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A maternidade e a exclusão das mulheres do mercado de trabalho

Carla Leal e Fernanda Brandão

Com o mês em que se comemora no Brasil o Dia das Mães se encerrando, abordaremos algumas das consequências da maternidade para as mulheres que estão no mercado de trabalho.
 
Contudo, antes disso, nunca é demais lembrar alguns dados, referentes à desigualdade de tratamento dispensado à mulher no mercado de trabalho.
 
Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística de 2023, apesar de nos últimos 30 anos terem ocorrido muitas mudanças na sociedade e no mercado de trabalho brasileiros, as desigualdades de gênero persistem, já que os tímidos avanços que vinham sendo registrados foram perdidos no período da pandemia da COVID-19.
 
Elas, mesmo com nível de escolaridade mais alto que os homens, ganham, em média, apenas 76,5% dos rendimentos destes. Por outro lado, as mulheres trabalham, também em média, três horas a mais do que os homens por semana, quando são levados em conta trabalhos remunerados, tarefas domésticas e cuidados com pessoas. Ou seja, as mulheres trabalham em torno de 54,4 horas semanais contra 51,4 dos homens. Isso muito em decorrência dos afazeres domésticos e encargos familiares que, culturalmente, são responsabilidades das mulheres, o que faz com estas sejam compelidas a buscarem ocupações com jornadas mais flexíveis e, consequentemente, com remunerações menores.
 
Após a maternidade a situação ainda fica mais difícil para a população feminina no mercado de trabalho, segundo pesquisa realizada por Cecília Machado e Valdemar Pinho Neto, da Fundação Getúlio Vargas, que avaliou os efeitos da licença maternidade na trajetória profissional das mulheres.
 
Em regra, dentre as mulheres que têm direito à licença maternidade no Brasil, as que estão formalmente empregadas fazem jus a um período remunerado de 120 dias de afastamento do trabalho em razão do nascimento ou adoção de filhos, podendo chegar até 180 dias se a empresa estiver cadastrada no Programa Empresa Cidadã. Estas mulheres também têm o direito de não serem dispensadas no período compreendido entre a concepção da criança e 5 meses após o parto.
 
Na pesquisa feita, consideraram-se as mulheres trabalhadoras que saíram de licença maternidade entre os 25 e 35 anos de idade, em empresas privadas, no período entre 2009 e 2012. Foram analisados mais de 247 mil casos.
 
Os resultados demonstraram que as chances de emprego para mulheres aumentaram consideravelmente nos 3 anos anteriores à licença maternidade, chegando ao seu ápice à véspera dela. A probabilidade de emprego das mães no mercado de trabalho formal aumenta gradualmente até o momento da licença e decai depois.
 
Durante o período de licença maternidade, o emprego se mantém estável, mas cai acentuadamente principalmente após o período de proteção ao emprego, que é legalmente garantido por 5 meses, como mencionado.
 
Cinco meses após a licença maternidade, os níveis de contratação das mulheres são de praticamente zero e só retomam ao patamar anterior à licença maternidade, quando já decorreu 1 ano. Entretanto, segundo a pesquisa, dois anos depois da licença quase metade das mulheres estavam fora do mercado de trabalho formal, padrão que se perpetua até quatro anos depois, sendo que a maior parte das saídas do mercado de trabalho se dá por dispensa sem justa causa, isto é, por iniciativa do empregador.
 
Também se analisou o efeito da licença maternidade conforme o grau de instrução das mães. As mães que não tinham ensino médio completo parecem mais propensas ao desemprego após a licença maternidade do que as mães com ensino médio e as mães com mais que ensino médio completo. Ou seja, a probabilidade de estar empregada é sistematicamente maior para os grupos de mulheres com maior grau de escolaridade.
 
O estudo concluiu, portanto, que, muito embora a maternidade tenha garantido estabilidade no emprego durante um certo período, isso não tem sido suficiente para a manutenção das mulheres no mercado de trabalho a longo prazo.
 
Assim, vivemos um paradoxo, apesar de a maternidade ser exaltada, cantada em prosa e verso, inclusive até cobrada das mulheres, o mercado de trabalho é bastante cruel com as mães, pois estas são expulsas e mantidas fora dele por muito tempo após os seus filhos nascerem, sem que haja qualquer iniciativa, seja do Poder Público, que poderia agir implementando políticas públicas para apoiá-las, inseri-las e mantê-las no mercado de trabalho, seja do Poder Legislativo, que poderia aprovar leis para barrar esses atos discriminatórios, e ainda da própria sociedade, cujo preconceito é refletido nas políticas de dispensas e contratações das empresas.
 
Carla Leal e Fernanda Brandão são membros do grupo de pesquisa sobre o meio ambiente de trabalho da UFMT, o GPMAT.
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