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Quarta-feira, 24 de abril de 2024

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Líder afegão já não é mais o herói de antes

Uma prévia do que está reservado para o presidente Hamid Karzai após a eleição de um novo governo americano ocorreu em fevereiro do ano passado, quando Joe Biden, então senador, compareceu a um jantar formal no palácio durante uma visita ao Afeganistão.


Entre um prato de cordeiro e outro, Biden e dois outros senadores americanos questionaram Karzai sobre a corrupção em seu governo, que, segundo várias estimativas, está entre as piores do mundo. Karzai garantiu a Biden e aos senadores não haver nenhuma corrupção e que, de qualquer forma, a culpa não era dele.

Os senadores ficaram boquiabertos, surpresos. Após 45 minutos, Biden jogou o guardanapo e se levantou.

"O jantar está encerrado", anunciou Biden, segundo relato de uma das pessoas presentes. Então, os três senadores se retiraram, muito antes da hora combinada.

Hoje, é claro, Biden é o vice-presidente dos Estados Unidos. 

O mundo mudou para Karzai e também para o Afeganistão. Favorito de Bush na Casa Branca – uma celebridade vestida num manto leve e fez (tipo de chapéu usado no Oriente Médio) cinza-escuro – em cada um dos sete anos em que liderou seu país desde a queda do Talibã, Karzai agora não se encontra em nenhuma situação de favoritismo. Nem em relação a Washington, nem em seu próprio país.

Na Casa Branca de hoje, o presidente Barack Obama disse considerar Karzai uma pessoa não-confiável e ineficaz. A Secretária de Estado, Hillary Rodham Clinton, o acusou de presidir um "narco-estado". Os americanos responsáveis por elaborar políticas externas envolvendo o Afeganistão, preocupados em estar perdendo a guerra, estão prometendo desviar de Karzai e lidar diretamente com os governadores do interior do país.

Em casa, Karzai enfrenta uma insurgência crescente e uma população que o culpa pela evidente falta de progresso econômico e pelos agentes do governo corruptos, aparentemente presentes em cada porta de sua administração. O rosto do presidente afegão, antes utilizado como enfeite nas paredes das lojas de chá por todo o país, hoje está muito menos visível.

Agora, talvez de forma crucial, uma eleição está se esboçando. Karzai vai pedir aos eleitores para mantê-lo no palácio para um novo mandato de cinco anos. A eleição está marcada para o dia 20 de agosto, depois do que promete ser um verão violento e cheio de acontecimentos. De acordo com uma pesquisa encomendada por um grupo de afegãos, 85% dos entrevistados afirmaram pretender votar em outra pessoa, não em Karzai.

Ao mesmo tempo, o governo Obama terá de decidir o que quer de Karzai à medida que tenta cumprir sua promessa de reverter o curso da guerra. Ou se realmente quer a presença de Karzai.

Com a insurgência, a corrupção gritante e papoulas de ópio florescendo por todo o território, talvez não seja surpresa tantos afegãos, e tantas pessoas em Washington, verem a saída de Karzai como um pré-requisito para reverter a espiral negativa do país.

"Sob o governo do presidente Karzai, passamos de uma situação melhor para uma situação boa, depois para uma situação não tão ruim, para finalmente uma situação ruim – agora estamos piorando", disse Abdullah, ex-ministro das relações exteriores do atual governo, e possível desafiante para a presidência (como muitos afegãos, só tem um nome). "Essa é a tendência".

"Digamos que Karzai permaneça no poder por todo o verão e nada de grave aconteça. Depois ele ganha a reeleição", disse Abdullah. "Então, haverá dois cenários, e somente dois – um rápido colapso ou uma lenta recuperação."

Pessoas próximas a Karzai afirmam que o homem está exausto, desconfiado dos inimigos e preocupado com sua integridade física. Ele se sente sob ataque e desvalorizado, dizem, mas, apesar de tudo isto, está absolutamente determinado a concorrer novamente à eleição e a vencer.

Apesar de todas as dúvidas sobre Karzai, ele ainda é, de longe, o político mais poderoso do país. Ele comanda os recursos do estado afegão, incluindo as forças armadas e a polícia, além de bilhões de dólares em ajuda americana e internacional que chegam ao tesouro.

Em seus sete anos no cargo, Karzei presidiu com sucesso a transação do estado afegão de uma instituição devastada e pré-moderna, como era sob o domínio do Talibã, para uma instituição com profundos problemas, mas amplamente democrática nos dias de hoje. Talvez mais importante para seu futuro, Karzai reuniu um time de administradores gabaritados cuja competência e experiência são difíceis de serem alcançadas por um adversário.

Quanto aos membros da equipe de Obama, eles podem descobrir que Karzai é o homem com quem serão forçados a lidar, gostando ou não.

Durante uma coletiva de imprensa, Karzai reconheceu sua própria impopularidade, e então ofereceu uma vigorosa defesa de seu passado. Ele se recusou a ser entrevistado para esta matéria.

"Bem, estou no governo há sete anos. É natural que eu não seja tão popular quanto a sete anos atrás", disse ele.

"As instituições do Afeganistão têm funcionado muito bem", acrescentou. "A população afegã participou da eleição para presidente. Eles participaram das eleições para o parlamento. O sistema parlamentar tem funcionado muito melhor que alguns parlamentos estabelecidos de outras partes do mundo. Eles têm criado e aprovado leis. As instituições governamentais estão em progresso crescente – a economia, o exército nacional, o crescimento da educação. Passamos de duas ou três universidades em 2002 para 17, a desfrutar de liberdade de imprensa, centenas de jornais e rádios, tudo isso. Eu e o povo afegão estamos orgulhosos dessas conquistas".

Karzai também deveria ter dito que seis milhões de crianças afegãs frequentam a escola, sendo um quarto delas meninas, cuja educação era proibida pelo Talibã.

Uma das pessoas com palavras mais generosas sobre o presidente do Afeganistão é William Wood, embaixador dos Estados Unidos. No governo do antigo chefe do embaixador, presidente Bush, Karzai desfrutou de um status pessoal prestigiado, mesmo quando seu país não estava na mesma situação. O relacionamento especial foi simbolizado por videoconferências das quais os dois participavam regularmente.

"O homem trabalha duro", disse Wood em relação a Karzai. "Ele enfrenta diariamente um conjunto de problemas capaz de intimidar a qualquer um. Ele tem uma insurgência baseada fora do país, e um nível de pobreza e criminalidade dentro do país, que alimenta essa insurgência. Ele dispõe de um exército criado a partir do nada, após a expulsão do talibã do poder. Tem uma força policial que teve de ser reformada."

Durante uma entrevista em seu gabinete em Cabul, Wood acrescentou: "Sim, acho que ele está cansado. Sinceramente, acredito que todos – a comunidade internacional, os Estados Unidos, as Nações Unidas, a Europa Ocidental, a imprensa internacional – estavam otimistas demais, nada realistas, em relação ao problema do Afeganistão após a saída do Talibã".

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