O teatro com 280 lugares na icônica Galeria do Pádua, que chama atenção de quem passa pela avenida Miguel Sutil, em Cuiabá, representa a realização de um sonho que o artista plástico Antônio de Pádua, de 70 anos, acalenta há mais de três décadas. Neste sábado (15), o palco será ocupado pela primeira vez na inauguração oficial do espaço, a partir das 18h.
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Bem-humorado, Pádua comenta em tom de humor que espera que o teatro se torne, para Cuiabá, o que o Taj Mahal representa para a Índia – uma das Sete Maravilhas do Mundo. Com a comparação, o artista plástico destaca que o espaço estará de portas abertas como parte da rota turística da cidade. 'Vai ser como ir a Roma e não ver o Papa', acrescenta, em tom descontraído.
Foram necessários 35 anos, além de muito investimento financeiro e de tempo, para que as obras chegassem ao topo da galeria, no terceiro andar, onde está localizado o novo teatro de Cuiabá. O projeto nasceu da mente incansavelmente criativa do nordestino que chegou em Cuiabá há 42 anos, mas os arquitetos Osman Pierre Junior e Elvira Xavier desenvolveram a estrutura como ele imaginava.
Quando conseguiu o dinheiro que precisava para comprar “um carrinho velho”, Pádua desistiu do negócio e investiu no terreno que hoje abriga a galeria, mas que na época era apenas um matagal, como lembra o artista plástico.
“São 37 anos desde os alicerces e assim vem de ano em ano”, conta enquanto aponta para as vigas de sustentação do prédio, as mesmas usadas em viadutos, algo feito no início já pensando no momento que a estrutura poderia receber quase 300 convidados no teatro.
Teatro vai funcionar no último andar da Galeria do Pádua, na avenida Miguel Sutil, em Cuiabá. (Foto: Olhar Conceito)
Há algumas décadas, a Galeria do Pádua chegou a ser vista como uma boate por conta de parcerias entre o proprietário e artistas de Cuiabá. Por conta da versatilidade e da carga artística carregada pelo imóvel, o espaço foi um dos “queridinhos” da produção cultural. A banda Vanguart, por exemplo, chegou a se apresentar por lá.
“Fizemos parcerias com o pessoal do do rock, com a comunidade LGBTQIA+ através do Menotti Griggi, tivemos momentos com muitas atividades, as pessoas começaram a gostar e a casa começou a pegar uma conotação de boate. É algo que adoro, mas não está no meu olhar, me divertia horrores com as festas aqui, mas não era a proposta, porque modifica. Às vezes quando é uma boate você pode até colocar objetos de arte, mas o contrário, modifica. As pessoas começam a estigmatizar também”.
Com sete décadas bem vividas, o artista plástico revela que antes disso nunca se enxergou com fragilidade, algo que mudou com a passagem implacável do tempo e fez com que ele começasse a temer não ver o teatro inaugurado em vida. Por conta disso, Pádua decidiu concluir o projeto e fazer o lançamento, mesmo que faltem alguns detalhes, como o elevador para garantir acessibilidade ao prédio que deve chegar nos próximos dias.
“Fiz 70 anos, algo que me trouxe uma carga, um peso maior, no sentido de encarar a minha condição, você tem 70 anos e não é mais um garoto. Toda a vida tive visão baixa, depois da covid-19 abaixou a qualidade auditiva... Comecei a pensar que iria morrer e não veria pronto”.
Questionado sobre a estética do prédio, Pádua conta que o associam ao estilo do famoso arquiteto espanhol, Antoni Gaudí. “Eu fui a Barcelona e acho que tem tudo a ver. Ele desmontou aquela mesmice e começou a botar umas coisas por cima. Tem muito mosaico também. E então eu pensei, sim, parece muito com Gaudí. Já me chamaram de Gaudí do Cerrado, Gaudí Tupiniquim”, se diverte.
“Mas a minha realidade é completamente diferente da dele. É um homem rico, numa cidade rica, próspera, pujante. Já eu, sou um migrante nordestino que saiu de Quixeramobim (CE), carregando um sonho”.
É notório também que a partir da reutilização de materiais para fazer arte, Pádua exalta a importância da sustentabilidade. “Uso ferro, já usei sucata, vidro quebrado, caco de cerâmica, de espelhos... Eu acho lindo de noite, quando refletem as luzes dos farois dos carros”.