Opinião
Humildade: A Força Silenciosa que Transforma
Autor: Sandro Brandão
14 Abr 2025 - 08:00
O que você faria se tivesse todo o poder do mundo por um instante? Talvez construísse um império, talvez apagasse os inimigos. Na Semana Santa, Aquele que detinha todo o poder escolheu o silêncio, o sacrifício, o amor. E não por submissão, mas por consciência. Em um mundo onde status, cargos e curtidas parecem definir o valor de alguém, o ensinamento de Jesus inverte a lógica vigente. E talvez, se quisermos viver de modo diferente, devamos começar exatamente por aí.
Jesus personificou a humildade como ninguém. Sua trajetória não foi um espetáculo de poder, mas um convite ao acolhimento. Ele não se impôs. Preferiu tocar as pessoas com gestos simples, como o de lavar os pés dos próprios discípulos — não como sinal de submissão, mas como quem entende que servir também é amar. Entrou montado num jumento, não porque não pudesse montar um cavalo, mas porque sabia que a grandeza, quando é real, não precisa de símbolos para ser notada. Cada passo de sua caminhada anunciava que é possível transformar o mundo sem levantar a voz.
O que isso nos ensina? Que humildade não é algo etéreo, espiritualizado demais, inalcançável. Ela se constrói no cotidiano: está em como escutamos mais do que falamos; em como lidamos com nossos erros e os alheios; em como tratamos quem não pode nos oferecer nada em troca; em como aceitamos a crítica sem revidar; em como oferecemos ajuda sem precisar anunciar.
Quando você tem razão, mas prefere compreender antes de vencer uma discussão. Quando você escolhe ficar em paz com todos em vez de realizar um sonho individual. Quando você poderia humilhar alguém, mas escolhe o silêncio. Eis a prática da sublime humildade.
E aqui está uma perspectiva que raramente é dita: ser humilde exige autoconhecimento. Só consegue praticar quem se conhece. Quem já fez as pazes com suas fragilidades e não precisa escondê-las atrás de cargos, roupas, conquistas ou diplomas.
Às vezes confundimos humildade com apagamento. Mas quem procura ser verdadeiramente humilde nunca se apaga, apenas não ofusca os outros. E isso é revolucionário. Pense em uma pessoa que você admira profundamente. Provavelmente não foi a que falou mais alto, mas a que te ouviu de verdade. Não foi a que te mostrou tudo que sabia, mas a que te fez sentir à vontade para aprender junto. A humildade deve ser assim: silenciosa, mas inesquecível.
E não pense que ela está distante das grandes responsabilidades. Pelo contrário. O mundo precisa desesperadamente de líderes que carreguem a humildade no coração. Mas, infelizmente, muitos a confundem com fraqueza ou passividade. É possível ter prestígio sem perder a ternura.
É preciso ter consciência de que ocupar um cargo de liderança é uma função, não uma medalha. E que qualquer poder, por maior que pareça, é sempre um empréstimo — um dia, devolvemo-lo. Talvez essa seja a maior lição da Semana Santa: a glória não está na coroa de ouro, mas na coragem de fazer o bem, mesmo quando se está com a cruz nas costas. Recordemos quando Pilatos assegurou a Jesus que tinha o poder de vida e morte, e que em suas mãos estava seu destino, e Jesus alertou-o dizendo: "Procurador, a autoridade de que desfrutas não é tua; foi-te concedida e poderá ser-lhe retirada".
Por isso, não percamos a oportunidade de, em qualquer situação, oferecer o melhor de nós a todos, indiscriminadamente. Estar disponível para quem amamos não é se anular, é se reconhecer parte. É a humildade de saber que não estamos aqui apenas para sermos importantes, mas para sermos presentes.
A boa notícia é que ninguém nasce pronto para ser humilde, mas todo mundo pode escolher praticar. Não é preciso mudar de vida, basta mudar o jeito de estar nela. É algo que se planta e se cultiva, dia após dia. E quem cultiva a humildade, cedo ou tarde, colhe frutos extraordinários: um coração mais leve, relações mais honestas, e uma alegria que não depende da aprovação de ninguém. Porque a humildade, no fundo, é a liberdade de ser grande sem precisar parecer.
Ser humilde é ser forte o suficiente para não precisar ser temido. É ser grande o bastante para não se preocupar em parecer maior. É agir com leveza mesmo quando tudo pesa. E mais: é reconhecer que, apesar de nossas conquistas e talentos, somos passageiros de um planeta minúsculo girando num universo infinito, sustentados por um fio invisível chamado vida. O Sol que nos aquece é apenas uma estrela entre bilhões — e nós, fragmentos temporários de uma história que mal compreendemos. O orgulho, diante disso, é no mínimo cômico.
Falamos muito em inteligência emocional, mas é a humildade que nos conduz à inteligência espiritual. É a virtude que acolhe, que escuta, que aprende — mesmo quando poderia ensinar. É o que possibilita ao ser humano viver com dignidade em qualquer condição. Em tempos de ostentação emocional, a humildade é resistência serena; em tempos de gritos, é o silêncio que cura.
Talvez a maior prova da humildade seja viver com um coração que não se envaidece, mesmo quando tem razão para isso. Um coração capaz de ajoelhar-se, não porque é pequeno, mas porque é sábio. Porque entende que só quem se abaixa para servir é capaz de se elevar de verdade.
Se quisermos um mundo mais justo, mais leve, mais amoroso, que plantemos a humildade como semente no solo do cotidiano. Que ela floresça nos gestos, nos encontros, nos reencontros, nas palavras e nos silêncios.
Porque no fim, quando tudo o que é material deixar de importar, será a humildade que nos tornará inesquecíveis.
E talvez, só talvez, seja pela humildade que a gente se aproxima do que é essencial: do outro, de nós mesmos, da vida que pulsa no que é simples.
Enquanto o mundo aplaude quem grita mais alto, a Semana Santa sussurra: talvez a verdadeira força esteja naquilo que não precisa se exibir. Humildade não é ausência de poder. É a maneira mais bela de exercê-lo.
Sandro Brandão é Secretário Adjunto de Planejamento e Governo Digital (SEPLAG-MT).