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Nem todo cantor quer ser solista', dizem backing vocals consagradas

G1

Em comum, a educação musical familiar, o autodidatismo e nenhuma ambição ou desejo em fazer carreira solo. Para Ana Lima, ex-backing vocal de Fernanda Abreu e Gabriel Pensador, Rita Kfouri, backing de Rita Lee, e Jurema, segunda voz de Roberto Carlos há 11 anos, cantar não significa brilhar sozinha: é endossar o coro musical.

Elas nunca quiseram ocupar o ponto central dos palcos. Embora tenham feito trajetórias diferentes, as três são backing vocals por opção. “Sempre me senti como um instrumento musical na banda. Nunca fui sombra do Gabriel”, afirma Ana Lima.

Durante oito anos ela foi a única voz feminina da banda do ex-marido. A parceria aconteceu por acaso, muito antes dos dois se casarem. Ana tinha feito uma temporada de shows como backing de Fernanda Abreu. Cantava, inicialmente, para custear os cursos de teatro que fazia - hoje trabalha como atriz. Sua última novela foi "Araguaia", na TV Globo.

“Sempre quis ser atriz, mas a música teve um caminho importante na minha formação. Comecei com a Fernanda e logo depois veio a proposta do Gabriel. Foi uma época espetacular.”

Na corte do Rei
Até conquistar o microfone cativo na equipe de Roberto Carlos, Jurema, hoje com 52, gastou o gogó. Desde 2001 faz parte da equipe de músicos que trabalha para o Rei. Apesar a assiduidade nos shows, não tem contrato exclusivo. Pauta os demais trabalhos de acordo com a agenda de Roberto, mas canta com quem a contrata. Ganha por apresentação, ou gravação.

“Fazer voz de apoio nunca foi um atalho. Eu não quis esse trampolim. Deixe-me quieta cantando com quem eu quiser”, diz Jurema. A brincadeira começou aos 13 anos, ao lado da irmã, como crooner. Nasceu e cresceu em Jacareí (SP), e fazia pequenos “bicos” em shows quando ia ao Rio de Janeiro para passar as férias.

“Era uma garota e cantava com a Lucinha Lins e o Emilio Santiago. Não era criança, já tinha uma voz madura, já cantava bem.“

Em tempos áureos da MPB e bossa nova, Jurema foi coringa dos palcos. Trabalhou com Tim Maia, Pepeu Gomes, Maria Bethânia. Nessa época, já tinha se mudado para o Rio de Janeiro, após uma temporada residindo em Manaus. “Era um período de efervescência cultural. Tinha muito trabalho, shows, gravação de CDS, jingles. E tudo acontecia no Rio.”

Apesar do currículo estelar, ela queria mais: ressente não ter feito parte da banda da cantora Cássia Eller. “Participei de apenas alguns shows, mas queria mais. Ela é fantástica, a nossa Janes Joplin brasileira.”

Para Jurema, seu trabalho confere personalidade à música. “O coral acrescenta, engrandece o a voz do artista. Testamos nossa capacidade vocal em cada novo trabalho, é sempre um desafio, uma descoberta.”

Versatilidade
Com Pepeu Gomes, parceria que durou 12 anos, a satisfação era plena. Jurema sentia como se fosse a versão feminina do cantor. “Era uma sintonia perfeita, fazíamos muitos duos, foi um tempo muito gratificante.” Ao lado de Roberto, diz se emocionar até hoje no início dos shows, ao solar junto com outros dois colegas a música “Como é grande o meu amor por você.” “Cantamos os três antes dele entrar no palco. É muito bonito.”

O ofício, porém, exige versatilidade e desapego. É preciso ser camaleão e, fora de casa, não é permitido ter gosto musical. Jurema flanou pela nata da MPB, mas não dispensou trabalhosmenos glamourosos.

“Backing precisa de ouvido, musicalidade, disposição pra saber cantar qualquer tipo de música. Já cantei até Gretchen e Kelly Key. O trabalho aparece, é preciso aceitar.”

Para não depender apenas da sazonalidade do mercado fonográfico, ela montou, juntamente com o cunhado, que é maestro de Maria Bethânia, a panificadora "Canto do Pão" - o nome tem uma explicação menos óbvia do que parece: "Quando o pão sai do forno você escuta ele cantar. Os franceses chamam isso de canto do pão."

Dessa forma, abastece as padarias do Rio e as casas dos músicos e colegas (Roberto Carlos, segundo ela, adora) com delícias artesanais. "Não pretendo parar de cantar nunca, mas não da pra viver só de música. É uma vida de altos e baixos."

Harmony Cats
Rita Kfouri também tem alta quilometragem no meio musical. Gravou discos, jingles políticos e publicitários, e assumiu há cinco anos um dos dois microfones de backing vocal da cantora Rita Lee.

A parceria com a xará é de longa data. Rita fez parte da banda pela primeira vez em 1979. Entrou pra cantar em alguns shows, mas acabou ficando ate 1982. Em 2007, reencontrou a rainha do rock e retomou os trabalhos, encerrando a participação no show polêmico próximo a cidade de Aracaju, em Sergipe. “Foi uma época deliciosa. A gente vira uma família. É difícil quebrar esse vínculo.“

Kfouri começou cantando em grupos de baile. Fazia festas e casamentos para aproveitar o talento involuntário. Conciliou durante anos a banda com os estudos. Fez faculdade de letras, mas nunca voltou à universidade para buscar o diploma.

Nos anos 80, era constantemente chamada para gravar musicas em estúdio. “Entrava no estúdio 8 da manhã e saia meia-noite. Gravava de tudo, era uma época quentíssima de venda de disco.”

A demanda caiu nas graças de um produtor musical que reuniu Rita e outras quatro backing vocals para formar o grupo Harmony Cats. Cinco mulheres bonitas cantavam e dançavam em programas de televisão. Elas eram uma espécie de Frenéticas paulistas. “No Rio eram as Frenéticas fazendo sucesso, em São Paulo, nós.”

Embora a voz potente tenha feito sucesso em terras tupiniquins, Rita gosta é de cantar ritmos americanos. Foi feliz ao lado de Rita Lee, quase cantou com Elis Regina, mas se pudesse, teria arrumado as malas pra estudar canto nos EUA. “Eu queria mesmo era ter sido backing do Stevie Wonder.”

Sustento sertanejo
Hoje, lamenta a queda de produção e qualidade do mercado nacional. Os jingles, em décadas passadas, para ela, eram criativos e gratificantes. Segue freelando como segunda voz, ajuda a produzir os shows do marido, o baixista Celso Pixinga, e revela que em São Paulo, é a indústria sertaneja que alimenta o cachê dos músicos informais.

“Ninguém mais faz disco, sai em turnê na velocidade de antigamente. Fomos diretamente afetados. É o sertanejo que segura."

A cantora Roberta Sá, contemplada no edital da Natura de 2012, explica que é muito caro, atualmente, conseguir montar uma estrutura de show completa para seguir em turnê. "Sem apoio ou patrocínio, backing vocals e músicos de sopro são sempre os primeiros a serem cortados."

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