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Opinião

8 de março: porque ainda é muito necessário o dia da mulher

Glaucia Amaral

A data é necessária porque é um dia de luta, de honrar a memória das conquistas e de dizer que não desistimos e não arredamos de nosso direito à igualdade. São necessárias muitas ações afirmativas concretas, e muito investimento em educação e cultura, para que alcancemos a igualdade de direitos entre todos os seres humanos, seja qual for o gênero.
 
A igualdade de direitos é um sonho de homens e mulheres que desejam uma sociedade mais justa. Embora tenhamos dado longos passos, ainda há muito que caminhar. Março de 2019 trará alguns passos simbólicos. No dia 29, a NASA, a agência espacial americana,  promoverá uma caminhada histórica. Um grupo formado somente por mulheres fará uma caminhada no solo lunar. É um símbolo. Que significa que mulheres podem o mesmo que homens. Inclusive ser astronautas.
 
Enquanto isso, aqui na terra nós mulheres vamos jogando futebol, fazendo samba choro e rock'n'roll, podemos fazer tudo, mas a maioria de nós mulheres ainda enfrenta a dupla ou tripla jornada, ou seja  pode ser o que quiser, mas os deveres domésticos e os deveres em relação os filhos não são igualmente divididos entre os indivíduos que moram na mesma casa.
 
Ainda é pressuposto que a mulher trabalhe fora e sozinha se responsabilize pela higiene, alimentação e organização de todos que residem na casa. Um tipo de trabalho que se fosse remunerado individualmente já seria uma profissão, aliás, se constitui no trabalho de diversos tipos de profissionais (motorista/mãetorista, empregada doméstica, cozinheira, lavadeira, passadeira, etc.).No mercado de trabalho, mulheres ainda enfrentam preconceito, assédio, violência e salário muitas vezes inferior aos colegas homens que fazem o mesmo tipo de trabalho.
 
Das mulheres ainda se exige uma moral mais rígida que a do homem e ainda vemos, até em situação de violência, que a vítima mulher é questionada nessa nossa sociedade oriunda de uma tradição cultural, e estrutura legal patriarcal, na qual o próprio Código Civil previa ser o homem o chefe de família e definia a natureza jurídica da mulher como um ser "relativamente incapaz" para a prática de boa parte dos atos civis, incapacidade essa afastada, conforme seu status de relacionamento: viúva, casada ou solteira. Havendo ainda distinção legal entre a mulher solteira virgem e a não virgem.
 
São muito poucas décadas a nos separar dessa estrutura social - muitas de nós ainda fomos submetidas a esse tipo de norma. A violência doméstica, violência de gênero, que tem sua raiz no pensamento de que homens são superiores às Suas companheiras podendo dispor de seu corpo, mandar em seu tempo, e inclusive ter o direito de lhes tirar a vida caso contrariados. Esse tipo de violência bate tristes recordes Em nosso estado, cada vez mais horrorizando a população, pela crueldade crescente com a qual vem sendo praticada.
 
Familias destroçadas, mães, filhas, irmãs, assassinadas. Mulheres estupradas, com sequelas psicológicas para a vida toda...
 
Ainda é necessário dia da mulher para que tratemos deste assunto, para que não olhemos para outro lado, fazendo de conta que nada disso existe. Para dar visibilidade a necessidade social, econômica e humanística, de conferir cidadania plena a 51% da população. Nós mulheres somos mais da metade dos contribuintes deste país, no entanto essa representatividade não se reflete nas funções de comando e na política.
 
É certo que com perseverança, talento pessoal, coragem para enfrentar códigos e crenças sociais limitadoras, hoje muitas mulheres ocupam espaço de destaque no mundo dos negócios, na política, no serviço público e na vida social em geral. Mas não é a realidade da maioria da população. E deveria ser um processo natural a qualquer ser humano o seu pleno desenvolvimento e o alcance. De sucesso graças a suas potencialidades e não uma luta que compreende enfrentamento de preconceitos sociais e muitas vezes da própria família.
 
Assim mesmo as mulheres que hoje alcançam destaque, enfrentaram a dificuldade do tratamento desigual.
 
E ainda: seja o que for que tenhamos alcançado devemos a oportunidade de estudar, poder gerir uma empresa sem necessidade de autorização de um homem (em 1919, seria impossível!) a décadas de luta de feministas históricas,  lutas nas quais muitas perderam a própria vida. Feministas, sufragistas e tantas outras, tão ofendidas e atacadas ao seu tempo, às quais sempre devemos agradecer,  e cuja memória todos nós, homens e mulheres, devemos honrar, Por terem corajosamente e incisivamente aberto a porta, para uma sociedade mais igualitária dando Passagem a professoras, médicas, ministras, agricultoras que podem sozinhas arar a terra e sustentar seus filhos...
 
Abriram a porta para que possamos dizer que não somos coisa e não merecemos ser assassinadas por nossos companheiros, para quem tenhamos o corpo do jeito que desejarmos, para termos oportunidades iguais (e ainda chegaremos lá). A porta foi aberta por aquelas mulheres que morreram queimadas em uma fábrica, em um oito de março, para que milhões de meninas se sentar em bancos de escola e sonhar em um dia ser o que desejarem inclusive sonhar em ser astronautas e dar uma volta na lua. Ou, como no meu caso, ser procuradora do Estado onde moro.
 
Viva o 8 de março, dia de luta pela igualdade real que vem de décadas, e continua, honrando a memória e a ideia de igualdade.
 

Glaucia Amaral é presidente do Conselho Estadual de Direitos da Mulher de Mato Grosso.
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