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Opinião

Com ou sem pandemia

Rui Perdigão


 
Quem pensa que o mundo está desgovernado, perdido e sem rumo está iludido ou já está velho gagá. O poder existe e é firmemente exercido sem distrações e com objetivos bem definidos. Desenganem-se aqueles que pensam que quem determina o que fazer, é o legislativo, o executivo ou o judiciário. Infelizmente esses poderes, eleitos ou não, são compostos essencialmente por personagens burocráticos extremamente privilegiados e dependentes. Até o auspicioso "quarto poder" deixou-se dominar a troco de uma imprensa de fretes e de mídias digitais impulsionadoras de muita ignorância. O que é compreensível, pois todos sabem que a informação é poder e a educação libertadora. 

A própria luta das gigantes "minorias" vai-se afirmando com novas agendas e territórios, mas em boa verdade só lhes é concedido caminho rumo ao establishment.Opoder instalado não aceita a diversidade. Essa sua psicose confere-lhe investidura estratégica para a polarização política, entre dois gêneros que dançam perfeitamente juntos. Com essa música tocando ficam reunidas as condições para que eventuais alternativas se construam por via de um darwinismo social. A capacidade de se adaptar a uma vida em cima de um muro. O que também é compreensível, pois como todos também já sabem quem divide reina e quem reparte partilha. 

Importante também registrar que o poder se sustenta, em grande medida, através de uma metodologia de alteração da realidade. Palavras da maior importância, como povo, fome, miséria, que tanto incomodam os seus maiores responsáveis, são redefinidas e o seu significado adquiriu já condição depreciativa. Direitos, liberdade, sonho, são outras palavras que vêm sendo aprisionadas num campo onde já só parecem fazer sentido se proferidas por advogados, carcereiros ou pastores. Mas não são só palavras soltas que estão a sofrer alterações. Novos significados têm-se procurado obter com a associação de palavras. Um bem exemplo disso é "o moderno fascismo democrático". Ou seja, o cara é fascista, mas é eleito por sufrágio universal, logo se entende tratar-se de um fascista democrata. Algo bem demonstrativo dessa exaustiva busca pela alteração da realidade que vem sendo introduzida com recurso há técnica do repita, repita, repita até que a pessoa aprenda. Parece compreensível né! Só que já sabemos muito bem o que é o fascismo, mas se você não sabe é aconselhável que vá aprender. A sua vida pode depender disso. 

Algo mais de que o poder não larga mão, com receio de deixar de o ser, é o lucro acima de tudo e o seu acima de todos. Para isso, nas suas contradições, vem fomentando o enfraquecimento das instituições nacionais e internacionais e promovendo conflitos regionais e caçadas a inimigos imaginários. E em simultâneo, para se garantir, endurece a mercantilização do saber ao ponto de já conseguir patentear a vida. Nem a presença de mais uma pandemia atroz enfraquece a sua reverência pela primazia da economia sobre a vida humana. 

O que fazer...!? No mínimo, dos mínimos, talvez fosse oportuno realizar uma assembleia geral extraordinária da Organização das Nações Unidas para pensar o futuro da humanidade. E nela seria seguramente importante pensar se a Big Techdevepoder engrossar a sua competição com os estados sobrepondo-se aos interesses públicos. Pensar também seriamente sobre novas intensões de programas de recuperação dos mercados de capitais. Pensar em particular no mercado de trabalho, na pobreza, nas desigualdades, na dignidade...no fundo, pensar efetivamente no que nos falta. 

E você o que pode fazer!? Pode e deve desconfiar do que parece normal e examinar o que lhe parece impossível de mudar. 
 
Rui Perdigão – Administrador, geógrafo e presidente da Associação Cultural Portugueses de Mato Grosso.  
 
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