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Quinta-feira, 28 de março de 2024

Opinião

O nióbio pode fazer diferença?

Autor: Caiubi Kuhn e Ricardo Latgé Milward de Azevedo

24 Ago 2020 - 08:00

Nióbio, sim o famoso nióbio. Ele é um elemento de transição, com número atômico 41, é o 33° mais abundante na Terra. Em geral, é usado para produção de ligas metálicas, com apenas 100 gramas do elemento, uma tonelada de aço fica mais maleável, resistente ou condutora. Um dos principais pontos fortes é a estabilidade térmica, que é fundamental em motores de aeroplano, foguetes e em vários supercondutores.

Desde Enéas, o nióbio entrou como tema no circuito político, sendo mais recentemente adotado como tópico constante do Bolsonaro. Mas precisamos considerar inúmeros fatores nesta discussão. Apesar de ter um valor elevado, algo entre 40 a 50 dólares o quilograma, muito superior ao valor pago pelo minério de Ferro que, em abril de 2020, custava 84 dólares a tonelada, porém muito inferior ao valor pago pelo ouro, por exemplo, que atualmente oscila próximo aos 300 reais a grama.

O Brasil é o maior produtor e possui as maiores reservas de nióbio do mundo. Entretanto, no ano de 2017, em valores absolutos o nióbio representou apenas 4,2% das exportações de produtos minerais, ficando atrás do minério de ferro (68,2%), alumínio (8,8%), cobre (7,7%) e ouro (4,2%).

O nióbio, assim como outros metais, é um componente complementar no processo metalúrgico. Então, sua demanda depende de variáveis que nós brasileiros, hoje, não controlamos. Ainda mais não estando este segmento industrial sob controle do estado, como era até a década de 1980.

Ampliar a escala a produção desse importante metal exige criar demanda. E isto, requer um esforço tecnológico/industrial, que só com políticas de estado é possível levar a termo.

O primeiro passo está em explorar a potencialidade deste metal em novas ligas, que aliás os centros de pesquisas como o CETEM e outros já devem ter muita coisa produzida. O segundo desafio está em implantar políticas que imponham a médio prazo a ampliação da participação deste metal no portfólio de produtos das siderúrgicas brasileiras e no uso pela indústria consumidora de aço.

Num país das dimensões, riquezas naturais, parque industrial e mercado de 210 milhões de pessoas, exige do governo federal resolver às necessidades do progresso e melhoria da qualidade de vida dos brasileiros aproveitando plena e racionalmente suas potencialidades. Temos exemplos exitosos de como fazer isto - a Petrobras, a Embrapa e a Embraer.

A Petrobras foi duplamente competente ao descobrir petróleo no nosso território onde os outros fracassaram, produzi-lo em condições absolutamente inéditas e ainda adequar suas refinarias para refinar óleo pesado. Suas soluções passaram a ser adotadas em todo o mundo. A Embrapa consegui em 40 anos "domar" o cerrado e os Gerais de "Guimarães" viraram um dos grandes celeiros do mundo. A Embraer uniu na necessidade do transporte aéreo brasileiro a oportunidade de fazer um jato comercial que se tornou sucesso mundial. Estão aí três exemplos exitosos, construídos por meio de investimentos em ciência e tecnologia induzindo a expansão do parque industrial e agrícola, utilizando a capacidade criativa e realizadora do brasileiro.

A mineração pode integrar o rol desses exemplos exitosos e contribuir ainda mais para o desenvolvimento do país. É um setor que tem um peso importante na balança comercial brasileira, mas tem seus olhos voltados por demais para a exportação de bens minerais. Será que não seria um bom caminho para o Brasil fortalecer a sua indústria metalúrgica?

Para avançar mais, com qualidade e melhores práticas, precisa de um planejamento bem mais sólido, aquilatando nossas potencialidades e superando as enormes lacunas de conhecimento geológico do território brasileiro. Os mapeamentos geológicos são instrumentos fundamentais para gestão estratégica e territorial do país, porém em muitas áreas as informações cartográficas ainda estão em uma escala inadequada, tanto para atração de novos investimentos, como também para realizar uma gestão territorial apropriada nos estados e municípios. A falta de investimento em cartografia é um obstáculo para fomento a novos projetos de mineração, sejam ela de grande ou pequeno porte.

Os países com mais desenvolvidos, ou com projetos de futuro valorizam o conhecimento. Preferem exportar bens agregados e produtos industriais aos bens naturais. Exportam derivados de petróleo em vez de petróleo bruto. Dão prioridades a fabricação de chips, fármacos, sementes mais resistentes, enfim, as necessidades essenciais ao mundo moderno e à vida, do que estimular apenas a produção de produtos primários.

A discussão do nióbio tem sentido se entendermos como a ponta de um iceberb. Embora importante, não será só com proselitismo da sua potencialidade e da riqueza de determos mais de 98% de suas reservas que fará a diferença. O que se precisamos é criar políticas nacionais adequadas para o seu aproveitamento, como fomos capazes de fazer para poder produzir e usufruir do petróleo brasileiro, dos alimentos que vêm dos Gerais e cruzar os céus num confortável jato brasileiro. E para traçarmos esse caminho precisamos de investimentos em mapeamento geológico e em ciência e tecnologia.


Caiubi Kuhn, Geólogo, Professor da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) e Conselheiro do CREA-MT.

Ricardo Latgé Milward de Azevedo, Geólogo, Conselheiro do CREA-RJ e do Clube de Engenharia (RJ)
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