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Sábado, 20 de abril de 2024

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Decisão

Imóvel vendido por prefeito está subfaturado em 1.700%

Foto: Reprodução

Imóvel vendido por prefeito está subfaturado em 1.700%
O imóvel de 256,31 mil metros quadrados colocado à venda pela Prefeitura de Sinop, via concorrência pública, por R$ 9,8 milhões está subavaliado em 1.700%, segundo avaliação do juiz Túlio Dualibi Alves Souza, da Sexta Vara daquela comarca, que suspendeu liminarmente a transação imobiliária.

Veja a decisão aqui.

Consta de trecho das razões apresentadas por Túlio Souza que, em uma média, o valor do metro quadrado para pagamento à vista naquele município é de R$ 665,41em um loteamento promovido pela Colonizadora Sinop S/A ao lado do imóvel que a municipalidade pretendia e pretende vender por meros R$ 38,50,

"Neste ponto...., nem se pode argumentar que no preço dos terrenos pertencentes ao mencionado loteamento está incluído gastos com obras de infraestrutura, publicidade, corretagem de venda etc; em detrimento da venda do imóvel da matrícula R-6/A, cuja venda será feita sem qualquer uma das situações narradas", consta de trecho do arrazoado do juiz.

Por fim, o magistrado confirma a tese que a diferença de valor de metro quadrado chega a ser pouco mais de 17 vezes, e é bem possível que os gastos acima descritos não permitem em chegar à tamanha diferença. Em suma: o prejuízo da municipalidade seria imenso de difícil recuperação.

Segue abaixo a íntegra das razões do juiz Túlio Dualibi de Souza na ação popular ajuizada pelo cidadão Valdir Aparecido Sartorelo, assinada pelo advogado Orlandir Da Rold:

Trata-se de Ação Popular promovida por VALDIR APARECIDO SARTORELO em face do MUNICÍPIO DE SINOP E OUTROS, todos qualificados, objetivando, em síntese, a nulidade do Edital de Concorrência Pública nº 001/2012.

Relata que, no dia 20/06/2012 foi publicado pela Prefeitura Municipal de Sinop o Aviso de Licitação – Edital de Concorrência Pública nº 001/2012, objetivando a venda por melhor oferta, no estado físico e de ocupação em que se encontra, o imóvel denominado R-06/A, com área de 256.316,18 m² (duzentos e cinqüenta e seis mil, trezentos e dezesseis metros e dezoito centímetros quadrados).

Informa que, a abertura dos envelopes se dará na data de 23/07/2012, às 16h00min.

Descreve acerca do histórico o imóvel objeto do Edital 001/2012, relatando que no ano de 1974, ano de fundação da cidade de Sinop, a área denominada R-6 constava como área reservada para implantação do Cemitério Municipal de Sinop.

Que, por meio do Decreto nº 57, da Prefeitura Municipal de Chapada dos Guimarães, a área R-6 permaneceu intocável em razão da retificação do projeto da Cidade de Sinop.

Relata ainda, que em data de 24/10/2008, a área R-6 foi escriturada pelo Município de Sinop e registrada em data de 30/01/2009 perante o Cartório de Registro de Imóveis do 1º Ofício de Sinop, sob a Matrícula R-01-29.762.

Na data de 07/05/2012, o Poder Executivo enviou o Projeto de Lei nº 068/2012 à Câmara Municipal de Sinop, com objetivo de autorizar o Município de Sinop a receber em doação, desmembrar, desafetar e alienar o referido imóvel (R-6).

Colocado em votação extra pauta o Projeto de Lei nº 068/2012 na Casa Legislativa, ficou consignado em sessão plenária por meio de emenda verbal, que os recursos auferidos seriam alienados em investimentos de iluminação pública e pavimentação asfáltica, do qual, mediante votação em única sessão, foi transformado em lei, a saber, Lei Municipal nº 1.687/2012 de 08 de maio de 2012.

Que no dia 04/06/2012, a Prefeitura Municipal de Sinop e a empresa Colonizadora Sinop S/A, com base na Lei Municipal nº 1.687/2012, lavraram Escritura Pública de Rescisão.

Que no dia 05/06/2012, foram lavradas duas (02) escrituras com áreas desmembradas, onde ficou assentado que a área R-6/A seria de 256.316,18 m² (duzentos e cinqüenta e seis mil, trezentos e dezesseis metros e dezoito centímetros quadrados), e a área R-6 passaria a ficar com área remanescente de 134.004,46 m² (cento e trinta e quatro mil, quatro metros e quarenta e seis centímetros quadrados), conforme escrituras do Livro nº 046-A, folhas nº 090/091; e Livro nº 046-A, folhas 093/094, respectivamente, ambas do Cartório de 2º Ofício Extrajudicial de Sinop.

Enfatiza que o Edital de Concorrência Pública nº 001/2012 contém irregularidades, já que o valor da venda da área R-6/A está subestimado pelo preço de R$ 9.870.000,00 (nove milhões, oitocentos e setenta mil reais), bem como sustenta que a Lei 1.687/2012 padece de inconstitucionalidade por ferir o princípio da igualdade, impessoalidade e moralidade, constantes do art. 37 da CF/88 e art. 44 da Lei Complementar nº 101/2000 – Lei de Responsabilidade Fiscal.

Destaca o fato de que o leilão do imóvel está sendo realizado em período eleitoral, dando margem a benefício pelo atual gestor, bem como há desvio de finalidade com objetivo de privilegiar interesses de alguns em detrimento da coletividade.

Requer liminarmente, a declaração de nulidade do Edital de Concorrência Pública nº 001/2012, bem como de todos os atos dele advindos.

Espontaneamente o Município de Sinop comparece aos autos, conforme petitório de fls. 56/64, apresentando manifestação em relação ao pedido de liminar pleiteado pela parte autora, sustentando que, após rescisão da escritura pública de doação, conforme já relatado, o imóvel R-06 foi desafetado, que passou a ser denominado R-06/A, e que os valores aferidos com a alienação da área devem ser destinados à implantação de iluminação pública, pavimentação asfáltica, e demais obras de infra-estrutura urbana.

Esclarece que, em razão destes fatos, houve a rescisão da doação anterior, a qual possuía cláusula de reversão, sendo lavradas duas novas escrituras de doação (R-06 e R-06/A), desta feita, sem cláusula de reversão, mediante documentação entregue ao registro de imóveis no Cartório do 1º Ofício Extrajudicial de Sinop.

Por isso, expediu-se Edital de Concorrência Pública nº 001/2012, visando a alienação do imóvel denominado R-06/A que foi desmembrado e desafetado do imóvel denominado de R-06, que havia sido constituído como área institucional quando do Loteamento Cidade Sinop, com destinação específica para localização do cemitério.

Ressalta que o referido imóvel não se considera inalienável face à edição da Lei Municipal nº 1687/2012, pela qual foi desafetado e, como tal, pode sofrer alienação, razões estas em que pede pela improcedência do pedido de liminar.

Com a manifestação, vieram os documentos de fls. 65/150.

É o que merece relato.

Passo a análise da liminar pleiteada.

São pressupostos da ação popular: (a) que o autor seja cidadão brasileiro, eleitor; (b) ilegalidade ou ilegitimidade do ato a invalidar; (c) lesividade do ato ao patrimônio público, compreendendo-se também como lesivo o ato que ofende bens ou valores artísticos, cívicos, culturais, ambientais ou históricos da comunidade, assim como a moralidade administrativa.

A Ação Popular segue o rito ordinário, conforme preconiza o art. 7º, caput, da Lei 4.717/65.

Conforme relatado, trata-se de Ação Popular com pedido de liminar promovida por VALDIR APARECIDO SARTORELO em face do MUNICÍPIO DE SINOP E OUTROS, objetivando a declaração de nulidade do Edital de Concorrência Pública nº 001/2012, em razão da alienação do imóvel denominado R-6/A da Escritura Pública de Doação constante do Livro 046-A, folhas nº 090/091 do Cartório do 2º Ofício Extrajudicial da Comarca de Sinop.

A liminar requerida pela parte autora, consiste na declaração de nulidade do Edital de Concorrência Pública nº 001/2012. Diante disso, verifico que pedido initio litis formulado pretende ver satisfeita a própria tutela que busca com a ação em questão, todavia, instar ressaltar que o pedido liminar não deve se referir à própria tutela que se reclama, mas aos efeitos que esta tende a produzir no plano material e que não possam aguardar o momento oportuno para que tal ocorra, sob pena de não mais terem utilidade para o titular do direito; sendo certo que a antecipação não diz respeito a eficácia preponderante da sentença, posto que esta implica juízo declarativo de certeza e não de probabilidade.

FREDIE DIDIER JR., in Curso de Processo Civil, Vol. 2, 2007, ensina que: “A tutela antecipada é a decisão provisória (urgente, sumária, temporária e precária) que satisfaz, total ou parcialmente, imediatamente o direito material deduzido. É a antecipação da eficácia da decisão final; é a concessão imediata de efeitos da tutela jurisdicional final”.

JOSÉ ROBERTO DOS SANTOS BEDAQUE, in Código de Processo Civil Interpretado, Coordenado por Antonio Carlos Marcato, 3ª ed., Ed. Atlas S.A., 2008, expõe que: “A antecipação definitiva e irreversível não está autorizada pelo art. 273, que prevê modalidade de tutela eminentemente provisória, passível de revogação a qualquer tempo. (...) É espécie de tutela de urgência, caracterizada pela provisoriedade e pela instrumentalidade. Não é apta a ditar solução definitiva para o litígio e está voltada a assegurar do provimento final, mediante antecipação de seus efeitos”.

E continua: “A antecipação não é da própria tutela declaratória, condenatória ou constitutiva, mas aos efeitos que qualquer delas tende a produzir no plano material e que não possam aguardar o momento oportuno para que tal ocorra, sob pena de não mais terem utilidade para o titular do direito. Não se declara existente o direito, não se constitui a nova situação da vida, nem se condena o réu. Apenas permite-se que o requerente passe a usufruir de efeitos relacionados ao suposto direito por ele afirmado antes mesmo de seu reconhecimento. Não se antecipa o julgamento de mérito, ou seja, aquele que, no sistema do Código é apto a eliminar a situação de tensão ou de crise verificada no plano substancial. A antecipação autorizada pelo art. 273 limita-se a efeitos práticos dessa possível solução do litígio, sem todavia, eliminar a incerteza representada pelo conflito de pretensões. Por isso, não se antecipa a declaração, a condenação, nem a constituição. (...) São antecipados os efeitos práticos, não o efeito jurídico, este destinado a atuar a regra material e restabelecer o ordenamento jurídico violado, eliminando o litígio e proporcionando a paz social”. (José Roberto dos Santos Bedaque, in Código de Processo Civil Interpretado, Coordenado por Antonio Carlos Marcato, 3ª ed., Ed. Atlas S.A., 2008, pág. 837/838).

Outro não é o entendimento do professor LUIZ GUILHERME MARINONI, ao escrever sobre o tema “A tutela antecipada nas ações declaratória e constitutiva”, em artigo publicado através do site ‘www.cjf.jus.br/revista/numero3/artigo17.htm’, verbis:

“(...) b) É impossível a antecipação da eficácia declaratória, ou mesmo conferir antecipadamente ao autor o bem da "certeza jurídica", somente capaz de ser a ele atribuído pela sentença declaratória. A cognição inerente ao juízo antecipatório é por sua natureza completamente inidônea para atribuir ao autor a "declaração" — ou a "certeza jurídica" por ele objetivada. Porém, como já foi lembrado, Tommaseo entende que uma declaração sumária (e não a eficácia declaratória, que exige cognição exauriente) pode ser útil ao autor que necessita praticar urgentemente um ato e teme que a sua atuação possa ser considerada ilegítima. Contudo, não conseguimos ver utilidade alguma no exemplo fornecido pelo ilustre processualista italiano, que permitiria ao juiz "declarar sumariamente" a legitimidade da despedida de um empregado. A declaração sumária da legitimidade de um ato parece valer muito pouco, ou talvez nada, quando se percebe que o juiz pode julgar improcedente o pedido declaratório ainda que já tenha, no juízo antecipatório, "declarado sumariamente" algo no sentido inverso. Se o juiz julga improcedente o pedido declaratório, fica definida a ilegitimidade do ato que na "decisão sumária" foi suposto legítimo, devendo o autor responder como se a declaração sumária não houvesse sido pronunciada. Se é assim, e se o autor não precisa de autorização judicial para, por exemplo, despedir um empregado, não há como se vislumbrar alguma utilidade na "declaração sumária".”

Por fim, calha transcrever outro escólio doutrinário:

“(...) A problemática da antecipação de tutela no que se refere às ações declaratórias e constitutivas é identificada como uma da mais graves oriundas das reformas processuais encetadas no processo civil brasileiro. A polêmica surge pelo fato da premissa que de “a antecipação de efeitos da tutela somente contribuirá para a efetividade do processo quando, pela sua natureza, se tratar de efeitos (a) que provoquem mudanças ou (b) que impeçam mudanças mo plano da realidade fática, ou seja, quando a tutela comportar, de alguma forma, execução.” A propósito, Ovídio Baptista da Silva, após asseverar que os efeitos antecipados devem ser executivos ou mandamentais, explica o porquê desta conclusão, afirmando que: “A explicação é simples. Os outros possíveis efeitos da sentença, sejam eles declaratórios, constitutivos ou condenatórios, são, enquanto tais, incompatíveis com a idéia de antecipação provisórias”. Segundo o processualista gaúcho, a antecipação seria, nestes casos, inócua sob o ponto de vista processual. Quanto às ações declaratórias, especificamente, lembra João Batista Lopes que “é princípio lógico que uma coisa não pode ser e deixar de ser ao mesmo tempo”, de modo que “a eficácia declaratória (juízo de segurança) ou certeza (na linha da doutrina majoritária) é contemporânea ao trânsito em julgado, não podendo, pois, ser antecipada. A declaração, para conferir segurança ou certeza, não pode ser provisória, revogável ao longo do procedimento.” Mas é preciso que façamos uma indispensável distinção entre ações declaratórias e constitutivas e eficácias constitutiva e declaratória. De fato, a incompatibilidade ontológica é entre as eficácias declaratória e constitutiva e não entre as ações declaratórias e constitutivas. A partir do ponto em que estabelecemos esta dicotomia, verificamos que eficácias executivas e mandamentais eventualmente presentes nas ações declaratórias e constitutivas podem ser antecipadas, pois tais ações assim se caracterizam porque a sentença que lhes acolher terá eficácia preponderante declaratória ou constitutiva, o que não inviabiliza que outras eficácias (antecipáveis) estejam presentes. Desta forma, não há impossibilidade de antecipação nas ações declaratórias e constitutivas, desde que a eficácia correspondente à antecipação não seja declaratória ou constitutiva. Tem-se, então, que no caso de uma ação declaratória, “não pode o juiz declarar existente provisoriamente uma relação jurídica, conquanto lhe seja lícito antecipar, em favor do autor, alguns efeitos práticos decorrentes do pedido de declaração.” Athos Gusmão Carneiro, após mencionar exaustivamente as posições doutrinárias acerca da matéria, assevera, quanto às ações declaratórias, que “não pode ser adiantado o elemento nuclear da tutela, ou seja, a certeza jurídica, que não se compadece com a ‘provisoriedade’ da AT; todavia, são eminentemente passíveis de adiantamento os efeitos que decorrerão do ‘preceito’ contido na (provável) futura sentença de procedência. Assim, o autor postula ação de declaração da nulidade do ato que o excluiu de uma sociedade recreativa, e pode obter em AT a permissão para continuar freqüentando provisoriamente as dependências sociais, com as prerrogativas que normalmente cabem aos associados.” Diverso não é o escólio de Nelson Nery Júnior, que após grafar que “em toda a ação de conhecimento, em tese, é admissível a antecipação de tutela, seja ação declaratória, constitutiva (positiva ou negativa), condenatória, mandamental etc..”, afirma: Definida acima a tutela antecipatória como medida executiva em sentido lato, poder-se-ia pensar, à primeira vista, ser ela incabível nas ações declaratórias. Entretanto, tendo em vista que o adiantamento nem sempre respeita ao mérito considerado em seu sentido estrito, pode ser que os efeitos de uma sentença declaratória comporte execução, tendo cabimento o adiantamento desses efeitos. É o caso da ação declaratória de inexistência de relação jurídica, tendo como causa de pedir o pagamento de dívida. O autor pode pedir, a título de antecipação de tutela, a sustação liminar do protesto da cambial já paga. O bem da vida por ele pretendida é a declaração judicial de inexistência da relação jurídica (sentença declaratória), mas o efeito pretendido é o de obstaculizar o protesto e a cobrança do título já pago (execução lato sensu).” Teori Albino Zavascki, escudando-se na doutrina de Pontes de Miranda, assevera: Realmente, a carga de declaração – que consta de todas as sentenças e que é preponderante nas ações declaratórias e bem significativa nas ações constitutivas – tem eficácia de preceito. Daí dizer-se que a ação declaratória é uma ação de preceito, e que a sentença nela proferida é uma sentença com efeito de preceito. Preceito é norma, é prescrição, é regra de conduta, obrigatória a seus destinatários. Como tal tema eficácia (positiva) de estabelecer certeza sobre o conteúdo da relação jurídica litigiosa, do que decorrem conseqüências práticas, refletidas no plano do comportamento das partes a quem foi dada. Uma destas conseqüências é a de impedir, de proibir, de vedar, futuros atos ou comportamentos do réu contrários ou incompatíveis com o conteúdo do preceito emitido. É uma espécie de eficácia negativa, de cunho marcadamente inibitório (...) Ora, esta eficácia negativa é, certamente, passível de antecipação, o que se dá, necessariamente, mediante ordens de não fazer contra o preceito, ou seja, ordens de abstenção, de sustação, de suspensão, de atos ou comportamentos. Isto explica o que para muitos é um contra-senso: a concessão de medias ‘cautelares’ em ações declaratórias, e explica também certas medidas ‘cautelares’ em ações constitutivas. Na verdade, tais medias não têm natureza cautelar, mas sim antecipatória. Raciocínio idêntico vale para as ações constitutivas, onde “o elemento nuclear do pedido poderá ser adiantado se compatível com a provisoriedade ínsita ao AT; assim, não cabe adiantar a alteração de estado civil ou a anulação de um contrato, mas não repugna ao sistema a constituição provisória de uma servidão de trânsito.” (Artigo “A antecipação de Tutela e as eficácias da sentença”, escrito por Marcelo Colombelli Mezzomo e publicado por meio do site ‘www.ufsm.br/direito/artigos/processual-civil/anttutela-mezzomo.htm)


Portanto, não pode a requerente obter a satisfação do provimento final pretendido por meio do instituto da antecipação dos efeitos da tutela, eis que a finalidade do instituto é assegurar a ocorrência dos escopos do processo, incidindo sobre efeitos e não sobre o provimento em si mesmo considerado.

No entanto, diante da relevância e atenção que o caso requer, necessária a aplicação de medida cautelar baseada no poder geral de cautela do magistrado, a fim de resguardar a efetividade e a utilidade prática do direito que se busca, conforme disposto no art. 5º, § 4º, da Lei 4.717/65.

Prescreve o art. 273, § 2º, do CPC que: “O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e: § 2º Não se concederá a antecipação da tutela quando houver perigo de irreversibilidade do provimento antecipado”.

Por outro lado, estatui o parágrafo sétimo do supracitado dispositivo legal que “se o autor, a título de antecipação de tutela, requerer providência de natureza cautelar, poderá o juiz, quando, quando presentes os respectivos pressupostos, deferir a medida cautelar em caráter incidental do processo ajuizado”.

Logo, a antecipação dos efeitos da tutela pretendida será analisada como providência de caráter cautelar, nos termos do art. 273, § 7º, do CPC.

Para a concessão de qualquer medida cautelar mister se faz a demonstração de dois requisitos essenciais, quais sejam, o fumus boni iuris e o periculum in mora, o primeiro representativo da plausibilidade do direito alegado pela parte demandante, e o segundo pelo receio objetivo de que a demora na prestação da tutela jurisdicional possa acarretar dano irreparável e/ou de difícil reparação.

Neste primeiro juízo de cognição sumária o fumus boni iures é evidente, pois, considerando o preço do m² (metro quadrado) dos imóveis constantes dos orçamentos de fls. 23/26 emitidos pela Colonizadora Sinop S/A, e o imóvel constante da área R-6/A, há indícios de que o imóvel público padece de ampla desvalorização; e, desta forma, demonstrando haver indícios veementes de subfaturamento do patrimônio público, deve ser concedida a liminar para determinar a suspensão de todos os atos do Edital de Concorrência Pública nº 001/2012.

Em sua manifestação, o município de Sinop apresentou documentos de fls. 73/78, retratando os pareceres e amostras dos quais demonstram a forma de avaliação realizada para se chegar ao valor mínimo estabelecido pelo Edital de Concorrência Pública, perfazendo a quantia de R$ 9.870.000,00 (nove milhões oitocentos e setenta mil reais).

Considerando a avaliação realizada pela administração pública, verifico que o mesmo foi considerado como chácara, conforme “Descrição suscinta do Imóvel”, onde ficou consignado que o objetivo era a”analisar valor mínimo para alienação”.

Neste ponto, verifica-se que há indícios de subfaturamento do patrimônio público para proceder-se a alienação, pois, a área foi avaliada tendo como objetivo análise de preço mínimo, e não o valor de mercado aproximado do real, para que, então, pudesse fazer um comparativo de valores e, daí, chegar ao valor justo à alienação do imóvel. Destaco, ainda, que a parte requerida não trouxe aos autos qualquer avaliação imobiliária como fonte originária das avaliações constantes da planilha de cálculo de valores imobiliários (fl. 74). No entanto, considerar os valores de avaliação de forma tão genérica e sem qualquer respaldo técnico capazes de justificar o preço mínimo estabelecido pelo edital, fica comprometida a forma de avaliação do imóvel, pelo menos, à luz da documentação trazida aos autos nesta fase preliminar.

Ademais, não se pode desconsiderar os valores do m² dos imóveis constantes dos orçamentos de fls. 23/26 (orçamentos de venda emitidos pela Colonizadora Sinop S/A), os quais possuem valores muito superiores ao m² avaliado pela administração pública no citado edital de concorrência, pois, ressalto que tais imóveis fazem parte de loteamento ao lado do imóvel que a municipalidade pretende alienar.

A conta é simples e viável como análise de comparação.

O imóvel especificado em orçamento de venda de fl. 23, se pago à vista representa um valor de R$ 735,29 o metro quadrado e a prazo o valor de R$ 868,37. O da fl. 24, para pagamento à vista representa o valor de R$ 772,05 o metro quadrado e a prazo o valor de R$ 911,80. O da fl. 25, à vista o valor do metro quadrado apresenta R$ 621,00 e a prazo R$ 734,42. Por fim, o de fl. 26 retrata o valor de R$ 533,33 para pagamento à vista e o valor de R$ 629,82 para pagamento a prazo.

Em uma média, o valor do metro quadrado para pagamento à vista é de R$ 665,41; repito, em um loteamento promovido pela Colonizadora Sinop S/A ao lado do imóvel que a municipalidade pretende alienar.

Já o imóvel que a municipalidade quer alienar em concorrência pública, dividindo o valor o valor mínimo de R$ 9.870.000,00 pela metragem de 256.326,18 metros quadrado, tem-se o valor de R$ 38,50 o metro quadrado.

Neste ponto, para rechaçar o argumento acima, nem se pode argumentar que no preço dos terrenos pertencentes ao mencionado loteamento está incluído gastos com obras de infraestrutura, publicidade, corretagem de venda, etc; em detrimento da venda do imóvel da matrícula R-6/A, cuja venda será feita sem qualquer uma das situações narradas.

Isto porque a diferença de valor de m2 (metro quadrado) chega a ser pouco mais de 17 vezes, e é bem possível que os gastos acima descritos não permitem em chegar à tamanha diferença.

Apesar de ser ato discricionário da administração pública, esta grande diferença há de ser levada em consideração por este juízo neste momento processual para verificação a posterior se o patrimônio público estará de fato preservado com alienação na forma que a municipalidade pretende realizar.

De outro lado, a alienação de imóvel de tamanha magnitude em final de mandato não se revela proporcional (chega até mesmo ser temerária) porque a venda da área como está restringe a possibilidade de compra a poucas, se não raras, pessoas, dado o valor previsto no edital, ao passo que, eventual parcelamento, em forma de loteamento, pelo próprio município terá um alcance social muito amplo ao oportunizar a um universo maior de pessoas a possibilidade de compra de lotes para edificação de moradias, além da gestão municipal promover obras de infra-estrutura com geração de emprego e renda; e, com bastante probabilidade, nesta situação o produto com a venda de lotes será maior do que venda única, e, assim sendo, resultarão preservados com muita maior força os interesses e defesa do patrimônio público.

De outro lado, o periculum in mora é latente, pois, havendo possibilidade a qualquer momento de alienação do imóvel no preço mínimo exigido pelo Edital 001/2012, qual seja R$ 9.870.000,00 (nove milhões oitocentos e setenta mil reais), necessário que se suspenda todos os seus atos, até que fique demonstrado nos autos que não há desvalorização do patrimônio público em favorecimento de eventuais interesses privados, bem como seja verificado inequivocadamente que os valores obtidos com a alienação do imóvel serão de fato empregados em outras áreas de interesse público, já que, neste último caso, deve-se verificar se há necessidade de aplicação da quantia em obras como, iluminação pública e pavimentação asfáltica, conforme disposto na Lei Municipal nº 1.687/2012.

Neste diapasão, é preciso ressaltar que o parágrafo quinto da Lei Municipal nº. 1.687/2012 prevê que “os valores aferidos com a alienação da área denominada R06/A serão destinados, exclusivamente, na implantação de iluminação pública, pavimentação asfáltica e demais obras de infra-estrutura urbana”.

Apesar de voluntariamente comparecer ao processo através da petição de fls. 56/64, o Município de Sinop deixou de apresentar qualquer razão que fosse suficiente para afastar, neste começo de processo, a diferença de valor do metro quadrado como verificado nesta decisão; como também deixou de apresentar, especificar ou mesmo de trazer qualquer detalhamento por meio de documentos, quanto ao modo de aplicação do dinheiro, na forma do disposto no parágrafo único do art. 5º da Lei Municipal 1.687/12, os quais seriam capazes de comprovar, pelo menos neste momento, a necessidade real de emprego dos valores obtidos com a alienação do imóvel tão somente em pavimentação asfáltica e iluminação pública, pois, considerar demais obras de infra-estrutura, é deixar, pelo menos em tese, vaga a especificação de aplicação do recurso em demais áreas.

Como se trata de uma receita vinculada a certas despesas, deveria acostar ao processo, de forma detalhada e específica, de como será aplicado o dinheiro apurado com a venda do imóvel R06/A, pois não há como proceder à venda de dito imóvel sem, ao menos, sinalizar de forma concreta e objetiva futura aplicação.

Aliás, tal fato reforça a inexistência do periculum in mora reverso, de maneira que é necessário enfatizar ainda, que a suspensão de todos os atos decorrentes do Edital de Concorrência Pública nº 001/2012, não ensejará qualquer prejuízo, posto que não há periculum in mora reverso que importe em prejuízo às partes, bem como ao interesse público, até julgamento final da demanda, até porque o município de Sinop também em sua manifestação não apresenta qualquer justificativa no sentido de que precisa proceder com a alienação neste momento.

Considerando o conjunto de situações e fatos que devem ser analisados antes da possível alienação do imóvel constante da área R-6/A, a tutela cautelar se mostra eficaz e aplicável ao presente caso, a fim de que possa resguardar o patrimônio público, pelo qual deve ser protegido de forma incansável.

Diante do exposto, DEFIRO a liminar para DETERMINAR a suspensão de todos os atos advindos do Edital de Concorrência Pública nº 001/2012, até julgamento final da presente ação, e caso tenha sido finalizado o processo licitatório, que se suspenda qualquer ato de transferência de propriedade relativo ao imóvel descrito no R-06/A, que tenha por origem o mencionado edital de concorrência.

CITE-SE as partes requeridas, através de Oficial de Justiça, para, querendo, contestar a ação no prazo de 20 (vinte) dias (art. 7º, IV da Lei 4.717/65, legal, devendo constar no mandado as advertências constantes no art. 285 do CPC.

Após, OFICIE-SE ao Cartório do 1º Ofício desta Comarca de Sinop para que proceda na forma do art. 167, inc. I, número 21, da Lei nº. 6.015/73 (Lei de Registro Público).

Com as respostas, INTIME-SE a parte autora para manifestação.

Depois, INTIME-SE o representante do Ministério Público para igual finalidade.

Após, concluso para análise de procedimento.

Eventuais custas serão suportadas ao final do processo, nos termos do art. 10 da Lei 4.717/65.

PROCEDA-SE com o apensamento da presente ação aos autos sob nº 7240-95.2012.811.0015 – Código 172310.

Expeça-se o necessário.

Às providências.

Cite-se. Intime-se e cumpra-se.


ADVOGADO(S) DA PARTE REQUERENTE: Dr.(s) ORLANDIR DA ROLD

PARTE REQUERIDA: MUNICÍPIO DE SINOP - MT., CNPJ: 15.024.003/0001-32, Av. das Embaúbas, 1386 (Prefeitura Municipal), Bairro: Centro, Cidade: Sinop-MT e JUAREZ ALVES DA COSTA, Cpf: 478.430.809-10, Rg: 2.289.021-2 SSP PR, radialista, Av. das Embaubas, 1386, Bairro: Centro, Cidade: Sinop-MT e ADRIANO DOS SANTOS - Secretário da Comissão Permanente Licitação da Prefeitura Municipal de Sinop, Cpf: 478.430.809-10, Rg: 2289021-2, brasileiro(a), Av. das Embaúbas, 1386, Bairro: Centro, Cidade: Sinop-MT.

FINALIDADE: EFETUAR A INTIMAÇÃO e CITAÇÃO DOS REQUERIDOS para o cumprimento da MEDIDA LIMINAR, transcrita parcialmente abaixo, bem como do inteiro teor da decisão, da petição inicial e eventuais documentos, cuja(s) cópia(s) segue(m) anexa(s), como parte(s) integrante(s) deste mandado e, para responder, querendo, a ação, no prazo de 20 (vinte) dias (art. 7º, IV, da Lei 4.717/65). Não sendo contestada a ação, presumir-se-ão aceitos pela parte requerida como verdadeiros os fatos alegados na peça vestibular (art. 285 do CPC).

DECISÃO LIMINAR (fls. 151/166): “(...) DEFIRO a liminar, para DETERMINAR a suspensão de todos os atos advindos do Edital de Concorrência Pública nº 001/2012, até julgamento final da presente ação, caso tenha sido finalizado o processo licitatório, que suspenda qualquer ato de transferência de propriedade relativo ao imóvel descrito no R-06/A, que tenha por origem o mencionado edital de concorrência (...)”.

Sinop-MT. 26.07.2012.
Dr. Túlio Dualibi Alves Souza-Juiz de Direito.
SEDE DO JUÍZO E INFORMAÇÕES: Praça dos Três Poderes, 175 - Bairro: Centro -Cidade: Sinop-MT Cep:78550000 - Fone: (66) 3531-2860.
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