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Defensores do referendo sobre armas de 2005 criticam nova tentativa de plebiscito

Amanda Polato e Thiago Faria, do R7

Polêmica, a proposta de se fazer uma nova consulta sobre a venda de armas no Brasil tem recebido críticas até mesmo de quem defendeu a proibição do comércio em 2005, quando a população foi às urnas para opinar. O projeto foi apresentado nesta semana pelo senador José Sarney (PMDB-AP), após negociação com líderes partidários.

As armas voltaram à pauta do Congresso depois do massacre em uma escola de Realengo, no Rio de Janeiro, que deixou 12 crianças mortas. Para o ex-deputado Raul Jungmann, a proposta de consulta popular é “oportunista, um golpe”.

- O povo brasileiro foi ouvido, e é preciso respeitar essa opção, essa escolha. Você não pode, ao sabor do momento, de uma tragédia, desfazer o que foi escolhido pela maioria. [...] Mesmo mantendo minhas posições, de ser visceralmente contra as armas, tenho que respeitar a decisão da maioria.

Jungmann foi secretário executivo da Frente Parlamentar por um Brasil sem Armas, a chamada frente do “Sim”, que fez campanha, em 2005, para que brasileiros votassem a favor da proibição da venda de armas. Naquela época, a pergunta feita aos eleitores foi: "O comércio de armas de fogo e munição deve ser proibido no Brasil?"

A ONG (organização não governamental) Viva Rio, que também atuou em 2005 a favor do “Sim”, se posicionou agora contra um novo plebiscito. A entidade diz que continua sendo contra a proibição do comércio de armas e munições, uma das fontes que abastecem o mercado ilegal, mas que decidiu respeitar a decisão do referendo.

O coronel Ubiratan Angelo, coordenador do Programa de Segurança Humana da Viva Rio, diz que a maior preocupação agora deve ser a de restringir a facilidade com que se adquire armamento no Brasil, seja legal ou ilegal.

- A legislação [sobre armas] é muito boa, mas precisa ser colocada em prática. Ela estabelece regras sobre marcação e rastreamento das armas. O mais importante é que haja um banco de dados unificado sobre as armas e não dois sistemas que não se comunicam. O controle das armas e da munição deve ser melhor realizado.

Defensor da venda de armas no país, o deputado federal Onyx Lorenzoni (DEM-RS) cita os custos de uma nova consulta como argumento para arquivar o projeto de Sarney.

O Brasil gastou R$ 600 milhões para fazer um referendo em 2005, um novo vai ter um custo maior ainda. Aumentou a população. Por que não pega esse dinheiro e aplica no combate da criminalidade?

Em outubro de 2005, quase 100 milhões de brasileiros foram às urnas para decidir sobre a validade de um artigo no Estatuto do Desarmamento que proibia o comércio de armas. Cerca de 64% da população votou contra a medida.

Na época, duas frentes parlamentares foram montadas para fazer campanha pelo “Sim” ou pelo “Não”. A frente do “Sim” - por um Brasil sem Armas - teve apoio de organizações não governamentais, de sindicatos e entidades de classe, como MST (Movimento dos Sem Terra) e Movimento Nacional de Direitos Humanos. Do lado do “não”, da Frente pelo Direito à Legítima Defesa, estiveram entidades como a Aspom (Associação dos Policiais Militares do Brasil) e a UDR (União Democrática Ruralista).

Muitos partidos políticos não tinham posição oficial, caso do PV, PSDB, PMDB e PFL (atual DEM). Entre os que disseram ser a favor da proibição da venda de armas, estavam o PT, PPS e PCdoB. Já o PSTU se declarou contrário à proibição.

O referendo aproximou políticos de ideologias diferentes. Tanto políticos de esquerda (PSTU) quanto do PFL defenderam o “não”. O então prefeito de São Paulo, José Serra (PSDB), defendeu o “sim”, assim como então presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, apesar de o petista ter evitado falar sobre seu voto na reta final.

O principal argumento usado pela campanha do “Não” foi a defesa do direito à escolha e à liberdade. Em propagandas, o grupo chegou a citar a luta de Nelson Mandela na África, para destacar a importância da defesa da liberdade. O fato provocou reações dos advogados de Mandela, que não gostou do uso de sua imagem.

Um argumento que teve força na campanha do “Não” foi a ineficácia do Estado em proteger os cidadãos, o que levou analistas a dizerem, na época, que muita gente pode ter votado contra a proibição da venda de armas em “protesto” contra o governo.

A campanha do “Sim” defendeu a ideia de que o armamento da população apenas contribui para aumentar a violência. Segundo ele, armas em casa de gente comum são facilmente roubadas, aumentando a quantidade de ilegais em circulação. As propagandas do “Sim” contaram com celebridades como Camila Pitanga e Chico Buarque e atacaram os interesses das indústrias de armas.
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