Imprimir

Notícias / Carros & Motos

Consumidora fecha acordo com montadora após 'briga' na web

G1

Foram quatro anos de contenda e reclamações até que o ressarcimento chegasse para a consumidora catarinense Daniely de Andrade, 33 anos, que comprou em 2007 um Mégane Sedan 2.0, da Renault, que apresentou defeitos desde a aquisição.

O longo imbróglio terminou esta semana, quando a montadora se comprometeu a devolver o valor referente ao que foi pago pelo veículo, mais os danos sofridos pela advogada.

Embora ela já movesse há tempos uma ação na Justiça contra a Renault, a vitória só veio depois que ela recorreu à internet para dar voz ao seu problema: em fevereiro deste ano, criou o site “Meu Carro Falha”, dando detalhes sobre o caso; montou perfis no Twitter e no Facebook; e publicou vídeos relatando o seu caso no You Tube. (Para ver o site, clique aqui)

“Eu já tinha tentado de tudo quando veio a ideia de que nenhum lugar seria melhor para expor meu caso quanto a internet”, afirmou ao G1 Daniely no dia seguinte ao acordo, em que também conseguiu da montadora um carro extra para doar a uma entidade assistencial, em sinal de gratidão às mensagens de apoio que, conta, recebeu "de todo o Brasil".

Eu já tinha tentado de tudo quando veio a ideia de que nenhum lugar seria melhor para expor meu caso quanto a internet"DanielySatisfeita com o desfecho, ela não se incomoda nem com a fama virtual repentina. "O que me incomoda não é só o grito dos maus, é o silêncio dos inocentes. Não estou nem aí se teve uma exposição", diz ela, que pretende manter o site como espaço para reclamações de outros consumidores.

Faltou pouco, no entanto, para o barulho se tornar um “tiro no pé” da consumidora. A repercussão sobre o caso de Daniely foi tamanha que a Renault entrou com uma ação judicial – e ganhou – para obrigar Daniely a tirar do ar todas as críticas e relatos que denegriam a imagem da empresa. Decisão que, depois, foi reavaliada pela companhia, que preferiu buscar a conciliação em vez de exercer o direito concedido pela Justiça.

“A empresa reconhece que houve falhas em seus procedimentos internos e lamenta o acontecido”, disse a Renault em comunicado enviado por email ao G1, em que alega que, apesar da decisão judicial favorável à companhia, optou por não exercer o direito de retirar as queixas de Daniely do ar porque “sempre buscou uma solução conciliadora para o caso”.


Site criado por Danielly: briga terminou em acordo (Foto: Reprodução)O Procon acredita que é muito importante a utilização dessas ferramentas pelos consumidores, porque repercute em pouco tempo, multiplica a propagação e força a empresa a tomar uma decisão"Márcio MarcucciO assistente de direção do Procon – SP, Márcio Marcucci, diz que o episódio é um exemplo de como grande parte das empresas no Brasil ainda não sabe se relacionar com as redes sociais e as demandas dos consumidores. Ele enfatiza que a rede pode ser uma forte aliada do consumidor, desde que usada com sabedoria.

“O Procon acredita que é muito importante a utilização dessas ferramentas pelos consumidores, porque repercute em pouco tempo, multiplica a propagação e força a empresa a tomar uma decisão. As empresas que tentam inibir esse comportamento têm uma postura inadequada, que revela grande desconhecimento do potencial da internet”, afirmou Marcucci.

Outro caso emblemático sobre o poder de uma reclamação bem feita é o do músico canadense Dave Carroll, que garantiu seus direitos e ainda impulsionou sua carreira artística depois que compôs e produziu um videoclipe no You Tube para a música “United Breaks Guitars" (em português, United quebra violões), em que registrava sua insatisfação com os maus tratos que a companhia aérea dispensou à bagagem dele.

Abuso?
A pedido do G1, o técnico do Procon analisou outras decisões judiciais para dar dicas de como identificar a tênue linha que separa a reclamação legítima do comportamento que pode ser interpretado como calúnia e danos à imagem da empresa pela Justiça. "Essa fronteira não é muito clara, mas com base nas decisões passadas da Justiça a gente pode levantar algumas regras", diz Marcucci.

Foco no problema
"O consumidor tem o direito de expressar publicamente a sua frustração, sua insatisfação com algum fornecedor de produtos ou serviços, porque é garantido pela Constituição, e a manifestação pode ser feita no ambiente das redes sociais. Então é lícito ele criar comunidades no Orkut, fazer vídeos. Só não pode descambar para ofensa depreciativa de imagens de pessoas".

Como exemplo, ele cita um caso na Justiça em que o consumidor, insatisfeito com os serviços de uma academia de ginástica, passou a postar críticas sobre os frequentadores em uma comunidade virtual. "Começou a postar mensagens em que diziam que as pessoas eram 'metidas', 'nojentas'". Foi derrotado na Justiça, que entendeu que ele ultrapassou o limite aceitável e não se ateve à qualidade do serviço.

Ofensa contextualizada
Um consumidor insatisfeito do Rio Grande do Sul obteve decisão favorável da Justiça, mesmo depois usar termos ofensivos para se referir à atendente de uma escola de informática que o atendeu mal. Também criticou a validade do certificado de qualidade alardeado pela empresa. "Me deem sugestões de como responder para esse bicho burro", escreveu ele, de acordo com o processo. O ganho de causa foi justificado pelo juiz. "Como pode o consumidor conceber que a empresa que tem o certificado preste um atendimento aquém de suas expectativas?", relata o juiz no registro da ação.

"O importante é que sejam críticas relacionadas diretamente ao problema. E também não vi nenhuma vitória judicial para quem ofendeu com palavrões", diz Marcucci.

Para ele, o contato com a empresa e o uso das redes sociais são válidos e devem ser tentados antes de se recorrer ao Procon ou à Justiça. "É importante usar o Procon para tirar dúvidas sobre os direitos, e tentar sempre primeiro resolver com a empresa".
Imprimir