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Pedido de remissão

Defesa cita sofrimento e pede arquivamento de inquérito contra adolescente que matou amiga no Alphaville

05 Set 2020 - 10:35

Da Redação - Wesley Santiago/Arthur Santos da Silva

Foto: Rogério Florentino/Olhar Direto

Defesa cita sofrimento e pede arquivamento de inquérito contra adolescente que matou amiga no Alphaville
A defesa da família Cestari, patrocinada pelos advogados Artur Barros Freitas Osti e Leonardo do Prado Gama, pediu à Polícia Civil e Ministério Público Estadual o arquivamento do inquérito contra a adolescente de 14 anos, que matou Isabele Guimarães Ramos, de mesma idade, no dia 12 de julho deste ano, no condomínio Alphaville, em Cuiabá. Ela responde por ato infracional análogo a homicídio doloso. O pedido, que utiliza o termo técnico de clemência, é uma espécie de remissão. Para tanto, o empresário Marcelo Cestari, pai da menor, se colocou à disposição para responder por todos os quatro crimes aos quais foi indiciado.

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O pedido da defesa é para que seja  arquivado o inquérito policial em desfavor apenas da adolescente, em razão, segundo os advogados, de falta de base para a denúncia, especialmente pela suposta prática do crime de homicídio culposo, determinando-se, se for o caso, o processamento de eventual denúncia exclusivamente por eventual omissão de cautela.
 
“Embora os peticionantes confiem que, em decorrência do caráter involuntário do disparo, assim como da imprevisibilidade do resultado, a conduta incorrida é manifestamente atípica, o fato é que, por absoluta boa-fé, desde já os mesmos se colocam a disposição do parquet para, que assim também entendendo, celebrem, em relação apenas a menor,  um instrumento de remissão que possibilite o atingimento de um ponto comum entre o interesse público e o direito da mesma em não sofrer mais uma sanção tão grave quanto aquelas que já vem sofrendo dia após dia”, diz trecho do documento.
 
Vale ressaltar que o pedido para o arquivamento tem como peticionante o empresário Marcelo Cestari. Através de seus advogados, ele afirma que se a autoridade policial e o MP entenderem pela remissão, ele se compromete a  comparecer a todos os atos do processo.
 
Os advogados pontuam no pedido que a adolescente, desde o dia dos fatos, vem sofrendo todas as consequências imagináveis – e também as não imagináveis – inclusive represálias no ambiente escolar, ainda que as aulas estejam ocorrendo em formato virtual.
 
“O fardo da menor tem sido pesado demais e um processo tornará o mesmo insustentável!”, dizem os advogados.
 
Por mais de uma vez, a defesa sustenta que o fato trata-se de um trágico acidente e que a adolescente está tendo sua vida exposta indevidamente perante a imprensa, além de ser vulgarizada em programas televisivos e agredida verbalmente até nos ambientes escolares.
 
“O fardo é tamanho que, logo um dia após os fatos, a pessoa mais próxima da vítima, seu irmão encaminhou à menor o seu sentimento de lamento, mas acima de tudo, de compreensão de que os fatos não decorreram de qualquer hipótese de assunção de riscos permitidos ou não permitidos por parte da mesma, concluindo tal qual a presente manifestação, que o resultado jamais poderia ser previsto”, diz outro trecho do documento.
 
Por fim, entendem os advogados que “o fato é que a instrução processual, ao menos no que se refere a menor pode ser evitada mediante a concessão da clemencia, nos moldes do que dispõe o artigo 126 do Estatuto da Criança e do Adolescente”.
 
Em seu artigo 126, o ECA versa que “antes de iniciado o procedimento judicial para apuração de ato infracional, o representante do Ministério Público poderá conceder a remissão, como forma de exclusão do processo, atendendo às circunstâncias e conseqüências do fato, ao contexto social, bem como à personalidade do adolescente e sua maior ou menor participação no ato infracional. Parágrafo único. Iniciado o procedimento, a concessão da remissão pela autoridade judiciária importará na suspensão ou extinção do processo”.
 
Continua no artigo 127 que “a remissão não implica necessariamente o reconhecimento ou comprovação da responsabilidade, nem prevalece para efeito de antecedentes, podendo incluir eventualmente a aplicação de qualquer das medidas previstas em lei, exceto a colocação em regime de semi-liberdade e a internação”.
 
E finaliza no artigo 128 que “a medida aplicada por força da remissão poderá ser revista judicialmente, a qualquer tempo, mediante pedido expresso do adolescente ou de seu representante legal, ou do Ministério Público”.
 
Inquérito concluído
 
A adolescente de 14 anos, responsável pelo disparo que matou Isabele Guimarães Ramos, de mesma idade, no dia 12 de julho, no condomínio Alphaville, em Cuiabá, responderá por ato infracional análogo a homicídio doloso.
 
Concluiu-se na investigação que ela, no mínimo, assumiu o risco ao apontar a arma para o rosto da amiga e não verificar se a arma estava pronta para o disparo.
 
A sua 'pena' (medida sócioeducativa) máxima, conforme o delegado Wagner Bassi, poderá ser uma internação de até três anos, em estabelecimento educacional. Isso pode ocorrer durante o processo ou somente após a conclusão dos trabalhos na Justiça. Em casos envolvendo adolescentes, não há prisão.
 
As investigações mostraram que a versão apresentada pela adolescente de 14 anos não condiz com o que se apurou e com o que consta nos laudos da perícia.
 
Em sua versão, a adolescente conta que estava com o case em suas mãos, quando foi ver o que Isabele estaria fazendo no banheiro do seu quarto. Em dado momento, o objeto teria se desequilibrado e caído.
 
A menor então conta que abaixou para pegar a arma, enquanto equilibrava o case na outra mão. Neste momento, o disparo teria acontecido, de forma - supostamente - acidental.
 
Porém, o laudo aponta que o case não tem nenhum vestígio de sangue, assim como a segunda arma, que estava dentro do objeto. Além disto, perícia feita anterior já apontou que o disparo foi feito com a arma estando entre 30 e 40 centímetros do rosto da vítima.
 
Teoricamente, de acordo com os respingos de sangue, a perícia conclui que deveria haver vestígios dos flúidos no case ou na segunda arma, o que não aconteceu.

Dinâmica

O inquérito mostra que o namorado da adolescente que atirou vai de Uber até a casa dos Cestari e deixa a arma sem munição. A pistola passa pela mão de várias pessoas, que inclusive apertaram o gatilho. A vítima então chega às 16h41 no local. No total, eram nove pessoas na residência, entre familiares e visitantes. 

Entre 21h e 21h30, o namorado da adolescente que atirou resolveu ir embora da casa. Ele então insere o carregador na arma. “Pegou o carregador que estava na mochila e inseriu na pistola, sem que isto fosse visto pela responsável pelo disparo”, comenta o delegado Wagner Bassi.

As duas armas então são guardadas e fechadas dentro do case, que não tem cadeado, mas sim apenas uma trava. 

Às 21h59, o namorado da atiradora deixa o condomínio de luxo. A adolescente então pega o case com as duas armas, em cima do sofá da sala e sobe a escada. A única que estava municiada (o que é diferente de carregada, quando está pronta para o disparo) era a que disparou.

O tempo de subida da escada é de 36 segundos, segundo a reconstituição. "Ela [adolescente] disse - em depoimento - que foi ao quarto do pai, o que não aconteceu. Ela vai direto até o quarto dela, pega o case e o abre", explica o delegado. Depois, pega a arma, e vai para o banheiro, no quarto dela, onde estava Isabele, fumando cigarro eletrônico.

As duas então ficam no banheiro durante 1 minuto e 18 segundos (78 segundos). Neste intervalo de tempo, acontece um disparo, como já revelado anteriormente, a curta distância. Neste meio tempo, desde que saiu do case, até que houvesse o disparo, a arma é carregada (há o movimento para que seja inserida a munição na câmara da pistola e a deixasse pronta para o tiro).

Às 22h01, a porta se abre e as câmeras, que funcionam por movimento, ligam. Sendo assim, é iniciada uma gritaria dentro da casa, o que mostra que o crime já ocorreu.

A investigação apenas constatou que a versão apresentada pela adolescente não é compatível com as provas e concluiu por ato infracional análogo a homicídio doloso, já que a adolescente, no mínimo, assumiu o risco ao não verificar se a pistola estava carregada e apontar para o rosto de Isabele.

Vale lembrar que a adolescente disse que o disparo ocorreu de forma acidental, após o case com as armas cair de sua mão e a pistola disparar enquanto ela a pegava. Porém, o exame de luminol feito nos objetos não mostra sangue na maleta onde estavam os armamentos.

Somente havia sangue nas roupas da adolescente que atirou e na arma do crime. Isabele, provavelmente, não sentiu nada e morreu na hora. Isso porque a região atingida faz com que o corpo praticamente 'desligue' e que a vítima caia já sem vida.

A perícia aponta que a adolescente de 14 anos, que realizou o disparo, posicionou-se na frente da vítima, elevou a arma a uma altura de 1,4 metro do chão, com alinhamento horizontal e a uma distância entre 20 e 30 centímetros do rosto de Isabele.

O pai da atiradora, o empresário Marcelo Cestari, foi indiciado por quatro crimes, entre eles homicídio culposo, pois deixou a filhar pegar a arma que resultou na morte da amiga.
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