Olhar Direto

Sábado, 20 de abril de 2024

Opinião

As boas mulheres da China

“As boas mulheres da China” é um livro escrito pela jornalista Xinran, o qual retrata diversas histórias reais de mulheres conforme o contexto histórico e cultural em que cada uma vive.
                       
Xinran tinha um programa de rádio e começou a receber cartas de ouvintes mulheres contando suas experiências. Uma das narrativas que a autora conta no livro é sobre uma menina chamada Hongxue, que tinha uma mosca como animal de estimação.
                       
Hongxue foi abusada pelo pai aos 11 anos de idade. O pai veio da base militar para casa em uma de suas raras visitas e a mãe da menina havia dito a ele que a filha havia “crescido”,ou seja, menstruado. Então, o pai pediu para que a filha tirasse a roupa, pois ele queria ver se era verdade. Ele começou a passar a mão pelo corpo da menina: “Esses mamilozinhos já incharam? É daqui que o sangue vem? Esses lábios querem beijar o papai? É gostoso quando o papai passa a mão aqui assim?“. Hongxue tremia e seu pai pediu para que não contasse nada à mãe, dizendo que fazia isso porque a amava demais.
                       
O pai começou a se deitar na cama com a filha, trancava a porta, passava as mãos pelo corpo dela, depois começou a forçar a língua dentro de sua boca. Posteriormente, iniciou, nas palavras dela: “Cutucar com a coisa dura na parte inferior do seu corpo”. Ele usava as mãos para abrir as pernas dela e enfiava os dedos. Conforme o corpo de Hongxue ia ganhando forma, o pai ficava mais excitado, e ela se sentia mais e mais aterrorizada.
                       
A menina ficava cada vez mais magra, até que adoeceu. Na primeira noite no hospital, a enfermeira disse ao médico que ela tinha o sono muito perturbado e acordava assustada ao mais leve ruído. Mesmo doente, o pai vinha ao hospital se aproveitar dela, que estava com um tubo na veia e sem poder se mexer. Ficou duas semanas hospitalizada e, assim que voltou, o pai apertou-a enlouquecido contra seu corpo, dizendo que tinha morrido de saudade dela.
                       
Hongxue dizia que injeções, remédios, exames de sangue eram melhores do que viver com o pai e começou a se ferir para voltar ao hospital. Uma vez, estendeu o braço embaixo de um pedaço de ferro que estava caindo a fim de cortar a mão esquerda na altura do pulso. Quase perdeu a mão e ganhou sessenta dias no hospital, como dizia ela: “em segurança”.
                       
Contou à mãe, mas a mesma disse que pela segurança da família, ela teria que suportar tudo isso que o pai fazia. Nisso, a temperatura da filha subiu à quarenta graus e teve que ser novamente hospitalizada devido a um colapso cardíaco. Lá, ela adotou uma mosca como seu animal de estimação, pois segundo a mesma: “Uma mosquinha me mostrou um dia o toque de mãos carinhosas”. Cuidou da mosca, não deixava ela sair, nem que ninguém a visse, porque senão iam tirar ela de lá. Certo dia, a mosca morreu, então a menina colocou-a numa caixa de fósforos e foi até o bosque enterrá-la.
                       
Dias depois, o médico disse a Hongxue que ela teria que voltar para casa se o tratamento se estabilizasse, pois no outono haveria falta de leitos e as pessoas que tinham doenças prolongadas teriam de deixar o hospital. Ela não queria voltar para casa e bolou um jeito de continuar lá. Sua finalidade era se contaminar com doenças contagiosas, mas o acesso a essas enfermarias era restrito.
                       
Um dia, ela caiu da escada e teve um corte no braço. Uma das médicas disse à enfermeira que Hongxue tinha uma constituição fraca e poderia facilmente desenvolver septicemia, pedindo para que a enfermeira ficasse atenta a moscas na hora de trocar o curativo, pois as mesmas são grandes portadoras de doenças.
                       
Lembrando disso e sabendo que teria que voltar para casa, a menina disse que preferia morrer. Então, esmagou uma mosca em cima do corte no braço. Em seu diário escreveu: “Sucesso! Faz dois dias que a minha temperatura não para de subir. Eu me sinto muito doente, mas feliz”.
                       
Hongxue morrera de septicemia aos 17 anos.
                       
Triste e dolorosa é a história de Hongxue. Mas, já pararam para pensar que é também a história de tantas outras meninas?
                       
Não importa em que momento da sua vida você esteja ou onde você está, o que eu lhe peço é: não deixe o machismo crescer. Pois, conforme ele vai evoluindo, histórias como essa vão acontecer e alguns homens precisam ser parados.
 

Michelle Leite de Barros.
Advogada em Cuiabá-MT.
 

 
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