Imprimir

Opinião

Um texto ignorante

Fernando

Há muito que busco soluções para os problemas que se colocam a minha frente, em especial as soluções dos problemas sociais. Nessas buscas de soluções desmedidas, é muito fácil cair nas respostas mais clichês. A solução sempre é mais educação, segurança, mais médicos, investimentos aqui e acolá. Sem desmerecer estas respostas, prefiro aprofundar um pouco mais, e invés de perguntar 'qual é a solução?', prefiro tentar responder 'por que não aplicamos as respostas?'.

Antes de falar qualquer coisa, preciso falar de uma situação da qual passei. Voltando de uma reunião de amigos, à noite, deparo-me com uma viatura policial. Como de praxe, diminui a velocidade e esperei o comando de algum policial, não vi nenhum (mas pode ter acontecido, já que tinha uma luz em minha direção, dificultando a minha visão), eis que vejo um deles me apontando uma arma, esbravejando palavras de baixo calão e me perguntando se eu gostaria de tomar um tiro (como se alguém acordasse em um belo dia e tivesse o desejo de levar um tiro). Permaneci calmo, para não fazer nenhum movimento brusco que pudesse aumentar o estresse do momento. No final, dei ré e segui a orientação do policial.

A situação me fez pensar em outras histórias de colegas, negros, que em situação semelhante não tiveram 'a mesma sorte' que a minha, só ouvindo palavrões. Já ouvi histórias de pessoas que apanharam por estarem onde estavam e, não duvido, mais do que isso, apanharam por terem a típica aparência de 'marginal'.

E foi aqui que pude entender que as respostas sempre estiveram por ai, mesmo as mais 'básicas' e 'rasas', no entanto, o mais importante que pude aprender é que as coisas não mudam devido a ignorância que cada um possui por permanecer sempre na sua zona de conforto.

Ignorância é, em suma, a falta de informação sobre algo. Neste sentido, como posso falar a solução para a segurança pública é aumentar o efetivo de policiais se os que já são efetivos têm péssimas condições de trabalho? Como posso falar que a resposta é contratar mais professores se, talvez, o problema pode estar na evasão escolar? Tudo isto é ignorância.

A informação plena e próxima se torna a melhor resposta que pode se dar em qualquer problemática. Neste sentindo, é facilmente compreensível do motivo que a nossa realidade dificilmente muda. Digo mais, mesmo que todos os problemas sociais sejam problemas de todos, mas atingem, em regra, parcelas da população, desinteressando outras parcelas, estas ficam alheias por não serem afetadas.

Normalmente somos ignorantes em muitos assuntos, até que esta ignorância nos afete de forma forte. Por exemplo: Se alguém diz que o problema da saúde é a falta de médicos ou investimentos, temos uma resposta genérica. Quando esta mesma pessoa perpassa por uma experiência que necessite de auxilio médico e prova de sua realidade, começa a atender o quão fundo é o buraco. Bom, já teríamos uma mitigação da ignorância pela experimentação do fato, mas importante lembrar de que informação não basta, é preciso fazer algo com ela. Que adianta entender o que está acontecendo e não fazer nada?

Irei fazer um link deste artigo com outro chamado "Artigo clichê esperando algo inédito", onde digo:

Esse texto é chover no molhado. Mas eu quis trazer o questionamento: se queremos que algo mude, quem somos nós nessa mudança? Aqueles que esperam a mudança ou os que mudam? Não tem como ser os dois ao mesmo tempo. Se você espera pela mudança, logo você é ainda aquele que não mudou.

Quando sofri com o abuso de autoridade policial, ali sim pude compreender, na pele, o que muitos sentem por aí, entretanto não levava a sério por não ser comigo. Pimenta nos olhos dos outros é refresco, mas olhe caminhoneiros, não parem de fazer as entregas. Pimenta nos olhos dos outros é refresco, desde que não diminua o meu salário para se equiparar ao das mulheres. Pimenta nos olhos dos outros é refresco, desde que não me sigam dentro da loja. Pimenta nos olhos dos outros é refresco, desde que quando eu chegue no pronto socorro e tenha leitos para mim. 


 Fernando é acadêmico de Direito, estagiário, além de escritor e poeta amador.
Imprimir