Olhar Direto

Sexta-feira, 29 de março de 2024

Opinião

Onde se aprende o racismo?

Onde se aprende o racismo? Eu me fiz essa pergunta ao ler as notícias sobre mais um asqueroso episódio de racismo envolvendo adolescentes de um colégio de ensino médio no Rio de Janeiro. Conheço bem esse colégio, porque foi lá onde estudei nos dois anos finais do ensino médio. Posteriormente, foi nele que minha filha iniciou o ensino fundamental, antes de virmos morar em Cuiabá.

Onde se aprende o racismo? Como conheço o colégio, de excelente tradição humanista, tenho certeza de que lá não foi. Lá não há espaço para professores ou material didático impregnados de qualquer tipo de preconceito. No entanto, foram alunos desse colégio que, por meio de redes sociais, agrediram uma jovem negra de 15 anos, sua colega de turma, com linguajar de baixíssimo calão, racista e machista.

Onde se aprende o racismo? Nos condomínios da classe média e alta, onde a criança negra que vai brincar no parquinho é vista como intrusa e considerada filha de alguma doméstica ou porteiro? No lixo subintelectual de autores que romantizam a escravidão do Brasil Império e renegam a luta emancipatória de Zumbi dos Palmares, Luís Gama, André Rebouças, Francisco José do Nascimento, Maria Firmina dos Reis, João Cândido, Abdias do Nascimento e tantos outros? Nos cultos religiosos dominicais? Nas arquibancadas de competições esportivas? Nas letras de canções popularescas? No mau exemplo de autoridades? No noticiário policial, repleto de matérias sobre adolescentes negros assassinados por “balas perdidas”, em grande parte disparadas por fuzis policiais, como as que vitimaram essa semana um garoto de 14 anos que jogava videogame com os primos no quintal de sua casa em São Gonçalo-RJ?

Onde se aprende o racismo? Será que, como um vírus mortífero e infeccioso, o racismo se propaga pelo ar, contaminando os que não vestem a capa protetora do respeito à diversidade, às liberdades e aos direitos humanos? Será que se reproduz no código genético dos descendentes e herdeiros de escravocratas, traficantes de escravos, feitores, capatazes e capitães do mato?

“Não exagere, foi apenas uma brincadeira infeliz”. Essa é a desculpa de sempre, dos covardes de sempre. Já a ouvi da boca de machistas embriagados, homofóbicos e misóginos. Já a ouvi no discurso de totalitários enrustidos que tecem loas a ditadores e torturadores. Todos fanfarrões. Todos hipócritas. Todos poltrões. Todos vis e velhacos, que desonram a nacionalidade e a própria humanidade.

Não. Preconceito nunca é brincadeira. As agressões racistas, mesmo as verbais, produzem dor e sofrimento, deixam cicatrizes psíquicas, quando não corporais. Palavras têm consequências. Em regra, a violência verbal precede, antecipa e prepara a violência física. Todos os regimes fascistas da história, antes de aprisionarem pessoas em campos de concentração e extermínio, já as tinham violentado mil vezes em panfletos, discursos e “brincadeiras infelizes”.

O grande Nelson Mandela, a quem tive a oportunidade de abraçar duas vezes - uma no Rio de Janeiro logo após sua libertação depois de 27 anos como preso político, outra na Cidade do Cabo já como presidente da África do Sul - certa vez disse a respeito do hediondo regime do apartheid que combateu e derrotou: “Ninguém nasce odiando alguém, pela cor de sua pele ou por qualquer outro motivo. Se o homem pode aprender a odiar, também pode aprender a amar.”

Onde se aprende o racismo? Seja onde for, em toda parte e a todo momento é tempo de denunciá-lo e combatê-lo. Sem violência ou arbitrariedades, mas sem tréguas, sem titubeios, sem conciliação e sem perdão. Racismo é crime e crime inafiançável.





Luiz Henrique Lima é Conselheiro Substituto do TCE-MT.
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