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Depósitos judiciais não podem ser destinados ao Poder Executivo, defende Janot

03 Mai 2016 - 08:48

Secretaria de Comunicação Social/Procuradoria-Geral da República

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, opinou pela inconstitucionalidade da Lei 15.878/2015, do Ceará, a qual determina que 70% dos recursos de depósitos judiciais dos quais o estado não é parte sejam transferidos para a conta única do Tesouro. O posicionamento refere-se a duas ações diretas de inconstitucionalidade (ADIs 5413 e 5414) que tramitam no Supremo Tribunal Federal (STF). As ações são de autoria da Associação dos Magistrados do Brasil e do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil.

A Lei 15.875/2015 destina 70% dos depósitos judicais para recomposição de fluxos de pagamentos e do equilíbrio atuarial do fundo de previdência cearense, despesas classificadas como investimentos e custeio de saúde pública. Os 30% restantes, não transferidos ao caixa estadual, constituirão fundo de reserva para garantir a restituição ou os pagamentos referentes aos depósitos.

Depósitos judiciais, disciplinados no Código Civil e no Código de Processo civil, são valores confiados pelas partes processuais ao Judiciário, que tem o dever de os administrar, tornando-se depositário da quantia entregue e devendo restituí-la ao final do processo. Para o procurador-geral, é vedado ao Executivo apropriar-se desses valores, sob pena de contrariar o princípio da divisão funcional do poder.

“Destinar recursos de terceiros, depositados em conta à disposição do Judiciário, à revelia deles, para custeio de despesas ordinárias do Executivo e para pagamento de dívidas da Fazenda Pública estadual com outras pessoas, constitui apropriação de patrimônio alheio, com interferência na relação jurídica civil do depósito e no direito de propriedade dos titulares dos valores depositados, sob a forma de empréstimo compulsório velado”, sustenta.

No parecer, Janot argumenta que é da natureza jurídica do depósito possibilitar ao depositante reaver de imediato o valor. “Não cabe à lei estadual instituir mecanismo algum que possa constituir óbice ao direito de levantamento imediato e incondicional do valor depositado”, complementa. O procurador-geral diz que há lesão à segurança sistemática dos depósitos judicais, já que pode ocorrer situação de indisponibilidade, ainda que momentânea.

Segundo o procurador-geral, a lei estabelece a possibilidade de restituição e recomposição de valores do fundo de reserva, mas não garante que a fonte dos recursos será suficiente. Além da indisponibilidade financeira, aponta o parecer, essa restituição pode encontrar óbices na Lei de Responsabilidade Fiscal. “Nessa hipótese, a apropriação dos recursos configuraria, mais do que um empréstimo compulsório, verdadeiro confisco, que – salvo como sanção de ilícitos, em certos casos – é inadmissível em um Estado Democrático de Direito.”

Para o procurador-geral, há também afronta à violação ao direito de propriedade e ao devido processo legal, uma vez que ocorre a apropriação indevida dos depósitos judiciais pelo poder público. “A lei impugnada institui verdadeiro mecanismo de empréstimo compulsório, em detrimento das partes processuais com direito a levantamento de depósito judicial no curso ou ao término do processo”, complementa.

Competência – Janot aponta que a lei cearense é inconstitucional por ferir a competência privativa da União para legislar sobre Direito Civil e Processual, bem como para instituir empréstimo compulsório. Segundo o procurador-geral, a Constituição determina que apenas a União, por meio de lei complementar, pode instituir empréstimos compulsórios e para finalidades específicas.

Para ele, ocorre também invasão à competência do Conselho Monetário Nacional e do Banco Central para disciplinar a atuação de empresas financeiras, uma vez que determina a criação de fundo de reserva destinado a garantir restituição e pagamento de depósitos judiciais e extrajudiciais.

Confira a íntegra do parecer.
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