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Opinião

E viva as diferenças!

Lucy Macedo

Conversando outro dia com um amigo, pai de dois meninos lindos, fiquei sabendo que um deles, o de 11 anos, era um autista. A conversa foi fluindo e ainda que não tenha sido uma conversa acadêmica, até bem longe disto, nem tão longa , pude aprender e sentir no entanto, sobre como sofrem estes pais em sua luta para salvaguardar os direitos dos filhos.

Pequenas e grandes situações vividas por eles que nos obrigam a uma reflexão sobre o quanto somos tão desnecessariamente pequenos. E, ainda, como nos portamos socialmente quando problemas como estes, não fazem parte da nossa realidade diária.

Assim, claro como mãe de um menino o qual dedico minha vida e todo o meu amor também, me emocionei com tamanha dedicação e amor deste amigo, por este filho em especial. Mais do que isto, sua determinação em estar disponível para ele em tempo integral. Conciliando, Deus sabe como, trabalho e todas as outras responsabilidades do dia a dia, sem faltar um só momento em amor, em tratamento, em educação, numa vigília ininterrupta em favor desta criança que ele o definiu com uma palavra : “guerreiro”.

É neste momento que a gente se sente 'miúda', 'um grão de areia', diante de coração tão gigante, como deste pai, que não convive tão somente com o espectro autista. Muito antes, precisa conviver com uma outra situação: a discriminação.

Como meu amigo, milhares de outros pais Brasil afora tiveram que aprender a conviver com enormes e brutais negativas sociais, por conta de seus filhos serem portadores de algum tipo de deficiência, como se ainda estivéssemos sob a tutela de uma sociedade espartana que matava os seus, jogando crianças recém-nascidas com alguma deficiência do alto do monte Taigeto a mais de 2.400 metros de altura, por não estarem dentro do padrão físico adequado.

Ou ainda como disse um dos mais ilustres romanos, Lucius Annaeus Sêneca [4 A.C. a 65 D.C.], que preconizou em seu famoso discurso em favor da perfeição e estética corporal, que a deficiência precisava ser observada como aberração, como forma de ser legitimado os atos seletivos.

"Não se sente ira contra um membro gangrenado que se manda amputar; não o cortamos por ressentimento, pois, trata-se de um rigor salutar. Matam-se cães quando estão com raiva; exterminam-se touros bravios; cortam-se as cabeças das ovelhas enfermas para que as demais não sejam contaminadas; matamos os fetos e os recém-nascidos monstruosos, caso nasçam defeituosos; e afogamo-los não devido ao ódio, mas para distinguirmos as coisas inúteis das saudáveis".

E é bem desta forma que estes meninos com espectro autista são observados. Ainda que não os joguemos mais de cima das montanhas ou os afoguemos, os matamos, no entanto, silenciosamente, com a exclusão social. Com os olhares pseudo piedosos de pessoas que nem mais escondem seus julgamentos contra aqueles a quem chamam de diferentes ou, melhor, que não se encaixam, via de regra, no conceito de 'normal'.

Emocionada com o depoimento daquele pai, sobretudo, do distanciamento que temos desta realidade, por não ser a nossa, me senti profundamente incomodada com nossa omissão.E quanto mais busquei - por meio de pesquisas - sobre o espectro autista, mais incomodada eu fiquei, ao observar que as pessoas com deficiência andam em um terreno fértil para o preconceito, em razão do seu distanciamento dos padrões físicos ou intelectuais do que culturalmente julgamos como 'anormal'.

Meninos e meninas que vivem expostos à situações de agressão e violência, geradas sob a égide de que estas pessoas seriam 'limitadas'. Desta forma, estrategicamente, colocadas às margens da sociedade. Em históricos recheados de relatos de práticas discriminatórias, como o bullying.

Descobri que o autismo [em algumas situações semelhantes a da Síndrome de Asperger], se caracteriza por condições comumente marcadas pela forma diferente como estas crianças percebem o mundo e como a partir disto se interagem com ele e as pessoas. Então, neste momento, pude perceber que estas crianças são mesmo especiais e nós, em contrapartida e, infelizmente, somente 'normais'. E, aliás, que muitos de nós perambula pela vida agindo e reagindo comumente com 'o fígado', confabulando com conceitos pequenos e realidades rasas.

Mais do que isto, agora sei, que sorte tem estes meninos, porque para tamanha responsabilidade de cuidar destes portadores da luz, só pais muito especiais. Que vivem com respostas na ponta da língua sobre o direito de seus filhos não serem submetidos a discriminação com base na deficiência. Pois está escrito nas leis de Deus e do homem que toda forma de preconceito fere a dignidade humana e é passível de punição, para aqueles que o pratica.

Mas se tudo isto, ainda for pouco. E se não for uma lenda urbana ou assunto proibido, por conta, igualmente, deste preconceito culturalmente perpetuado entre nós, mirem-se aqueles que não entendem a grandiosidade das diferenças, no exemplo do autismo de Leonel Messi. Gênio inquestionável do futebol, no patamar de Diego Armando Maradona e Pelé e que foi diagnosticado quando criança, aos oito anos de idade, com a síndrome de Asperger. Hoje, muitos especialistas têm dito que foi o autismo [olhado como deficiência], que teria ajudado Messi a se tornar o gênio que é, revelados no seu comportamento em campo, nas jogadas, nos dribles, na movimentação, no chute.

Então, a estes pais tão especialmente escolhidos por Deus e amparados pela espiritualidade amiga, para serem guardiões destes pontos de luz que caminham entre nós, parabéns! E obrigada pela honra de ter sido escolhida para escutar história tão fascinante. Gratidão! E, claro viva as diferenças!

Lucy Macedo é advogada, empresária, Diretora do Site Única News e Revista Única.
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