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Domingo, 29 de setembro de 2024

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POLÍTICA COM TEMPERO

O Aeroporto e a Copa de 2014

“Quando acordo invocado, ligo pro Bush e falo o que bem entendo...” (Presidente Lula em discurso em maio de 2004)


Tenho lido, quase que diariamente, na imprensa de Cuiabá, manifestações de preocupação com o aeroporto Mal. Cândido Rondon sobre estar ou não com suas obras concluídas para a Copa de 2014. Se existem, dentro dos compromissos assumidos com a FIFA, de garantia de conclusão e/ou construção de obras aprovadas no projeto, sob o risco da exclusão de Cuiabá como sub sede, acho bom o povo e os responsáveis pelo projeto, a começar por essa tal de AGECOPA, Agência Estadual de Execução dos Projetos da Copa do Mundo do Pantanal – FIFA 2014, além de demais atores envolvidos na realização do mesmo, como prefeitura, assembléia legislativa, governo e governador do estado, começarem a colocar as ‘barbas de molho”, para que a matéria da Folha de São Paulo da semana passada, tão veementemente desmentida pelo prefeito Wilson Santos, sobre a exclusão de Cuiabá como um das sub sedes, não venha a se tornar realidade.

Desconheço a quantas anda os outros projetos. Disse, aqui neste mesmo espaço, inclusive, que uma das causas da escolha de Cuiabá, como uma das sub sedes, foi um Fundo já criado pelo governo do estado, garantindo recursos no montante de R$ 300 milhões, com R$120 milhões já em caixa. Mas não bastam apenas os recursos provenientes do estado, município e da iniciativa privada. Serão necessários aproximadamente R$5 bilhões para a concretização do projeto total e a participação do governo federal é mais do que fundamental.

E com a preocupação do que tenho lido e ouvido sobre a importância da conclusão do aeroporto para a participação de Cuiabá na Copa de 2014 é que me atrevo a colocar a colher nesse mingau.

Tenho a mais absoluta convicção de que, mesmo fora do Parlamento desde 31 de janeiro de 2007, fui o parlamentar que mais se envolveu e mais lutou pela reforma e conclusão de tão importante aeródromo e, como tal, fui fundo no exercício da minha função. Descobri como é difícil lidar com obras federais, no que se refere à burocracia e à má vontade de alguns, quando seus interesses não são atendidos; descobri, também, que é muito mais fácil criar problemas do que resolvê-los.

A reforma do aeroporto Marechal Cândido Rondon, começou a ser gestada em 2000 e era apenas um quebra-galho, uma reforminha, diante da necessidade da época.

A proposta, licitada pela INFRAERO, foi ganha ao preço de R$11milhões, R$4 milhões abaixo do valor mínimo do edital. Para ganhar, e não importava como, A Construtora Triunfo “mergulhou” abaixo do preço mínimo proposto para a execução da obra.

Pois bem: aí começava a confusão. O projeto de reforma licitado foi mostrado ao então governador Dante de Oliveira, em uma reunião na sede da Infraero em Brasília, pelo então presidente da empresa, Fernando Perrone. Estávamos no governo FHC.

Dante quando viu a proposta revoltou-se, ficou indignado, deixando muito claro que o que se propunha para Mato grosso não atenderia, sequer, a demanda da época, enquanto que recursos a outros aeroportos de mesmo ou menor porte do de Cuiabá eram valores que passavam de R$150 milhões.

Na verdad,e o que se propunha era um verdadeiro deboche a Mato Grosso e sua gente. Para se ter uma idéia, enquanto se falava em R$11 milhões para Mato Grosso, a previsão de gastos pela Infraero em outros aeroportos já mostrava o desrespeito ao nosso estado. Senão, vejamos:

Goiânia – R$220.000.000,00
Vitória – R$380.000.000,00
Porto Alegre – R$115.000.000,00

Macapá – R$110.000.000,00
Florianópolis – R$295.000.000,00

E o que fez Dante? Levantou-se da reunião, após criticar duramente o então presidente da empresa e disse que Mato Grosso não aceitaria aquela “gambiarra” e dali foi direto ao gabinete do presidente FHC, onde mostrou toda a sua indignação.
FHC chamou Perrone e determinou que fosse revista a reforma.

Foi aí que a Infraero contratou o engenheiro Sérgio Parada, considerado como um dos mais competentes arquitetos na área aeroportuária do Brasil, com reconhecimento internacional, das mãos de quem surgiu o projeto hoje implantado em parte, porque a obra ainda não foi concluída, como todos sabem.

Um problema a mais: a obra foi projetada para um fluxo anual de 700 mil passageiros/ ano. Na inauguração do Bloco C, em 30 de junho de 2006, o volume anual já era de mais de um milhão de passageiros. Ou seja, se quando inaugurada já tivesse sido concluída na sua totalidade, já estaria com uma capacidade aquém da sua necessidade. Imaginem hoje, quando o fluxo deve chegar ao final do ano em mais de um milhão e quatrocentos mil passageiros.

A partir do novo projeto, o problema estava criado. A licitação fora feita para uma reforma e esse projeto fora deixado de lado e se iniciava a construção de outro, que nada tinha a ver com o original. Ou seja: como entregar uma obra que, na verdade, não fora licitada.

Mas isso era apenas o início. A empresa vencedora, a Construtora Triunfo, não foi capaz de executar a obra que fora divida em três partes: Blocos A, B e C. Executou a reforma do Bloco A, onde hoje funciona a administração e o desembarque, iniciou a construção do bloco C, não executou qualquer serviço no Bloco B, que antes da demolição funcionava como embarque e desembarque de passageiros. Um verdadeiro caos e vergonha para quem chegava ou partia.

Como a construtora responsável pela obra abandonou-a em 2002 e a mesma ficou paralisada ate 2005, quando a Infraero resolveu, após muita pressão, retomar os trabalhos, rescindindo o contrato com a Triunfo e passando a obra para a Geosolo, quarta colocada no processo licitatório, uma vez que nem a segunda, nem a terceira colocadas estavam habilitadas para assumir aquela que já era uma grande encrenca.
Vale lembrar que o contrato com a Triunfo foi assinado em 2001, com o valor já em R$17 milhões, bem acima dos R$11 milhões da proposta vencedora na licitação.

Até rescindir o contrato, em 2005, a Construtora Triunfo, recebeu perto de R$25 milhões, bem acima do valor permitido por lei para aditamento de contratos de quaisquer obras, e não cumprira a execução nem da metade, alegando preços defasados e abaixo do possível para a execução. Era um novo impasse a ser superado: não havia como colocar mais dinheiro em uma obra que já estava viciada e cheia de problemas.

Foi no inicio de 2003 que eu entrei nessa briga pra valer. Alem da retomada da obra do aeroporto, outra de vital importância era o asfaltamento da Avenida 31 de março, orçada em R$11 milhões, que contornaria toda a área do aeroporto, atendendo interesses da prefeitura e da própria Infraero, contribuindo em muito para o desenvolvimento da região.

A prefeitura estava disposta a custear metade da obra. E Jayme Campos, então prefeito, autorizou a negociação com a Infraero para assinatura do convênio. E lá fomos nós conversar com o presidente da empresa, o falecido deputado Carlos Wilson, que, já empenhado em solucionar a obra do aeroporto, autorizou também a formalização do convênio para a Avenida 31 de março. Foi uma grande vitória. Foi algo inédito!

A Infraero jamais fizera qualquer convênio de execução de obras com prefeituras. E ninguém acreditava que pudesse dar certo, porque o difícil ainda estava por vir, que era a doação, pela União, da área da avenida para a prefeitura, para que a obra pudesse ser iniciada E aí foi outra grande novela. Quase um ano de idas e vindas, para, enfim, em uma audiência com o Ministro da Defesa, à época José Alencar que, ao tomar conhecimento do problema, imediatamente determinou à Aeronáutica a autorização da doação. E aí nascia o asfaltamento da Avenida 31 de março. Essa doação, embora autorizada formalmente, ainda não foi finaliizada. Mas foi através dela que se construiu a 31 de março.

O tempo foi passando e a obra do aeroporto cada dia tinha uma nova complicação: ou era o MPF, ou eram o TCU, através da representação em mato Grosso, ou mesmo os diretores que não queriam assinar a autorização de uma obra eivada de vícios de origem.

Em meados de novembro de 2005, cansado de tantas promessas e na condição de vice-líder do PTB, paralisei uma reunião da Câmara dos Deputados que estava votando um Crédito Especial à Infraero. Foi a maior confusão, pois era uma quinta-feira à tarde e não havia quórum qualificado para votação nominal. Nesse dia ligou-me o presidente em exercício da Infraero, Brigadeiro José Carlos Pereira, pedindo-me para retirar o pedido de votação nominal, com o compromisso, junto com a Casa Civil, que também mandou representante à Câmara para negociar o pedido de retirada de votação nominal, de resolverem definitivamente o problema. Ledo engano. Nada aconteceu.
Enquanto isso, o Bloco B, onde funcionavam embarque e desembarque, ameaçava a ruir. Paredes estavam afundando e ninguém fazia nada.

Procurei, então, o governador e pedi-lhe um laudo técnico a ser realizado pelo Corpo de Bombeiros, cujo resultado, eu tinha certeza de que seria o pior possível. Perguntou-me ele: “Se o laudo for pela interdição você terá coragem de pedi-la com todas as conseqüências que advirão?”. Respondi-lhe que sim, mesmo sabendo de todo o transtorno que isso causaria. E ele retrucou: “Se esse for o resultado do laudo, pode pedir a interdição que eu a determino imediatamente.”

E o laudo, feito pelo Corpo de Bombeiros e também com a participação do CREA-MT, recomendava, como se era de esperar, a interdição do terminal B, caso a reforma não fosse iniciada imediatamente. Estávamos no Natal de 2005.

A última reunião de diretoria da Infraero seria no dia 27 de dezembro. Se a autorização para início do emergencial não fosse resolvida nessa reunião, somente em março de 2006, em uma nova reunião de diretoria o problema poderia voltar a ser tratado.

Fui a Recife e participei da reunião, distribuindo os laudos que recomendavam a interdição do terminal de Cuiabá. E disse a toda diretoria reunida que se eu não saísse dali com uma ordem de serviço para o início imediato da retomada da obra, através de contrato emergencial, eu estaria voltando a Cuiabá e protocolando o pedido de interdição do terminal aeroportuário, pelo desrespeito da Infraero para com Mato Grosso, além do risco de desabamento que o terminal corria, podendo, inclusive, causar uma grande tragédia. Informei-lhes, ainda, da disposição do governador para a interdição.

E foi assim que saiu a autorização para a realização do contrato emergencial, com a demolição do terminal B e conclusão do Terminal C, como funciona até hoje. Precariamente, com todo o desconforto e, na minha maneira de ver, ainda sem uma solução de prazo a vista.

A coisa é tão complicada que, embora autorizado, o contrato emergencial, para a realização da obra, só foi assinado em 21 de março de 2006, com prazo de 90 dias para a conclusão.

Vale lembrar, e devem constar ainda da ata dessa reunião da diretoria da Infraero de 27 de dezembro de 2005 em Recife, mais duas coisas importantes: a primeira é que imediatamente seria lançado um concurso nacional para elaboração do projeto arquitetônico do novo terminal aeroportuário de Cuiabá/Várzea Grande, a ser construído Avenida 31 de março, onde hoje tanto se alardeia a sua importância. A segunda decisão seria o lançamento da licitação para a construção desse novo terminal, tão logo a reforma e construção até hoje incompletas, fossem concluídas.

Inaugurada a obra em junho de 2006, iniciou-se outra novela: o terminal B seria construído por nova licitação ou faria parte de um aditamento do contrato emergencial autorizado para a demolição do Bloco B e conclusão do Bloco C? E a Infraero, mais uma vez, contrariando qualquer critério de razoabilidade e respeito à coisa pública, resolveu, depois de tantas idas e vindas, que a modalidade seria por licitação, que foi aberta em abril de 2008 e posteriormente anulada, porque a mesma Infraero, ao que tudo leva a crer, tinha interesse em que outra empreiteira, que não a vencedora da licitação, fosse responsável pela realização da obra.

E o que é mais triste: se a construção do Bloco B fosse incluída no contrato emergencial, a obra seria realizada totalmente com valores em torno de R$30 milhões. Uma nova licitação hoje, não sairá por menos de R$70 milhões, segundo informações de quem conhece o processo.

Pois bem: quando se toma conhecimento de todas as artimanhas de bastidores e se conhece todas as dificuldades para o início de uma obra pública, é preciso atentar para os prazos da Copa de 2014.

Quero registrar aqui, que em termos de aeroportos, não existe nesse país, qualquer obra da Infraero que tenha tido seu início em menos de dois anos da data da abertura do processo licitatório até a autorização de serviço para o início da obra. Ou seja, se Deus mandar bom tempo e céu de brigadeiro, se a licitação anulada for marcada ainda para este ano, é bem possível que no final de 2011 ainda estaremos discutindo o que vai ser feito ou não no aeroporto.

E foi por saber disso tudo, por ter acompanhado de perto todos os passos dados, por reconhecer a vontade férrea do falecido Presidente Carlos Wilson, do Diretor Marco Antonio Marques de Oliveira, hoje na Diretoria de Operações dos Correios, do Assessor Especial Leur Lomanto, pessoas sem as quais estaríamos ainda hoje sem solução nessa questão tão delicada e que toma uma nova dimensão pela realização da Copa de 2014, que, como disse o presidente Lula em seu discurso, que acordei invocado pra alertar o governador, os senadores, os deputados federais e os estaduais, secretário de estado, futuros dirigentes da tal da AGECOPA, além dos segmentos organizados da sociedade mato-grossense, entre eles os representantes do agronegócio e do trade turístico, que Mato Grosso não é prioridade como nunca foi para os interesses da Infraero. Nunca foi. E se puder, ela, Infraero, pela sua história com Mato Grosso, deixará de fazer o mínimo possível para que as coisas aconteçam como deveriam.

Como o atual presidente da Infraero, Murilo Barbosa, já confirmou presença na Audiência Pública, de iniciativa do deputado J. Barreto, no dia primeiro de outubro, seria interessante cobrar dele compromissos anteriores assumidos pela empresa. O que, sinceramente, duvido que ele os assuma publicamente. Mas já será válida a sua presença pelo fato de ele conhecer pessoalmente o aeroporto, para que quando lhe for falado novamente que o aeroporto de Cuiabá fica em Várzea Grande, ele não precisará repetir: e onde fica essa cidade? Com a cara de espanto que fez na reunião com a bancada federal.

Os temperos dos banquetes da Infraero são diferentes da simplicidade dos nossos. E há que se estar atento para que não nos enfiem goela abaixo sabores indigeríveis que poderão nos causar um tremendo desarranjo. Irreparável.

*Ricarte de Freitas é advogado e ex- parlamentar por Mato Grosso. (ricartef@gmail.com)

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