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Sem dinheiro para manter atendimentos, Hospital de Câncer acusa Prefeitura de Cuiabá de não fazer repasses

Da Redação - Bruna Barbosa / Do Local: Érika Oliveira

Sem dinheiro para custear a manutenção dos serviços oncológicos, o diretor do Hospital do Câncer de Mato Grosso (HCanMT), Laudemir Nogueira, afirmou que a Prefeitura de Cuiabá não está cumprindo com repassaes de recursos e emendas da bancada federal enviados ao hospital. O atraso corresponde a mais de R$ 37,2 milhões. Por meio da assessoria, a secretaria municipal de Saúde informou que não reconhece o valor. 

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A denuncia foi feita em coletiva de imprensa na manhã desta quarta-feira (28), no HCanMT. Laudemir afirmou que conversou com a secretaria municipal de Saúde, Suelen Alliend, na segunda-feira (26), quando ela teria informado que a Pasta não tem recursos em caixa para fazer os repasses. 

"Para mim fica claro que é uma tentativa de sufocamento. Hoje, o Hospital de Câncer não tem recurso para pagar os médicos, fornecedores, quimioterápicos, conta de luz e oxigênio, mesmo sendo creditório de mais de R$ 37 milhões. Isso é gravíssimo", afirmou o diretor técnico do HCanMT, Diogo Sampaio. 

De acordo com Laudemir, os descumprimentos financeiros começaram em 2018, segundo ano da gestão do prefeito Emanuel Pinheiro, quando começaram a ser feitos pagamentos parciais, retenção de emendas parlamentares e pagamentos deixaram de ser realizados. 

No ano seguinte a situação se agravou de "maneira mais drástica", conforme o presidente, com criação de um "pedágio de 20" para que as emendas de deputados federais fossem repassadas. Laudemir foi informado que, para ter acesso aos recursos, o HCan teria que ofertar serviços que são da Rede Básica de Saúde. 

"Nada tem a ver com o perfil do Hospital de Câncer. Me recusei a assinar. Quando não aceito, começaram as retaliações. Dinheiro retido indevidamente, valores repassados pelo governdo do Estado através do FEF, UTI, e que é retido sem nenhuma explicação. Quando chega a pandemia, a legislação federal dá aos hospitais o direito de receber o contrato na integralidade, a prefeitura se recusou a pagar. As vezes diferença de R$ 1 milhão", explicou.

A direção do HCanMT também denunciou que tem sofrido retaliações após ter acionado a Prefeitura de Cuiabá na Justiça. De acordo com Laudemir, é apenas dessa forma que o hospital tem conseguido fazer manuntenção de equipamentos, por exemplo.

Além disso, empréstimos precisaram ser feitos. Atualmente, os médicos do HCanMT estão com salários atrasados por conta do descumprimento financeiro. O presidente ressaltou que a consequência da situação será sentida pela população que precisa dos serviços oncológicos. 

"Pacientes que estavam com câncer e poderiam ser curados, [vão se agravar] para paliativos, câncer que poderia ser diagnosticado previamente não será, cirurgias que poderiam ser feitas e não serão. Não é por estarmos na semana próxima da eleição. Entraremos em outubro, mês da prevenção ao Câncer de Mama, que tem como principal tratamento a cirurgia e, em casos mais graves e agressivos, a quimioterapia. Não teremos como atender essas pacientes". 

Secretária de Saúde teria tentado impedir coletiva 

Laudemir também afirmou que, em conversa com a secretária municipal de Saúde nessa terça-feira (27), Suelen Alliend, tentou negociar para que a coletiva sobre as denúncias não fosse realizada pela direção nesta quarta-feira (28). 

Nogueira afirmou que não conversa com Emanuel Pinheiro desde 2019 por conta da série de descumprimento com os compromissos feitos com o HCanMT. 

"Tenho certeza que ele tem ciência, porque ontem a noite em conversa com a secretária de Saúde, através do Whatsapp, ela me disse que tudo que estava propondo tinha aval do prefeito. Não tentou barrar a coletiva, tentou negociar para que não acontecesse". 

Fornecedores do HCanMT também estão com pagamentos atrasados desde janeiro. O presidente ressaltou que não é do interesse da direção que os serviços sejam paralizados e, caso isso aconteça, a responsabilidade será atribuída ao prefeito. 

"Não vamos deixar ninguém morrer, mas o prefeito esticou a corda e ela arrebentou. Se o Hospital de Câncer em algum momento suspender as atividades, jogo a responsabilidade para o prefeito". 

Atualmente, 2,5 mil pacientes, entre adultos e crianças, dependem dos atendimentos oncológicos oferecidos pelo HCanMT. A unidade também é responsável pela assistência de mais de 75% de moradores do interior de Mato Grosso. Ele ressaltou que o hospital ainda é referência em mais de 70% dos atendimentos do estado. 

"O que é peço é para pensar nesses mais de 35 mil atendimentos. Imagino que vamos passar de 150 mil atendimentos esse ano. Que possamos resolver o mais rápido possível essa situação, para que não seja necessário a suspensão. É interesso zero da direção do hospital a suspensão dos atendimentos. Agora, parece ser do interesse da Prefeitura de Cuiabá". 

Funcionários de confiança na Saúde 

Uma das denúncias de Nogueira diz respeito a funcionários que atuam como "braços" do prefeito Emanuel Pinheiro dentro da secretaria municipal de Saúde. Segundo ele, um deles se apresenta como adjunto-financeiro e são responsáveis pelas tomadas de decisão. 

Em uma das tentativas de diálogo, a direção do HCanMT foi informada de que os recursos que deveriam ser repassados ao hospital haviam sido usados para despesas da Empresa Cuiabana. 

"Por que o prefeito não para de usar os nossos recursos com a Empresa Cuiabana? Parte do HMC e do Hospital São Benedito não são credenciados pelo SUS. O adjunto financeiro falou para nossa equipe: nós usamos o dinheiro de vocês para pagar as despesas da Empresa Cuiabá". 

Em emendas federais o valor devido se aproxima de R$ 4 milhões, considerando que R$ 2 milhões já está dentro do bloqueio judicial na Justiça Federal. Nogueira ressaltou que, se a situação não for resolvida, na próxima segunda-feira (3), o valor referente ao mês de agosto, de R$ 3,4 milhões, também vai vencer. 

"Procurei o MPE depois de muita tentativa, muita negociação inclusive com o próprio prefeito e intervenção do filho dele, deputado federal Emanuelzinho. Nada resolvia, sempre saía de lá carregando uma mala de promessas". 

Valores devidos

Em decisão de 3 de junho, a Justiça Federal, determinou o bloqueio de R$ 24.522.167, 48 (já liberados R$ 2.617.349,16) junto ao Fundo Nacional de Saúde (FNS) para pagamento em 10 parcelas diretamente em conta judicial. (Processo Nº 1018952-11.2020.4.01.3600 - 3ª Vara Federal Cível da SJMT).

Nogueira afirmou que o acordo não foi cumprido. Os atrasos persistiram e, no momento, a Pasta deve as produções/competências de maio, junho e julho de 2022, totalizando o valor de R$ 8.687.607,93, de acordo com a direção do HCanMT.
 
A Prefeitura de Cuiabá também deve três competências referentes às transferências provenientes do Estado de Mato Grosso do Fundo Estadual de Equilíbrio Fiscal de Mato Grosso - FEEF/MT de: julho/22 (R$ 909.680,65), agosto/22 (R$ 877.862,21) e setembro (R$ 1.079.655,75), totalizando a quantia de R$ 2.867.198,97.

O HCanMT também acusa a secretaria municipal de Saúde de apropriação de recusos provenientes do Estado para cofinanciamento da UTI Adulta: abril/22 (R$ 271.984,26) e maio/22 (R$ 310.768,47), totalizado R$ 582.752,73.

"Acima de tudo já temos sentença judicial proferida pelo juízo da 3º Vara Federal Cível de Cuiabá, hoje nós estamos em uma situação de insolvência, com risco de suspensão das nossas atividades, jamais a paralisação. O prefeito Emanuel Pinheiro não vai conseguir fechar o Hospital do Câncer. Jogo toda a responsabilidade por essa situação na conta dele". 

Outro lado 

Por meio da assessoria de imprensa, a secretaria municipal de Saúde afirmou que não reconhece o valor de R$ 37.260.554,95 divulgado pelo HCanMT. De acordo com a Pasta, uma proposta de pagamento do recurso FEEF foi apresentada ao hospital. 

Na nota, a secretaria salientou que Cuiabá enfrenta uma crise de saúde pública, sofrendo sobrecarga nos serviços de oncologia em Mato Grosso, por conta da ausência da especialidade em outras 15 regionais de saúde. 

Leia a nota na íntegra:

Nota à imprensa

- A Secretaria Municipal de Saúde de Cuiabá informa que não reconhece o montante de R$ 37.260.554,95 conforme relatado pelo Hospital de Câncer de Mato Grosso (HCan). 

- Os valores reconhecidos constam na proposta de quitação dos débitos formalizada pelo Município em documento oficial e autos do processo que corre perante a justiça. 

- Dentro da proposta estão prazos e data para quitação de débitos, bem como comprovante de pagamento as competências de UTI  já efetuado. 

- Tal proposta foi efetuada e apresentada ao HCan no dia 27 deste mês.  

- Sua formulação ocorreu com base em reunião com a presidência da instituição realizada na data de 26 de setembro. 

- A SMS, conforme proposta apresentada ao HCan, se compromete em realizar o pagamento do recurso FEEF referente aos meses de  junho, julho e agosto no valor de R$ 2.867.198,97 e de R$ 4 milhões referente ao montante dos valores do componente pré e pós fixado das competências de maio e junho no início do mês de outubro.

- os débitos remanescentes, levando em consideração a controvérsia instaurada em relação aos valores, serão tratados por intermédio de mesa de negociação com representantes da entidade, da sms, da smf e comitê de ajuste fiscal do Município;

- Por fim, ressalta o compromisso dessa gestão com as instituições contratualizadas, mesmo mediante ao cenário de problemas que a municipalidade vem enfrentando com a rede assistencial cada vez mais sobrecarregada com pacientes que vêm de todo interior do Estado. 

- A SMS salienta que vem envidando todos os esforços para enfrentar a crise que assola a saúde pública deste município, uma vez que sofre uma grande sobrecarga nos serviços de oncologia do Estado de Mato Grosso, devido os vazios assistenciais nas especialidades oncológicas nas outras 15 regionais de saúde do Estado de Mato Grosso.
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