Olhar Direto

Quinta-feira, 28 de março de 2024

Opinião

Teresa de Benguela: De rainha de Quilombo a samba de enredo

Encravado nos confins de Mato Grosso, o Quilombo do Quariterêre, que na língua tupi-guarani significa Piolho, fora administrado por duas décadas no século XVIII por Teresa de Benguela, viúva do fundador José Piolho.

Benguela tomou frente da comunidade de negros fugitivos e indígenas, mantendo-a através das trocas ou roubos de armas e utensílios de ferro, resistindo a alguns ataques e deserções. Para manter o equilíbrio político, Teresa governava com ajuda de um Conselheiro e do Parlamento. Na economia, além de produtos de subsistência, os moradores do Quilombo produziam algodão e fabricavam tecidos que eram  comercializados   fora dos limites da comunidade.

Sobre Teresa, realmente pouco se sabe. A começar pela grafia de seu nome às vezes escrito com a letra S e às vezes Z. A data de seu nascimento é outro fato incerto, pois além de ser negra escrava, era, também, fugitiva. Sobre sua morte, fontes documentais dos Anais de Vila Bela, de 1770, afirma que Teresa foi presa e decapitada, tendo sua cabeça exposta na praça do Quilombo. Porém, alguns historiadores sugerem que ela depois de presa cometeu suicídio. O fato é, que Teresa defendeu, com perspicácia por muitos anos o espaço quilombola, mantendo-o organizado política, social e economicamente. Em 1770, o Quilombo foi destruído pelas forças de Luís Pinto de Sousa Coutinho. Os 79 negros fugitivos e os 30 índios que consta na documentação foram aprisionados e mortos, assim como Teresa.

Para além da importância da figura feminina perante a resistência da escravidão, Teresa, representa a acuidade da mulher negra, escrava e líder na administração política, econômica, militar e social dos limites de sua comunidade.

Do Quilombo do Quariterêre Teresa de Benguela aflorou, sua luta transpôs os domínios coloniais e seu nome virou a Lei nº 12.987, de 2 de junho de 2014, promulgada pela então presidente Dilma Rousseff que instituiu o “Dia Nacional de Tereza de Benguela e da Mulher Negra,” a ser comemorado, anualmente, em 25 de julho. Seus poucos vestígios a fizeram desfilar nas passarelas do samba das cidades do Rio de Janeiro e de São Paulo. A primeira homenagem na Sapucaí, em 1994, o Grêmio Recreativo Escola de Samba Unidos do Viradouro, cantou o samba-enredo “Teresa de Benguela: uma rainha negra no Pantanal,” em seus versos a composição retratava a Rainha do Quilombo,
“No seio de Mato Grosso, a festança começava
Com o parlamento, a rainha negra governava
Índios, caboclos e mestiços, numa civilização
O sangue latino vem na miscigenação.”
 
A Unidos da Viradouro alcançou o 3º lugar, mantendo-se no grupo especial das escolas de samba do Rio de Janeiro. Este ano, “Benguela… a Barroca Clama a Ti, Tereza,” foi o tema do samba-enredo da Escola de Samba Barroca Zona Sul, da liga de São Paulo. A escola faz uma alusão a resistência de outrora com a voz do gueto, da favela, das misérias e mazelas que o povo ainda que  livres estão destinados a escravidão,
 
“O nosso canto não é apenas um lamento
A coragem vem da alma de quem ergueu o parlamento
Do castigo na senzala à miséria da favela
O povo não se cala, oh Tereza de Benguela
Vem plantar a paz por essa terra
A emoção que se liberta
E a pele negra faz a gente refletir
Nossa força, nossa luta
De tantas Terezas por aí”
 
A escola Barroca da Zona Sul, não levou o campeonato do Carnaval de São Paulo, ficando em décimo lugar na classificação geral. Porém, tanto a Viradouro quanto a Barroca da Zona Sul, levaram para avenida a importância de Teresa de Benguela, dos mecanismos de resistência que os Quilombos representaram contra a escravidão negra no Brasil. Resistir e persistir, é a sina de tantas Terezas por aí... 


Lidiane Álvares Mendes, é mestra em História pela Universidade Federal do Amazonas. Professora da rede pública e privada de educação em Mato Grosso.
Contato por e-mail: lidianemendes2@hotmail.com
 
xLuck.bet - Emoção é o nosso jogo!
Sitevip Internet