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Opinião

SITUAÇÃO JURÍDICA NO PANTANAL DO ESTADO DE MATO GROSSO

THAIANY COSMES DA SILVA

A região compreendida como Bacia do Alto Paraguai no Estado de Mato Grosso (Pantanal de Mato Grosso) representa uma região significativa para a economia mato-grossense, representada, especialmente, pela atividade de pecuária extensiva. Segundo dados técnicos pesquisados pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), a atividade pecuária no Pantanal de Mato Grosso teve início ainda no século XX, atividade essa que se incorporou ao bioma de forma harmônica, coexistindo com sustentabilidade.

Apesar da resiliência do empreendedor pantaneiro, a ausência de regulamentação das atividades e de procedimentos imprescindíveis à sua manutenção, a exemplo da limpeza de área, resultava em um entrave jurídico para o desenvolvimento sustentável no Pantanal.

Com vistas a resolver a ausência de regulamentação, baseado em estudos da EMBRAPA em cooperação com a Secretaria do Estado de Meio Ambiente, o Estado de Mato Grosso editou a Lei nº 11.861/2022, que altera a Lei nº 8.830/2008 (Lei do Pantanal), prevendo normas para a regularização de atividades e avanços para garantir a continuidade da atividade econômicasustentável.

A legislação em questão, dentre outras previsões, regula a atividade de pecuária extensiva, restauração de pastagem nativa e a limpeza de pastagem, mediante autorização do órgão ambiental, com as restrições nela previstas.

Tal normativa traduz um avanço ambiental e econômico para o Pantanal, sobretudo, porque a regularização, mediante autorização do órgão ambiental, é um instrumento da Política Nacional Ambiental, pois dá máxima efetividade ao princípio da prevenção, buscando evitar danos ambientais em propriedades licenciadas, cujo responsável é facilmente identificável.

Destaca-se que o Pantanal Mato-grossense é considerado como patrimônio nacional, porém não existe vedação à sua utilização, a qual, segundo o § 4º do art. 225 da Constituição Federal, Página 2 de 4 “far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais.”.

A propósito, a Constituição do Estado de Mato Grosso disciplina a utilização do Pantanal na forma regulada em lei, ao estabelecer que “o Pantanal, o Cerrado e a Floresta Amazônica Mato-grossense constituirão polos prioritários da proteção ambiental e sua utilização far-seá, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais.” (art. 273 da CE).

Apesar disso, a legislação tem sua constitucionalidade discutida perante o Poder Judiciário, sob a acusação de ofender o direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.

Dentre os pedidos formulados na referida ação, pretende-se, em sede de cautelar, a suspensão da Lei questionada, bem como a interrupção de quaisquer atos administrativos (licenças, autorizações, etc.) que tenham por fundamento tal normativa.

Muito embora o pedido cautelar e o mérito não tenham sido julgados, o cenário de incertezas está instaurado, havendo, por ocasião da discussão jurídica, fundado temor de que a atividade de pecuária extensiva,
desenvolvida há séculos no Pantanal, seja extinta por efeito dos ataques à legislação que à regulamenta.

Este cenário, certamente prejudicará toda economia do Estado, já que a Planície Alagável do Pantanal representa uma área de 4,92 milhões de hectares do Mato Grosso, abrangendo os municípios de Barão de Melgaço, Cáceres, Curvelândia, Itiquira, Juscimeira, Lambari D’Oeste, Nossa Senhora do Livramento, Poconé, Rondonópolis e Santo Antônio do Leverger.

Estudos estimam o impacto em 5.512 (cinco mil, quinhentos e doze) empregos diretos e indiretos, decorrentes das atividades desenvolvidas nos municípios incidentes na Planície Pantaneira. Assim, caso seja declarada inconstitucional a Lei nº 11.861/2022, além do retrocesso ambiental resultante do vazio normativo para atividades desenvolvidas no Pantanal no Estado de Mato Grosso, também resultará em perda econômica, não apenas na geração e manutenção de Página 3 de 4 empregos, mas também na arrecadação dos entes federativos e nos preços de bens e serviços disponíveis no mercado.

Enquanto isso, o Supremo Tribunal Federal (STF), em 05/06/2024, decidiu, por maioria, a existência de omissão do Congresso Nacional em editar lei que garanta a preservação do Pantanal Mato-grossense, através da Ação Direta de Inconstitucionalidade Por Omissão (ADO) nº 63, concedendo ao Poder Legislativo o prazo 18 (dezoito) meses para regulamentar o tema, vigendo a normativa dos Estados até a edição da normativa. Neste cenário de incertezas, as atividades centenárias que coexistem com o Pantanal no Estado de Mato Grosso, e a ele integradas, aguardam do Poder Judiciário e do Poder Legislativo melhor definição sobre a sua preservação e regularização. 

Thaiany Cosmes da Silva é Pós-Graduada em Direito Constitucional, Pós-graduada em Direito do Agronegócio, Pós-graduanda em Direito Empresarial e Governança Coorporativa, Coautora do Livro “Direitos Fundamentais, Direito Agroambiental, e Sustentabilidade”, e atua como advogada nas áreas do Direito Ambiental, Agronegócio, Agrário, Minerário e Civil.
 
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