Imagina um indivíduo sem nenhum pingo de consciência republicana, mas com superpoderes institucionais, que chutou os pilares da legalidade democrática para atropelar os órgãos de fiscalização ambiental, pois literalmente está limpando a bunda com as folhas "mortas" do que ainda resta da Constituição Federal do Brasil de 1988, imaginou...?

Pois bem, essa figura "caricatural quixoteana" – narrada em Dom Quixote de la Mancha (livro escrito pelo espanhol Miguel de Cervantes/1547-1616) - que anda ateando fogo no patrimônio da república brasileira, após colocar a coroa da insanidade na cabeça, agora começou achar que é a personificação do próprio Estado (Rei) ao violar, a todo momento, os princípios mais basilares da administração pública, ruminando o artigo 37 da CF/88 e cuspindo na lata do lixo os princípios da impessoalidade e da legalidade.

Essa conclusão não adveio de algum alienado que tem a pretensão de retroagir ao obscurantismo da esquerda radical da época petista; e muito menos acusar sem provas os passos sem urbanidade dos soldados da direita ultraconservadora, que por sua vez, tomou o país de assalto ao se aproveitar do trauma da população, esta que sofreu horrores durante o governo irresponsável do PT, mas que agora também está sofrendo, por outro lado, nas mães de meia dúzia de lunáticos infectados pelo vírus da ideologia extremista da direita brasielira. 

Contanto, a conclusão vem das informações factuais que decorrem dos decretos inconstitucionais do mais novo monarquista brasileiro, ou seja, do presidente...Esse mesmo que com uma caneta bic vem aterrorizando o descanso e o sono pacífico dos procuradores constitucionalistas dessa pátria.

A esquizofrenia política desse grupo monarquista chegou ao ponto do próprio apresentador Marco Antonio Villa, historiador conhecido no rádio por seus posicionamentos essencialmente à direita e antipetistas, ser afastado da Jovem Pan, veículo em que trabalha há anos, por ter se posicionado contra as loucuras do governo atual. Diante desse fato misterioso, até dá para imaginar o tamanho do contrato que pode ter sido fechado pelo grupo de comunicação com a secretaria de comunicação do governo... Coitado do professor Villa, pois acabou sendo apenas mais uma marionete nesta história macabra.      

Para provar isso, basta ler as manchetes dos jornais minimamente confiáveis de qualquer lugar do mundo. Deste modo, esta semana o capitão e inimigo número "um" dos direitos humanos resolveu que, para valorizar as propriedades de sua família, localizadas em Angra dos Reis, município na Costa Verde (RJ), iria transforar um santuário ecológico marinho (protegido por Lei Federal), em uma ilha da libertinagem capitalista como a de Cancún. Na ocasião, o presidente Jair Bolsonaro afirmou que o local em questão tem potencial para ser uma "nova Cancún no Brasil".

De acordo com ele, a região pode trazer "bilhões de reais" para o estado. "O nosso estado, na presença aqui do Witzel [governador do RJ], merece ter uma Cancún. E nós poderemos tê-la. E estamos trabalhando para a região de Angra. Depende de um decreto presidencial. Porque a Estação Ecológica de Tamoios está demais. Não preserva absolutamente nada e faz de uma área rica, que pode trazer bilhões de reais, por ano, em turismo, que está parada por falta de uma visão mais objetiva, mais progressista nessa questão ", explicou o presidente.

Bolsonaro também fez críticas e manifestou interesse em fazer mudanças, via decreto presidencial, na Estação Ecológica de Tamoios (Esec Tamoios), uma unidade de conservação federal de proteção integral onde é proibido qualquer tipo de intervenção humana. No entanto, vale a pena ressaltar que, em janeiro de 2012 – quando ainda era deputado federal – Bolsonaro foi multado em R$ 10 mil pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) ao ser flagrado pescando num barco no costão da Ilha de Samambaia, que integra a Esec Tamoios. No ano seguinte, o parlamentar entrou com um mandado de segurança na Justiça Federal tentando conseguir autorização para pescar na estação ecológica.

Mais uma vez, advogando em causa própria, o novo "monarquista brasileiro" durante um encontro com os chefes dos poderes, para firmar um "pacto pela governabilidade",afirmou ter mais poder do que o presidente da Câmara por conseguir editar decretos. "Hoje pela manhã tomando café com Dias Toffoli, Alcolumbre e Maia eu disse para Maia: com a caneta eu tenho muito mais poder do que você. Apesar de você, na verdade, fazer as leis, eu tenho o poder de fazer decreto. Logicamente decretos com fundamento", disse Bolsonaro na noite da última terça-feira (28).

Contanto, o presidente ainda foi além ao ultrapassar todas as barreiras do bom senso e do decoro presidencial ao, pessoalmente, consultar o chefe do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, acerca da constitucionalidade do decreto, como se o presidente do STF fosse meramente um consultor jurídico particular dele. Ele disse ter consultado Toffoli sobre a possibilidade de reverter um decreto para reverter a criação de uma reserva na região. "Eu falei para ele do caso da baía de Angra. Falei que nós podemos ser protagonistas de fazer com que a baía de Angra seja uma nova Cancún", afirmou.

Ele afirmou ainda ter consultado o presidente do STF sobre se seria constitucional editar um decreto que revogue um anterior. "Talvez fosse inconstitucional um decreto revogar outro decreto. Bem, a sorte está lançada", disse. Diante do exposto e de todas as notícias que vêm revelando a natureza despótica e antirrepublicana do "mito" não fica difícil perceber que ele, deliberadamente, está confundindo o público com o privado e por isso põe em xeque a estabilidade do Estado Democrático de Direito.

Contudo, cabe aos cidadãos conscientes entender o que essa conduta – de priorizar os interesses particulares em detrimento de uma postura impessoal de gestor – representa para o futuro das instituições do Brasil. Diferentemente como pensa o presidente, a população não pode contar com a imprevisibilidade "da sorte", mas com um planejamento correto para tirar o país do subdesenvolvimento político e econômico. Então, digam ao "Rei" e "ditadorzinho" latino-americano que ele não está acima de tudo e muitos menos acima de todos, pois ainda existe uma Constituição vigente no país. Basta saber se ainda existem pessoas dispostas a defendê-la.    


Marcelo Ferraz é jornalista e escritor.