segundo Marcus Maia, só é possível que uma pessoa nasça com albinismo se os dois pais forem ao menos portadores do gene.

"Para nascer uma pessoa albina, é necessário que os pais sejam, pelo menos, portadores do albinismo, caso contrário, não nascem pessoas albinas. São três possibilidades: duas pessoas têm que ser portadoras, ou uma é albina e a outra é portadora, ou os dois são albinos do mesmo defeito genético, então, nesse caso, esse casal de índios precisa estar incluído em um desses três casos", acrescentou.

O especialista explicou que existem quatro tipos de albinismo 1, 2, 3 e 4. No tipo 1, OCA1 os indivíduos têm pele e cabelos brancos, olhos claros ao nascer. Alguns, porém, passam a produzir melanina na primeira infância e apresentam aumento na pigmentação.

No OCA-2, o mais comum entre os africanos, a pessoa apresenta cabelo loiro, ruivo, ou vermelho-vivo, como pode ser o caso de Vanessa, Orlando e Eleiana, segundo o especialista, que analisou os indígenas por foto. Nesse tipo de albinismo, os indivíduos têm olhos azuis ou castanhos bem claros. A pele é branca e pode desenvolver sardas e pintas.

O tipo OCA-3 é o mais comum em negros sul-africanos que têm o tom de pele avermelhado ou moreno, cor de cabelo ruiva e olhos claros. Já o OCA-4 é parecido com o subtipo 2.

Atendimento de saúde no Acre

De acordo com gerente de Políticas da Saúde às Populações Vulneráveis, da Secretaria de Estado de Saúde do Acre (Sesacre), Zilmar Cândida da Silva, como não existe um estudo que comprove que esses índios sejam albinos, o órgão não tem como dar um atendimento preferencial às três crianças.

"O atendimento hospitalar dado à população indígena em geral já é em si diferenciado, pois eles são pacientes especiais. Não tem como, por um fato característico aparente aos olhos, a equipe de saúde tomar uma atitude diferente com os três indiozinhos. Para isso, seria necessário que fosse feita uma investigação antropológica desse novo índio que surge com características albinas ou da raça branca", explicou.

Os principais problemas de saúde para pessoas albinas estão relacionados ao contato com o sol, disse Marcus Maia, da Santa Casa de São Paulo. "Os albinos desenvolvem câncer de pele e envelhecimento precoce. A pele é muito sensível, no caso de indígenas, os perigos seriam maiores, por eles estarem sempre expostos ao sol. Seria necessário um cuidado mais do que especial com eles, ainda mais por serem crianças", falou.

O G1 também entrou em contato com o Ministério da Saúde, no setor responsável pela Saúde Indígena, e foi informado, por meio da assessoria, que o órgão não tem nenhum estudo que comprove a existência dos índios albinos no Brasil.   

Albinismo no Brasil
A palavra albino vem do latim albus (branco) e se refere à incapacidade de uma pessoa ou animal de fabricar corretamente a melanina, que dá cor à pele e protege da radiação ultravioleta solar.

Segundo Marcus Maia, a maior parte do albinismo no Brasil é de origem da raça negra, que veio da África. "Boa parte da origem do albinismo no Brasil veio com os escravos, não que eles tenham trazido pessoas albinas. Eles não trouxeram negros albinos, mas eles tinham a marca genética, então, o gene do albinismo no Brasil veio pela África", esclareceu.

Maia disse ainda que no Brasil, segundo a estimativa mundial, deve haver, aproximadamente, 10 mil albinos. "Isso segundo a estimativa mundial, mas aqui no Brasil como há uma grande incidência do gene africano, deve ter um pouco mais do que 10 mil albinos. Ainda não há um estudo de estimativa real no Brasil. A ideia é, com o programa Pró-Albino, nós sabermos esse quantitativo fechado", finalizou.

Índios no Acre
Vivem no estado do Acre ao todo 14 povos indígenas distribuídos em 36 terras com a população de aproximadamente 16 mil índios.

No município de Santa Rosa do Purus vivem mais de três mil índios, segundo dados da Funai. Essa população, composta por três povos indígenas, ocupa uma área demarcada no Alto Purus. Nessa terra, residem dois povos, os Kaxinawás e os Madijas.

Além desta, conforme a Funai, há ainda outra terra que não foi demarcada e está em processo de regularização fundiária, onde residem os Jaminauás.

 
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