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Opinião

Amor e Amor Próprio

Heduardo Del Pintor Vieira

Pode soar contraditório, mas espero que soe esclarecedor: um dos mais excêntricos perigos de se apaixonar por alguém é a reação que se tomará quando o outro começar a amar de volta.

Muitas razões justificam as paixões, e uma das mais recorrentes é o desejo de escapar de si mesmo; afogar-se no abraço de uma pessoa que parece extraordinária, bela e realizada à proporção que o sujeito sente-se imperfeito, confuso e inseguro. E então a ameaça vem à tona: e se a pessoa amar de volta? O dilema surge aqui, quando a mente sabota as emoções por julgar que um ser idealizado não poderia ter tão péssimo gosto para aprová-lo no amor.

Ainda que sem verbalização, muitos sabem – ou acabam descobrindo – que um dos requisitos para um bom relacionamento é certo grau de afeto por nós mesmos. Não é fácil para a maioria, pois é uma construção de anos, sobretudo na infância. Sem o legado de que somos merecedores de amor, nós respondemos às ternuras que nos são concedidas com, no mínimo, confusão. Sem uma quantia decente de amor próprio, o amor da outra pessoa sempre parecerá doentio e equivocado; e daí revela-se a direção que muitos tomam, inconscientemente, de autodestruir, de repelir ou de desapontar as pessoas que os amam de volta. Simplesmente parecerá mais normal e, assim sendo, confortável ser rejeitado ou ser ignorado, quando isso é o que o sujeito mais conhece.

Sem estar totalmente convencido da própria capacidade de amar e ser amado, o sujeito que recebe afeto pode sentir como se estivesse recebendo um prêmio por uma realização que nunca conquistou. De acordo com Lacan, somos seres desejantes, incompletos por natureza. Nossa incompletude preenche-se com desejos e quereres, e, por isto, estamos sempre em busca de algo que possa nos completar. No amor, não é diferente.

Evitando a covardia emocional, quem se envereda no amor precisa estar preparado para saldar as dívidas que vem com ele. Geralmente, a maneira como um relacionamento simboliza o bom e o realizador ou o ruim e o abusivo depende da balança entre o amor próprio e o ódio de si mesmo. Caso o ódio prevaleça, pode ser que a pessoa-que-ama-de-volta sinta-se infeliz em receber toda a autodestruição do outro. Agora, caso o amor a si sobressaia, ambos os parceiros desfrutam do fato de que o amor correspondido não é prova de que o sujeito não é bom o suficiente, e sim de quão amável ele pode ser.

Portanto, amar pode ser uma das coisas mais gentis e românticas que podemos fazer se aprendermos a nos amar primeiro.



Heduardo Del Pintor Vieira é Psicólogo – CRP: 18/05294 e pós-graduando em Psicoterapia Psicanalítica. Meu contato está aberto para te ouvir: (65) 98124-3734 / Email: psi.heduardodelpintor@gmail.com


 
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