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Sexta-feira, 29 de março de 2024

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EM DEFESA DO MEIO AMBIENTE

Instituto Centro de Vida comemora 30 anos com série de reportagens especiais

Instituto Centro de Vida comemora 30 anos com série de reportagens especiais
O ano era 1996. Sérgio Guimarães caminhava em direção ao pequeno escritório do Instituto Centro de Vida (ICV), em Cuiabá. Dessa vez, decidido: fecharia a organização que ajudara a fundar, seis anos antes.


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Uma forte crise abatia a instituição. Era a primeira delas.

O ambientalista carregava o jornal diário embaixo do braço quando, ao abrir a porta do escritório, o impresso caiu no chão. “Nesse momento, me veio um pensamento de que teria alguma mensagem para mim nessa página que abria”, conta.

Se abaixou em direção ao periódico e bateu os olhos numa manchete, uma citação que dizia: Não existem fracassos, existem pessoas que desistem antes da hora. “Deu até raiva ler aquilo”, lembra rindo.

Quase dez anos antes, Sérgio participava de uma cena icônica.

Numa cachoeira na Chapada dos Guimarães, ambientalistas ativistas pintados e fantasiados faziam manifestações performáticas contra a implementação de uma turbina de geração de energia na área.

Avistaram se aproximar um grupo de pessoas cujas vestimentas destoavam dos manifestantes na cachoeira: de terno e bem vestidos, seguravam cartazes que dariam origem à criação de um partido político progressista no país.

O movimento ambientalista é dividido em vertentes. É o que explica um dos fundadores do Instituto Centro de Vida (ICV) ao contar o causo que carrega vívido na memória.

“Teve esse originado do movimento ‘hippie californiano’, depois o surgido nas barricadas de Paris. Naquele momento, naquela cachoeira da chapada, aquelas duas correntes se encontravam e dialogavam, eram pontes sendo construídas”, conta.

A situação se desenrolava em 1985, após os 21 anos de uma ditadura militar que acabara, mas cujas dores e traumas se arrastariam ao longo dos anos. Urgia, na sociedade civil, a necessidade de uma profunda reconstrução da sociedade brasileira.

Em Mato Grosso, nascia a Associação Mato-grossense de Ecologia, a AME Mato Grosso, uma articulação de militantes de diferentes áreas e atuações com um objetivo em comum. Eram professores, engenheiros, artistas, entusiastas da causa ambiental.

Envolvidos em um borbulhante movimento cívico carregado de esperança, alegria e alívio com o fim do período de domínio militar no país, os manifestantes se direcionavam para o lugar que agora poderiam ocupar com mensagens, em ações e palavras: a rua.

O palco central das mobilizações era a Chapada dos Guimarães, onde organizavam mutirões para catar lixo, abordavam e informavam visitantes sobre os impactos e ameaças ambientais na área e promoviam protestos reivindicando a proteção do local.

Eram vistos e reportados pela imprensa, que garantia a visibilidade da causa, e o resultado foi a publicação do decreto de criação do Parque Nacional da Chapada dos Guimarães, em abril de 1989.

Foi uma vitória do movimento, mas que não significava descanso. Também foi quando surgiu a Usina Hidrelétrica de Manso, que seria inaugurada em 2000, e objeto de discussões e protestos promovidos pelo grupo.

As ameaças seguiam. Na época das queimadas, por exemplo, os militantes levavam cinzas e promoviam manifestações artísticas na Praça da República.

“A gente se pintava com as cinzas, pintava quem passasse. Existia um movimento cultural e artístico forte na cidade e a gente se confundia com ele”, conta.

Com o tempo, também passaram a articular em outras esferas.

O próprio Sérgio foi secretário de Transportes do município de Cuiabá, depois secretário de Meio Ambiente do Estado em um cargo que ocupou até meados de 1989 e de onde levou a expertise adquirida em políticas públicas para a associação.

“Nessa época surgiu, de forma natural, a necessidade de criarmos uma instituição mais estruturada. Primeiramente, pensamos em um instituto técnico da AME. Mas a ideia evoluiu”, conta.

As reuniões eram feitas na casa do engenheiro, quando foi pensado, debatido e, no dia 14 de abril de 1991, finalmente fundado o Instituto Centro de Vida (ICV).
 

CENTRO DE VIDA
Inicialmente, o nome proposto para a Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP) foi Instituto Vida. A palavra vida, explica Sérgio, abarcava “todas as coisas que a gente queria fazer”.

Em concomitância, a instituição se propunha a ser um centro de fusão de ideias denominadas como ‘ecologistas’, advindas de uma corrente ambientalista em que o viés social começava a ganhar mais espaço.

Almejava, além disso, ser referência entre as organizações de proteção ao meio ambiente no estado. “Então juntamos essas duas palavras”, relembra.

Por mais dois anos após aquele dia em abril, o singelo grupo de seis pessoas ainda se reunia em um quarto na casa de Sérgio para discutir e planejar as ações.

O ICV se uniu a outras organizações para fundar Fórum para o Meio Ambiente e Desenvolvimento (Formad), órgão com quem passou a dividir o aluguel de uma pequena salinha em 1992.

Os recursos ainda eram escassos e o trabalho, voluntário. Um dos jeitos era apelar para a “mentalização”.

Ao ver uma propaganda de um fax na Revista Veja, Sérgio recorda-se de recortar a imagem e colar na parede da sala, um gesto simbólico para que a máquina de comunicação se concretizasse para os ativistas.

“Depois disso, entrou um primeiro recurso de um projeto e compramos um fax, mas aí já estava no fim da era do fax, veio o computador”, narra rindo. “Dava para pagar o aluguel de uma casa e um computador.”

Uma casa pequena casa de três quartos foi o primeiro escritório do ICV.

Nessa época, começava a ser debatida a implementação da Hidrovia Paraguai-Paraná (HPP), um projeto transnacional cujas consequências, apontava o ICV e outras ONGs, seriam extremamente danosas aos ecossistemas pantaneiros e às populações tradicionais do bioma.

O ICV foi, então, um dos que articulou um “Painel de Especialistas” para contra argumentar os estudos de impacto apresentados até então e financiados pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), que demonstrara interesse em bancar as primeiras etapas do projeto.

“Foi possível mostrar a debilidade do projeto com um painel de especialistas que fizemos, lá desmontamos todo o projeto”, conta Sérgio. Até o banco desistir do financiamento.
 

CONSTRUIR SOLUÇÕES
A instituição puxou o debate que originou a criação da Coalizão Rios Vivos, uma articulação entre diferentes organizações dos cinco países abarcados pelo projeto para monitorar a hidrovia, com mobilizações e análises técnicas de profissionais da área.

A base técnica-científica, comenta Sérgio, sempre foi uma linha-guia no trabalho da instituição.

Muito por causa da aproximação da organização com o meio acadêmico, relação nutrida desde antes de sua fundação. A criação da AME ocorreu em uma sala da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), depois de uma boa dose de polêmica e discussão entre ativistas.

“Era um momento de muito debate e discussão. Existiam muitas vertentes dentro, havia muita briga, mas a gente não se largava. O ICV surgiu nesse contexto também, de procurar ter mais consistência de atuação, capacidade de articulação e base técnica sólida. Foi um processo de amadurecimento”, conta.

O ICV integrou o Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais para o Meio Ambiente e Desenvolvimento, que reunia mais de 200 organizações em uma articulação de preparo para a Eco 92, conferência das Nações Unidas (ONU) no qual foi participante.

Foi quando os integrantes da instituição tiveram contato com líderes mundiais de renome em um evento que haveria marcar a história do movimento ambientalista no Brasil.

Em 1996, com posicionamentos críticos a projetos de infraestrutura danosos ao meio ambiente apoiados pelo Governo do Estado à época, a instituição enfrentou uma crise que fez Sérgio sair de casa, naquela manhã, convencido da incapacidade de continuar o trabalho.

“Sempre foi uma batalha grande buscar recursos”, comenta.

Mas a mensagem do jornal precedeu um novo direcionamento. Logo, o ICV não apenas continuaria, como expandiria seu olhar para outra região: a Amazônia mato-grossense.

“Uma área maior que Rondônia e Acre juntos e que não tinha praticamente nenhuma organização atuando, a não ser o ISA dentro do Parque do Xingu”, comenta Sérgio.

Algum tempo depois do momento de desalento, a instituição aprovou o hoje lembrado como ‘Projeto Fogo’.

A instituição cresceu e, no ano de 2000, se estabeleceu em Alta Floresta, município a 800 quilômetros da Capital, localizado na região norte de Mato Grosso. Na Amazônia.

Lugar onde foi ampliada e concretizada a missão do ICV de construir soluções compartilhadas.

Característica impressa no DNA da instituição pelos seus fundadores, nos diálogos promovidos entre academia, ativismo, instituições públicas e meios de comunicação.

O ICV passava, agora, a conversar com mais setores ainda: os pecuaristas e agricultores estabelecidos na região amazônica do estado.

Confira na próxima reportagem da série especial do #ICV30anos o desenrolar dessa história.
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