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Dona Zuleika, aos 98 anos, lembra os Fla-Flus do início do século: “Sempre tinha briga”

Extra

O verde, o branco e o grená que imperam na decoração da sala de estar dão a pista. O endereço da casa também é sugestivo: Rua Coelho Netto, em Laranjeiras, de cara para o Fluminense Football Club. O sobrenome dá o veredito: não por coincidência, é o mesmo que batiza a rua, Coelho Netto e também o mesmo de João, o atleta que, sob o apelido de Preguinho, virou lenda ao ganhar 357 medalhas em dez modalidades pelo Fluminense e marcar o primeiro gol da Seleção Brasileira em Copas do Mundo. Dona Zuleika Coelho Netto é tricolor de coração. E de corpo e alma também.

Tanto que quando ouve o nome do clube que se confunde com a história de seus 98 anos de vida, já enche os olhos e embarga a voz.

— Eu me perco quando falo do Fluminense — se entrega a senhora, que foi casada com Paulo, irmão mais velho de Preguinho.

Por ter sido testemunha ocular de quase todos os Fla-Flus da história, Zuleika é fonte confiável quando o assunto é o clássico mais tradicional do Rio, que completa 100 anos em 2012.

— Sempre tinha briga. Laranjeiras ficava lotada. Todos se arrumavam com roupas bonitas para ver o Fluminense jogar e acaba-

vam na pancadaria dentro do gramado — conta Zuleika que, entretanto, fecha a cara quando ouve o nome do rival — Flamengo? Não fala esse nome que a nossa conversa fica ruim!

Mesmo preferindo a elegância da época de Preguinho aos “pontapés dos tempos de hoje”, Zuleika acompanhou

por todo século os altos e baixos do tricolor. Hoje, dona Zuleika não vai ver o Fla-Flu. Há dez anos, os médicos proibiram a senhora de ver as partidas. O motivo: ela ficava nervosa e, constantemente, acabava no hospital nos dias de jogos. Coisas do coração.

Uma família em três cores

“Eu nem sabia falar direito e o Fluminense já estava inteiro em minha alma, em meu coração e em meu corpo”. A frase não é de Zuleika, e sim de Preguinho, irmão de seu marido, mas se encaixaria na trajetória da senhora.

Nascida em Vassouras, município do Sul Fluminense, filha de fazendeiros da região, Zuleika já torcia pelo time das Laranjeiras antes de se mudar para o Rio. Mas foi com a mudança para o bairro das Laranjeiras que começou a acompanhar o clube. O envolvimento aumentou quando conheceu Paulo Coelho Netto e entrou para a lendária família tricolor.

— Eram sete irmãos e todos eram fanáticos pelo Fluminense, assim como o pai, o escritor Henrique — conta.

Henrique foi ninguém menos do que o poeta Coelho Netto, fundador da cadeira 2 da Academia Brasileira de Letras. Todos os seus filhos — quatro homens e três mulheres — se envolveram com o clube, como torcedores ou como atletas, incentivados pelo pai.

Emmanuel, o mais velho, virou jogador de futebol e participou do tricampeonato carioca de 1917 a 1919, mas morreu por conta de uma ferida adquirida em campo, aos 24 anos. Preguinho ganhou títulos em dez modalidades e virou lenda do esporte brasileiro. Já Paulo, marido de Zuleika, não tinha muito jeito para a bola: historiador e poeta, escreveu o livro “História do Fluminense”.

Mesmo com toda a fidelidade ao Tricolor, há espaço para um flamenguista na família. Gabriela, neta de Zuleika, é Fla, para desgosto da avó, que descobriu durante a entrevista:

— Ela é Flamengo? Tenha a santa paciência!


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