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Praticantes do pole dance lutam pela oficialização do esporte

R7

O tronco avantajado e a silhueta definida denunciam. Rafaela Montanaro já foi ginasta e até circense. Hoje, ela se dedica a uma prática pela qual luta duplamente: com a força dos braços e das idéias. A campeã brasileira e sul-americana anda preocupada: tem um mundial de pole dance pela frente. Representará o Brasil em Zurique, na Suíça, no mundial da categoria em outubro. Mas não sabe se até lá, conseguirá o seu maior objetivo: transformar definitivamente a modalidade em esporte. Não para ela, nem para seus praticantes, mas para o público em geral.

Popularizado no país por uma novela exibida no horário nobre, o pole dance foi criado na Inglaterra, em meados dos anos 80. Conhecida como dança do poste, a prática é geralmente relacionada a uma dança sensual que utiliza como elemento principal uma barra vertical, onde a praticante realiza movimentos e acrobacias. Porém, mesmo com a associação quase imediata a clubes de strip tease ou a uma finalidade com alta carga de erotismo, os fãs da modalidade, como Rafaela, querem reverter esta imagem.

Sua treinadora Cristina Longhi mantém uma academia exclusiva de pole dance na Zona Sul de São Paulo há dois anos. Tem mais de 60 alunas fixas e dá aulas especiais para quem não quer competir - apenas aprender a dançar na barra. E diz que a divulgação da modalidade foi positiva, apesar das nuances sexuais dadas à personagem do folhetim televisivo.

- Embora de maneira distorcida, a novela ajudou a divulgar o pole. Seu mérito foi tirá-lo das boates e trazê-lo para as academias. Afinal, a atleta pode e precisa ser sensual, mas não pode ser vulgar ou leviana. Nós usamos muito mais que a graciosidade quando estamos na barra: é indispensável usar toda sua força e equilíbrio para executar os movimentos com flexibilidade e perfeição. É desafiador e ideal até para quem quer perder peso e não gosta de musculação.

A professora se recorda então de um episódio que a estimulou a brigar junto com Rafaela pela oficialização do pole como modalidade esportiva.

- Fui contratada para um evento de três dias. Os contratantes não gostaram da minha postura, logo na primeira apresentação. Também não aprovaram a minha roupa, disseram que eu deveria ser mais sensual. Fui dispensada, não ganhei o cachê, mas não me importei. Não estava lá para isso. As pessoas ainda não conhecem o trabalho que desenvolvemos.

O esporte no papel

A história de Rafaela Montanaro com o pole dance tem um ano e meio. Fez ginástica artística por nove anos, treinada por Georgette Vidor, e foi colega de Daniele Hypólito. Ao abandonar a prática, fez escola de circo por um ano e meio na França. Ao adotar a dança da barra como seu esporte, percebeu que a distorção popular da prática atrapalhava os planos de quem queria levá-la a sério. E decidiu então escrever um código de arbitragem, além de colaborar com a já existente Federação Brasileira de Pole Dance, que tem sede no Rio de Janeiro.

O documento desenvolvido por ela, com a ajuda de outros especialistas, contempla desde a composição das notas para as atletas, bem como a avaliação dos exercícios obrigatórios e o grau de dificuldade de A até E para cada um deles. As regras são divididas para profissionais e amadores. Ali, são descritos 28 tipos de giros, 84 movimentos diferentes, além de uma minuciosa explicação sobre postura, posição do tronco, pernas, pés, desequilíbrios e até quedas não intencionais.

- O que faço é esporte, é arte. E toda prática esportiva precisa de regulamentação. Antes disso, não existia um sistema de avaliação preciso no Brasil. Estas regras já são praticadas em lugares onde o pole é levado a sério, como na Austrália, Estados Unidos e Inglaterra. As concorrentes destes países, inclusive, são minhas maiores concorrentes no mundial da Suíça.

A prática ainda é essencialmente feminina. Não existem homens na academia de Cristina. E essas mulheres fortes assumiram a batalha, e querem ir mais longe: o maior sonho das praticantes é transformar o pole em esporte olímpico. Segundo a própria Rafaela, a federação brasileira já trabalha neste sentido.

- A entidade internacional que regula o esporte foi fundada justamente para nos representar junto ao Comitê Olímpico Internacional. Queremos ser esporte de demonstração em 2016.

E não será uma tarefa nada fácil. Procurado pela reportagem do R7, o Comitê Olímpico Brasileiro diz não conhecer esta prática esportiva e nem ter contato com nenhuma entidade ligada ao pole dance.

- O COB não tem conhecimento sobre essa atividade e também não se relaciona com qualquer entidade do gênero. Não nos cabe incluir modalidades esportivas no calendário esportivo brasileiro. Essa é uma atribuição da Confederação dirigente de cada esporte. Conforme determinado em seu estatuto, temos como Confederações filiadas aquelas que dirigem esportes e modalidades integrantes do Programa dos Jogos Olímpicos.

Mais técnica, menos sensualidade

Enquanto isso, Rafaela continua treinando para sua performance na Suíça. Escolheu uma balada da banda alemã Scorpions para embalar seus difíceis e quase inacreditáveis movimentos na barra, durante sua apresentação na Suíça. Durante a conversa, ela pede licença por alguns minutos e reaparece transformada. Abandona o jeans e “monta-se” em duas peças mínimas e um admirável salto alto preto. Mas trata logo de explicar.

- O que adere à barra não é a roupa, mas a pele. Quanto menor ela for, ganhamos com isso maior liberdade de movimento e aderência ao poste. Aliás, minha maior dificuldade como ex-ginasta é deixar a coisa ficar performática, sensual, o que conta pontos. Também preciso me pentear e maquiar adequadamente para competir.

Ela enfrentou problemas em casa, quando decidiu praticar o pole dance. Mas, curiosamente, vieram do pai e do namorado a força que ela necessitava para seguir em frente em sua jornada. Com apenas 25 anos, a atleta de apenas 1,60m já enfrenta uma lesão no quadril que ganhou nos treinamentos.

Todo o esforço de Rafaela ganha cada vez mais adeptas. A nutricionista Tabata Nogueira Panichel aceitou o convite de uma amiga para uma aula experimental, há dois anos. E nunca mais largou. E ela dá a dica para as mulheres: dores musculares e até celulite podem diminuir com o tempo de prática.

- Não gosto de academia, mas adoro dançar. E posso garantir, é viciante. Pratico duas vezes por semana e encaro hoje como meu esporte favorito. O pole dance traz benefícios ao corpo, como redução de medidas, peso e até de celulite. O atrito com a barra funciona quase como uma drenagem linfática. Além disso, eu tinha uma dor constante no joelho e percebi melhoras que podem ser atribuídas ao esporte. E quanto mais alto o nível dos exercícios, mais rápida fica a visualização dos resultados. Já indico para minhas pacientes.

Tabata concorda com as especialistas , quando o assunto é a moralização da modalidade.

- Tentamos a cada dia mostrar que o que fazemos é arte. Sim, é exótico, mas nem de longe é algo vulgar, nem uma especialidade de prostitutas de cassino. O pole é uma modalidade esportiva, e torcemos para que isso se transforme rapidamente.
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