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Cresce risco de calote de empresas brasileiras, diz FMI

O Globo

 - A situação doméstica e do quadro internacional deteriorou o perfil de endividamento das empresas brasileiras, deixando uma parcela significativa do mundo corporativo nacional com margem apertada para honrar débitos, segundo o Relatório de Estabilidade Financeira Global (GSFR, na sigla em inglês), divulgado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), nesta manhã. O organismo multilateral alerta particularmente para o setor de energia, à luz do aperto das condições de financiamento já experimentadas pela Petrobras, que tem esquema de corrupção sob investigação.

“No Brasil, preocupações com a governança corporativa da Petrobras já resultaram em cortes na classificação de crédito e elevaram os custos de empréstimo ao maior nível em mais de dez anos”, diz o Fundo Monetário.

Os setores energético e exportador de commodities, afirma o FMI, estão sendo severamente afetados pela queda das cotações internacionais do petróleo, de alimentos e metais. De forma geral, as empresas brasileiras arcam ainda com os custos da recessão, dos juros altos, da forte desvalorização do real e da crescente volatilidade nos mercados, que está provocando revisão dos preços dos ativos.

Segundo o Fundo, desde junho de 2014 o mercado engrenou em um processo de reavaliação dos ativos de empresas brasileiras em geral, bem como os de outros emergentes. Mas o ramo de energia tem sido particularmente afetado.

CAPACIDADE DE PAGAMENTO DE DÍVIDAS

“Pressões sobre a capacidade de pagamento das dívidas pelo setor de petróleo e gás tornaram-se mais evidentes para firmas de Brasil, Nigéria e África do Sul, por causa dos preços baixos do petróleo”, diz o texto do GSFR, embora o FMI ressalte que, nesses países, a deterioração dos balanços corporativos do setor energético começou antes mesmo da queda livre da cotação.

De forma geral, o Fundo avalia que o Brasil está no grupo em que há uma parcela substancial do débito corporativo em risco, quer seja porque as empresas são “fracas” (perderam musculatura), quer seja porque a receita gerada antes do pagamento de impostos e juros é menos de duas vezes o valor do serviço da dívida. Essa fatia praticamente dobrou entre 2010 e 2014, de cerca de 13% para pouco mais de 25% do débito na mão de empresas.


A dívida em moeda estrangeira preocupa menos o Fundo, no caso do Brasil, mas não é desprezível diante da valorização acentuada do dólar frente ao real. Entre 2007 e 2014, passou de cerca de 8% para o patamar de 13% do PIB brasileiro.

De acordo com José Viñals, economista que chefia as avaliações de risco financeiro do FMI, o quadro do Brasil não é isolado. Nos últimos seis meses, cresceram os riscos à estabilidade financeira global, que estão mais espalhados, tanto geograficamente (ricos, emergentes, em desenvolvimento) quanto em relação ao tipo de ativos e setores frágeis.

Por exemplo, EUA e zona do euro têm de lidar com efeitos colaterais indesejáveis da crise financeira e das políticas monetárias expansionistas (recursos abundantes e juros zero).

Persistem alta alavancagem e excesso de créditos podres (900 bilhões de euros só na Europa). Os riscos deslocam-se dos bancos aos shadow banks e instituições não financeiras e das questões de solvência para a liquidez do mercado (os capitais disponíveis podem secar rapidamente, dificultando rolagem de dívidas, em países ricos e, sobretudo, nos emergentes).

Por exemplo, pequenas emissoras de seguros de vida podem ficar insolventes se persistirem os juros baixos europeus sem ajustes de balanços e colchões antiestresse. Há risco sistêmico: essas seguradores têm 4,4 trilhões de euros em ativos da União Europeia e estão interconectadas ao sistema bancário.

ALTA DE JUROS NOS EUA

Já nos EUA, à medida que o Fed, banco central americano, começar a elevar juros, vão crescer o custo das dívidas e a volatilidade nos mercados. A perspectiva de ganharem mais nos Estados Unidos pode alterar o mapa de aplicação dos investidores no mundo todo. Bolhas infladas pelos anos de recursos abundantes podem vir à tona e estourar.

Na China, a contenção da expansão de setores (dentro do plano de reorientação da economia do investimento para o consumo) pode desequilibrar balanços. Particularmente na construção civil e no mercado imobiliário —este último representa 20% do crédito doméstico chinês.

— Os riscos moveram-se a partes do sistema financeiro mais difíceis de avaliar e de combater — afirma Viñals.

O economista resume o cardápio de ações que devem ser adotadas:


— Medidas adicionais à política monetária são vitais para garantir uma saída duradoura da crise financeira e salvaguardar a estabilidade financeira. Legados da crise precisam ser resolvidos. A calibragem das políticas monetárias precisa ser afinada com reformas complementares e contenção de excessos financeiros. A liquidez do mercado precisa ser fortalecida e reformas regulatórias no sistema financeiro devem ser encerradas.

Aos mercados emergentes, uma recomendação adicional é reforçar os amortecedores de choques e resolver vulnerabilidades domésticas, diz Viñals:

— A resistência financeira pode ser elevada por intermédio da adoção de medidas micro e macroprudenciais. Os reguladores devem realizar testes de estresse bancário relacionados a moedas estrangeiras e riscos relacionados ao preço de commodities, e monitorar mais de perto e com maior regularidade o endividamento corporativo e a exposição cambial, incluindo posições em derivativos.

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