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Fala de Valério 'não tem significado' e não abala Lula, diz ministro da Justiça

G1

O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, disse nesta quarta-feira (12) que o depoimento de Marcos Valério que aponta o elo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva com o esquema do mensalão "não tem significado" e foi feito para "tumultuar".

Ainda para Cardozo, a população confia em Lula e as declarações não abalam a credibilidade do ex-presidente.

"Conheço o presidente Lula. Ele tem trajetória no Brasil reconhecida pela população brasileira. Ele foi o grande presidente da nossa história. E tenho absoluta certeza que situações dessa natureza, na medida em que são inverdades - e eu confio no presidente Lula e a maioria da população confia -, ele naturalmente não está abalado. O Lula é um guerreiro, é um lutador e tenho certeza que ele sabe que situação dessa natureza jamais fará com que os brasileiros deixem de reconhecer o importante papel na história", disse Cardozo.

Marcos Valério, apontado como operador do mensalão e condenado a mais de 40 anos de prisão pelo Supremo Tribunal Federal (STF), disse, em depoimento à Procuradoria Geral da República (PGR) prestado em setembro, que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva autorizou empréstimos dos bancos Rural e BMG para o PT com objetivo de viabilizar o esquema, segundo reportagem na edição desta terça-feira (11) do jornal "O Estado de S. Paulo".

Cardozo falou sobre o assunto após lançamento da Escola Nacional de Mediação e Conciliação (Enam), na sede do Ministério da Justiça, em Brasília.

Perguntado sobre se a Polícia Federal poderia investigar os fatos, o ministro disse: "É muito importante observar que do ponto de vista jurídico, isoladamente, esse depoimento não tem nenhum significado. É peça produzida por uma pessoa que já estava processada e condenada em um julgamento e feita visivelmente na tentativa de ou tumultuar esse processo ou negociar uma redução de sua pena."

Ainda conforme o ministro, o Ministério Público é quem tem que avaliar se usará o depoimento de Valério e não a Polícia Federal. "O que vai ser feito é decisão do Ministério Público. Se irá solicitar abertura de inquérito, arquivamento, é decisão da Procuradoria Geral da República onde o depoimento foi prestado."

O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, também compareceu ao evento no Ministério da Justiça, mas saiu sem falar com jornalistas. Ele disse na terça (11) que só falará sobre o tema após o fim do julgamento do processo do mensalão pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

O Supremo pode concluir o julgamento nesta semana ou na próxima, após decidir sobre cassações de mandatos, multas e prisão imediata aos 25 condenados.

O ministro da Justiça afirmou também que o depoimento de Valério foi isolado, sem apresentação de provas. "Um depoimento que é apresentado sem provas, por si só, por uma pessoa envolvida em atividades criminosas não tem significado jurídico efetivo. A não ser que se prove que o que ele falou é verdadeiro. E parece que não foram juntadas provas que pudessem dar credibilidade ao depoimento."

Oposição
Segundo o ministro da Justiça, a oposição tem usado a denúncia por não ter propostas concretas para o país.

"Do ponto vista jurídico, parece claro. Sozinho, esse depoimento não tem nenhum significado. Do ponto de vista político, é claro, é natural que esse debate se coloque. Setores da oposição que até agora não têm nenhum discurso muito claro em relação á proposta para o país, vão se utilizar disso para tentar aplicar sua retórica política."

"Mentiras"
Em viagem a Paris, onde participou na terça de um evento bilateral entre Brasil e França, o ex-presidente Lula não quis comentar as acusações feitas por Marcos Valério. "Não posso acreditar em mentiras", disse Lula após a abertura do Fórum pelo Progresso Social, conferência organizada pelo Instituto Lula e pela fundação francesa Jean Jaurès.

Durante os quatro meses de julgamento, o Supremo concluiu que o mensalão foi um esquema articulado de uso de recursos públicos e privados para pagamento a parlamentares em troca da aprovação no Congresso de projetos de interesse do governo Lula.

Foram condenados 25 dos 37 réus. Segundo a denúncia da Procuradoria Geral da República, o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, condenado a 10 anos e 10 meses de prisão, foi o "chefe" do esquema, o que ele nega. (veja 10 conclusões do STF sobre o caso.)

"O Estado S. Paulo" informa que teve acesso às 13 páginas do depoimento de três horas e meia dado por Marcos Valério no último dia 24 de setembro. De acordo com o texto, Valério procurou voluntariamente a Procuradoria-Geral após ter sido condenado pelo STF pelos crimes de formação de quadrilha, corrupção ativa, peculato, lavagem de dinheiro e evasão de divisas. Em troca do novo depoimento e de mais informações sobre o esquema de desvio de dinheiro público para o PT, Valério pretendia obter proteção e redução de sua pena.

Segundo o jornal, o depoimento é assinado pelo advogado do empresário, o criminalista Marcelo Leonardo, pela subprocuradora da República Cláudia Sampaio e pela procuradora da República Raquel Branquinho.

O jornal informa que, aos procuradores, Marcos Valério disse que esteve com o então presidente Lula no Palácio do Planalto, acompanhado do então ministro da Casa Civil José Dirceu, sem precisar a data, e afirmou que Lula deu "ok" aos empréstimos do Banco Rural e do BMG para o PT. Valério também disse no depoimento, ainda segundo o "Estado de São Paulo", que repassou R$ 100 mil para despesas pessoais de Lula, por meio da empresa Caso, de Freud Godoy, então assessor da Presidência da República.

A CPI dos Correios, conhecida como CPI do Mensalão, comprovou recebimento de depósito de R$ 98,5 mil de Marcos Valério para a empresa Caso, segundo a reportagem do jornal. Ao investigar o mensalão, a CPI dos Correios detectou, em 2005, um pagamento feito pela SMPB, a agência de publicidade de Valério, à empresa de Godoy. O depósito foi feito, segundo dados do sigilo quebrado pela comissão, em 21 de janeiro de 2003.

A reportagem do jornal afirma ainda que, no depoimento, Marcos Valério disse que o então presidente Lula e o então ministro da Economia, Antônio Palocci, fizeram gestões junto à Portugal Telecom para que a empresa repassasse R$ 7 milhões ao PT. Esses recursos teriam sido enviados por empresas fornecedoras da companhia, por meio de publicitários que prestavam serviço ao PT.

Segundo a reportagem do jornal, as negociações com a Portugal Telecom estariam por trás da viagem a Portugal, em 2005, de Valério, seu ex-advogado Rogério Tolentino e o ex-secretário do PTB Emerson Palmieri.

Ainda de acordo com a reportagem, Marcos Valério acusou outros políticos de terem sido beneficiados pelo chamado valerioduto, entre eles o senador Humberto Costa (PT-PE). Ao G1, Costa negou que tenha se beneficiado do esquema.

A publicação relata ainda que Marcos Valério disse ter sido ameaçado de morte por Paulo Okamotto, atual diretor do Instituto Lula e amigo do ex-presidente. "Se abrisse a boca, morreria", disse o empresário no depoimento à Procuradoria-Geral da República. "Tem gente no PT que acha que a gente devia matar você", teria dito Okamotto a Valério, em encontro num hotel em Brasília, em data não informada pelo depoente, segundo o jornal.

O ex-ministro da Casa Civil e da Fazenda Antonio Palocci, que, segundo Valério, teria participado de uma reunião no Palácio do Planalto na qual Lula teria acertado com o então presidente da Portugal Telecom Miguel Horta o repasse de recursos para o PT, negou as declarações do operador do mensalão. Por meio de sua assessoria, Palocci disse que os fatos relatados por Valério "jamais existiram".

Citado no depoimento de Marcos Valério à Procuradoria-Geral da República, o ex-presidente da Portugal Telecom Miguel Horta declarou, por meio de nota, que ele não teve “qualquer ligação” com o processo do mensalão. Segundo o empresário, “essa é uma questão de política interna brasileira” à qual ele é totalmente "alheio".

O advogado do ex-chefe da Casa Civil José Dirceu, José Luís Oliveira Lima, afirmou nesta terça (11), por meio de nota, que seu cliente “jamais” se reuniu no Palácio do Planalto com Marcos Valério, com o ex-presidente Lula e com o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares.

O dirigente do Instituto Lula Paulo Okamotto declarou nesta terça, em Paris, ter interpretado as declarações do suposto operador do mensalão como uma tentativa de reduzir sua pena no processo do mensalão.

Procurada pelo G1, a assessorias do Banco Rural informou que avalia se divulgará nota sobre a reportagem. A do BMG informou que o banco não irá se pronunciar.

O advogado de Marcos Valério, Marcelo Leonardo, não confirmou se o cliente deu o depoimento.

As demais pessoas mencionadas pela reportagem do "Estado de São Paulo" negaram as declarações.
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