Olhar Direto

Quinta-feira, 18 de abril de 2024

Opinião

Federalismo na UTI

República Federativa do Brasil. A Federação é um valor de tamanha importância que foi expressamente incluído na nossa identidade nacional. Nossa personificação diante do mundo é a de uma república e de uma federação. Diz o artigo 1º da Constituição: a República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: a soberania; a cidadania; a dignidade da pessoa humana; os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; e o pluralismo político.

Hoje é a Federação que reclama urgência. Em tempos de pandemia e emergência de saúde internacional, não é exagero afirmar que a federação brasileira ingressou na UTI - unidade de terapia intensiva, de tanto ser alvo de agressões políticas e econômicas.

Em artigos anteriores, nesse mesmo espaço, já fiz a denúncia do federalismo traído, nos aspectos tributário e fiscal. Numa espiral crescente desde a virada do século, o governo central tem imposto maiores responsabilidades a estados e municípios ao mesmo tempo em que lhes nega recursos, tanto promovendo benefícios fiscais que impactam a sua receita direta como privilegiando fontes de arrecadação não passíveis de repartição compulsória, a exemplo das contribuições sociais.

Todavia, agora, neste cenário sem precedentes de gravíssima crise na saúde, com profundos impactos na economia e na política, a situação adquiriu uma dimensão extraordinária e potencialmente desestabilizadora.

Explico. Em tempos normais, estados e municípios respondem pela execução de 95% dos recursos públicos aplicados na assistência médica e hospitalar. Nas duas últimas décadas, a União reduziu relativamente a sua participação nos gastos totais com saúde.

O primeiro grande choque desta pandemia da COVID-19 é a necessidade imperiosa e imediata de aumentar os recursos destinados à saúde, de modo ampliar o número de leitos disponíveis, adquirir equipamentos hospitalares, testes e EPIs, remunerar horas-extras dos profissionais de saúde etc. Esse impacto se dá, principalmente, nos cofres estaduais e municipais, responsáveis pelas UPAs e rede hospitalar.

A segunda onda decorre da redução das atividades econômicas em decorrência das medidas de cautela preventivas da aceleração da propagação do vírus. Novamente, o golpe maior é nas finanças subnacionais, cujas principais fontes de receita própria são muito sensíveis à conjuntura econômica. Tributos estaduais como o ICMS e o IPVA ou municipais como o ISS e o ITBI já apresentam quedas dramáticas na arrecadação do segundo bimestre.

Por um lado, elevam-se as despesas; por outro, caem as receitas. E o que faz a União?

O que a União deveria fazer é liderar e coordenar um grande esforço de cooperação no enfrentamento da crise, envolvendo não apenas compensações financeiras, como iniciativas relacionadas à logística de produção, aquisição, importação e distribuição de grandes quantidades de testes, respiradores mecânicos, EPIs e o que for necessário.

Não é o que se vê. O governo federal mostra catatonia no enfrentamento da crise, prisioneiro de sua paranoia ideológica. É preciso compreender que prefeitos e governadores são autoridades eleitas e não subalternos da presidência. Deputados e senadores são representantes legítimos e suas propostas legislativas de repasses orçamentários a estados e municípios não constituem conspiração, mas iniciativas para suprir a omissão do Poder Executivo. Decisões judiciais, como as adotadas pelo STF suspendendo o pagamento de dívidas estaduais, são oásis de razoabilidade diante da insensatez e insensibilidade dos condutores da política econômica.

Enquanto os mandatários federais esbravejam contra governadores, prefeitos, Congresso, STF, imprensa, cientistas e sabe-se lá mais o que, cresce exponencialmente o número de infectados e vítimas fatais do coronavírus.

Como tantos brasileiros, a Federação está na UTI. Dela só sairá saudável mediante respeito e cooperação entre todos.





Luiz Henrique Lima é Conselheiro Substituto do TCE-MT.
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