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Notícias / Política de Classe

Advogado rebate Medeiros e diz que outras categorias também deveriam exigir exame como o da OAB

Da Redação - Vinicius Mendes

O deputado federal por Mato Grosso, José Medeiros (Pode), trouxe novamente à pauta o projeto de lei, de autoria do presidente Jair Bolsonaro (PSL) quando deputado, que prevê o fim da exigência do Exame da Ordem para atuar como advogado.

Ao defender a matéria afirmou que bacharéis no curso de Direito, que não obtêm o registro, estão se tornando “boys de luxo em escritórios de advocacia” e disse, ainda, que “a personalidade jurídica da OAB é uma gambiarra”.

O advogado Fábio Arthur da Rocha Capilé, Presidente do Instituto dos Advogados Mato-grossenses, no entanto, defendeu o exame, dizendo que sua função é garantir a boa qualificação dos profissionais. Ele também disse que esta prática deveria ser seguida por outras categorias profissionais.
 
Leia mais:
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A proposta original, apresentada por Bolsonaro em 2007 e arquivada devido ao fim da Legislatura, argumentava que a imposição do Exame fere princípios constitucionais, uma vez que somente estabelecimentos de ensino superior, devidamente reconhecidos pelo Ministério da Educação, podem qualificar seus alunos.
 
Medeiros, que trouxe de volta o projeto, também alegou que a qualificação dos profissionais, independente da carreira que ocupe, cabe aos estabelecimentos de ensino, o que “como consequência, exclui tal atribuição da Ordem dos Advogados do Brasil”.
 
O projeto tem sido alvo de críticas por diversos representantes da sociedade, advogados ou não. Ao Olhar Jurídico o advogado Fábio Capilé contestou os argumentos de Medeiros e defendeu o exame, afirmando que ele é ferramenta importante para a garantia da boa qualificação dos profissionais e até mesmo pela melhoria do ensino do Direito.
 
Fábio Arthur da Rocha Capilé, é advogado, presidente do Instituto dos Advogados Mato-grossenses, membro da Academia de Direito do Ceará, especialista em Direto Público, membro efetivo do IAB, Professor Homenageado 2008-2016, palestrante, agente cultural titular da medalha mestre Inácio de valorização da cultura cuiabana, articulista, co-autor da obra literária jurídica: “Novo Código de Ética da Advocacia, a visão dos Institutos dos Advogados”.
 
Leia a entrevista na íntegra:
 
Olhar Jurídico - Como o senhor vê este projeto de lei, reapresentado pelo deputado José Medeiros (Pode), que prevê o fim da exigência do Exame da Ordem para atuar como advogado no Brasil?
 
Fábio Capilé - Eu vejo que é de uma impropriedade tamanha a medida, porque na verdade não existe um fundamento concreto para a busca dessa mudança. A realidade é a seguinte: o exame da Ordem, ao contrário que afirmam, é um exame que estabelece um padrão, visando constatar o nível do candidato.
 
Olhar Jurídico – Como funciona a aprovação dos candidatos?
 
Fábio Capilé - Ele não é como um vestibular, onde são colocadas 40 vagas e só 40 passam. Se 100% alcançarem esse nível, os 100% estão aprovados. É uma filtragem para que o próprio mercado e a sociedade se sintam seguros de que temos profissionais minimamente credenciados para o exercício da profissão
 
Olhar Jurídico – O exame é a melhor maneira para se avaliar a capacidade do bacharel?
 
Fábio Capilé - Eu posso te afirmar, como professor universitário há mais de 10 anos, que é lógico que o exame ao qual a gente se submete não é o ideal. Em todos os aspectos aqui no Brasil, todos os exames exigem uma prova subjetiva, dissertativa e objetiva. Este é o nosso sistema de provas. Ele é o ideal? Ele não é o ideal, mas ele é eficiente, não só para você mensurar um determinado conhecimento, mas também tem um reflexo direto nos bancos acadêmicos.
 
Olhar Jurídico – Reflexo nos bancos acadêmicos em que sentido?
 
Fábio Capilé - Se o MEC não está exercendo o seu papel de fiscalização das universidades, as próprias universidades se vêem obrigadas a montar uma força tarefa, ao menos para que os alunos possam passar no exame da OAB. Se não tiver mais nenhuma exigência para que os alunos possam alcançar o mercado profissional, já que o MEC não exige nada, daqui a pouco só teremos cursos telepresenciais, cursos por correspondência. Não vai mais ter o comprometimento de ter a qualidade de ensino jurídico em nosso país.

Olhar Jurídico – O senhor acredita então que o Exame da OAB contribui para a qualidade do ensino de Direito nas universidades?
 
Fábio Capilé - O exame de ordem contribuiu consideravelmente para a qualidade do ensino de forma indireta. Os alunos não estudam mais pelo canudo, eles estudam para passar no exame de Ordem. Diante dos percentuais que nós temos aí, de pessoas que passam no exame, quando você verifica que apenas 15% passam, eles pensam “isso é difícil, eu tenho que estudar, eu sou obrigado a estudar”.
 
Olhar Jurídico – Ele também pode ser visto como uma motivação aos estudantes então?
 
Fábio Capilé - As pessoas se dedicam mais a isso, então existe também um reflexo disso direto nas universidades, onde o exame é muito respeitado, ele é tido como um objetivo a ser alcançado pelos alunos. É um incentivo para que os alunos estudem para chegar a determinada qualidade. Se ele não tiver determinada qualidade, ele não vai conseguir entrar no mercado. Então ele vai ser obrigado a estudar os aspectos técnicos da profissão. Ele vai ter que ler. Às vezes algum profissional pode até não exercer, mas ele vai estar ciente do que é, sobre todo o aspecto legal e sobre os aspectos de postura que ele deve adotar quando profissional. Isso é essencial para uma pessoa poder exercer uma profissão.
 
Olhar Jurídico – Um dos argumentos do deputado é que para outras profissões, como de médico ou engenheiro, não é exigida a aprovação em exame deste tipo...
 
Fábio Capilé - Deveria exigir. Sabe por quê? O próprio Ministério da Educação não faz o papel que lhe é devido, de fiscalização de atividades nas universidades. Então é necessário sim.
 
Olhar Jurídico – Um outro argumento dele é de que o exame é utilizado pela OAB como ferramenta de controle de mercado
 
Fábio Capilé - Não há o que se falar em controle de mercado, senão teria simplesmente uma parcela, um número certo de pessoas aprovadas, mas não é isso. A partir do momento que você estabelece um nível para que uma pessoa seja aprovada, podem passar 100% dos que foram inscritos.
 
Não seria muito melhor para a instituição deixar todo mundo fazer, porque se todo mundo passasse, todo mundo iria pagar anuidade? Teria este caráter arrecadatório, quanto mais gente melhor. Mas não é isso que se busca, o que se busca é qualificação das pessoas que ali estão
 
Olhar Jurídico – Há alguma especificidade com relação à profissão de advogado?
 
Fábio Capilé - A advocacia é a única profissão prevista na Constituição Federal. O advogado é o auxiliar da administração da Justiça. Lida diretamente com vidas. Tem previsão constitucional porque vai desde o aspecto do Estado Democrático de Direito, até a questão de liberdade individual e outros pontos que envolvem o indivíduo. A relevância do serviço não pode ser exercida de qualquer forma porque o advogado é o interlocutor entre a pessoa e o próprio poder judiciário; ele que vai levar ao poder judiciário os reclames da sociedade.
 
Olhar Jurídico – E esta posição deputado está em sintonia com a do presidente, que também já criticou a exigência do exame, até mesmo criou o projeto reapresentado por Medeiros
 
Fábio Capilé - Uma coisa é a pessoa ter uma análise pessoal da situação. Dá a entender que o aspecto deste projeto é pessoal, por algum motivo pessoal do deputado mesmo.
 
Olhar Jurídico – Como este projeto está sendo visto?
 
Fábio Capilé - Existe uma pesquisa rodando, inclusive, desse projeto, onde mais de 70% o rejeitam . O deputado tem que levar o anseio social para efeito de criação de projeto. Pode notar que o projeto, em termos de participação, da aprovação, é inferior a 30%. 70% é declaradamente contra ao projeto.
 
Olhar Jurídico – Como atua o Instituto dos Advogados Mato-Grossenses neste cenário?
 
Fábio Capilé - O Instituto tem, nos objetivos sociais, um compromisso com a cultura jurídica, a qualidade e o bom nome do jurista, em especial o advogado. A gente entende que esse exame é essencial para que não sejamos reféns de maus profissionais no mercado. Não que o exame da Ordem vai medir maus profissionais, mas pelo menos vai garantir uma capacitação mínima, pelo menos uma base mínima para que as pessoas possam exercer a profissão.
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