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Leite é 'maquiado' por indústrias do RS, afirma subprocurador do MP

G1

 O subprocurador do Ministério Público do Rio Grande do Sul, Marcelo Dornelles, afirmou em coletiva de imprensa nesta quinta-feira (8) em Estrela que as indústrias de laticínios maquiam o leite que já chega adulterado. A quinta etapa da Operação Leite Compensado, deflagrada nesta manhã no Vale do Taquari, prendeu três pessoas, entre elas dois empresários. Segundo o MP, esta etapa engloba toda a cadeia de produção.

"A indústria continua recebendo leite adulterado e maquiando o produto, e agora dois empresários de indústrias foram presos. Não podemos permitir que as pessoas continuem consumindo produtos de baixa qualidade. O Ministério Público será implacável", afirmou Dornelles. A operação foi desencadeada em 10 cidades do Vale do Taquari e do Vale do Sinos.

Otimista com o resultado da operação, Dornelles disse que o órgão "deu um passo para a frente" ao prender empresários de indústrias. A ação ocorre exatamente um ano depois do início da ofensiva contra o esquema. Os alvos são as indústrias de laticínios Pavlat, cujo proprietário, Ércio Vanor Klein, foi preso, e Hollmann, que teve presos o dono, Sérgio Seewald, e o funcionário responsável pela política leiteira, Jonatas William Krombauer. Todos são suspeitos de acrescentar ao leite substâncias como soda cáustica e água oxigenada. Eles foram encaminhados à delegacia, e depois seriam levados ao presídio de Lajeado, na região.

O G1 entrou em contato com a assessoria da Pavlat, em Paverama, que disse que está colhendo informações com os integrantes do MP e do Ministério da Agricultura presentes no local sobre o caso e divulgará nas próximas horas uma nota para a imprensa. Já a indústria Hollmann, em Imigrante, preferiu não se manifestar por enquanto. O advogado de Sérgio Seewald disse ao G1 que se manifestará apenas pela tarde. Já o colaborador Jonatas, ao ser preso, negou a fraude. "Aqui nunca adulteramos leite", afirmou à imprensa.

Mais cedo, Mauro Rockenbach, da área Especializada Criminal do Ministério Público do Rio Grande do Sul, afirmou que a solução para que as adulterações de leite cessem é a regulamentação da indústria de laticínios. Ele coordenou a operação junto com Alcindo Bastos da Silva Filho, da Especializada de Defesa do Consumidor. Segundo Rockenbach, a formalização dos processos não é discutida no sindicato da categoria.

"Sinalizo há horas para o sindicato para fazermos um grande termo de conduta e responsabilidade, credenciando laboratórios, com mais rigor na matéria-prima e na escolha de transportadores. Só que nós não temos disposição das indústrias nesse sentido", apontou Rockenbach em entrevista à Rádio Gaúcha.

“Percebemos que este pessoal que transportava o leite de uma forma ou de outra ajustava esse leite. Eles levavam a matéria-prima até a indústria, e havia uma cumplicidade entre as indústrias e os transportadores”, disse o promotor Mauro Rockenbach, da Especializada Criminal do MP, que coordenou a ação junto com Alcindo Bastos da Silva Filho, da Especializada de Defesa do Consumidor.

Segundo o Ministério Público, as indústrias compravam leite deteriorado de transportadores por um preço mais baixo. Como as empresas de laticínios têm obrigação de possuir laboratórios semelhantes aos usados nos testes do Mapa, sabem se o produto se enquadra nas normas ou não. “A indústria identifica uma carga de baixa qualidade porque sabe que vai pagar menos”, diz o promotor.

De acordo com o MP, a acidez resultante do estado de decomposição era neutralizada com o uso de citrato, soda cáustica, bicarbonato de sódio e água oxigenada (peróxido de hidrogênio). As indústrias também utilizavam amido após diluir o leite na água, para disfarçar o aspecto aguado.

O leite adulterado era diluído, o que dificultava a detecção em testes de qualidade. O objetivo era lucrar mais com o produto. “Um leite que custava em média R$ 1 perdia valor e era comprado por R$ 0,30. Aí era adulterado, ia para o silo, era diluído e passava a valer R$ 1 novamente no mercado”, exemplificou o promotor.

As investigações começaram em agosto do ano passado. Ao examinar notas fiscais de compras realizadas por transportadores de leite, o MP constatou que desde 2009 havia ureia entre os produtos comprados. No entanto, os transportadores pararam de adquirir o produto depois de maio do ano passado, quando foi deflagrada a primeira etapa da Leite Compensado. Desde então, soda cáustica e cal começaram a figurar entre os produtos comprados por suspeitos de adulterar o leite.

“Envenenamento em massa”, diz juíza
Os mandados de busca e apreensão e de prisão foram deferidos pela juíza Patricia Stelmar Neto, de Teutônia. Após ter acesso ao resultado da investigação, a magistrada escreveu na decisão que os três suspeitos “eram sabedores do que estavam fazendo”, e considerou o crime “hediondo”. “Trata-se, na concepção deste juízo, de um envenenamento em massa, beirando ao genocídio contra os consumidores de leite e seus derivados”, diz trecho do texto obtido pelo G1.
“A saúde pública é vilipendiada”, destaca a juíza, que diz duvidar que o leite adulterado era consumido pelos suspeitos e seus familiares. “A dimensão danosa da conduta dos investigados é imensurável, já que ataca a própria saúde, boa-fé e dignidade do ser humano. Paulatinamente, os investigados estão a envenenar a população”, acrescentou.

Entenda o caso

A Operação Leite Compensado, do Ministério Público, teve sua primeira fase desencadeada em 8 de maio do ano passado. As investigações apontaram para um esquema que adulterou cerca de 100 milhões de litros do produto no estado. Na ocasião, o MP revelou que transportadores estavam adicionando água e ureia (que contém formol) ao leite crú para aumentar o volume e disfarçar a perda nutricional no caminho entre a propriedade rural e a indústria. O esquema era realizado em postos de resfriamento.

Na primeira fase, foram identificadas fraudes nos municípios de Guaporé, Horizontina e Ibirubá. Quinze pessoas foram denunciadas pelo Ministério Público e oito foram presas. Destas, quatro estão em liberdade. Seis pessoas foram condenadas pela Comarca de Ibirubá. A sentença foi proferida pelo juiz Ralph Moraes Langanke em dezembro de 2013.

Os condenados são: Paulo César Chiesa (dois anos e um mês de reclusão em regime semiaberto), João Irio Marx (nove anos e sete meses de reclusão em regime fechado), Angélica Caponi Marx (nove anos e sete meses de reclusão em regime fechado), Alexandre Caponi (nove anos, três meses e 12 dias de reclusão em regime fechado), João Cristiano Pranke Marx (18 anos e seis meses de reclusão em regime fechado) e Daniel Riet Villanova (onze anos e sete meses de reclusão em regime fechado).

A segunda fase da Operação Leite Compensado foi deflagrada em 22 de maio do ano passado nos municípios de Ronda Alta e Boa Vista do Buricá. Quatro pessoas foram presas e seis foram denunciadas pelo MP. Dessas, três estão em liberdade. O processo ainda está em andamento e ninguém foi condenado. Já a terceira etapa foi realizada em 7 de novembro de 2013 no município de Três de Maio. Quatro pessoas foram denunciadas. Ninguém foi preso.
A quarta fase foi desencadeada 14 de março deste ano nas cidades de Condor, Panambi,Tupanciretã, Bossoroca, Capão do Cipó, Vitória das Missões, Ijuí e Santo Augusto. Até agora, uma pessoa foi denunciada. O processo ainda está em andamento.

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