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'Toque de recolher' gera polêmica na Praça São Salvador, no Rio de Janeiro

O Globo

 O movimento dos bares, que já era motivo de reclamação para os moradores do entorno da Praça São Salvador, em Laranjeiras, aumentou em época de Copa do Mundo. Em meio à agitação, a vereadora Leila do Flamengo (PMDB) enviou à prefeitura proposta de criação de um decreto para obrigar os bares a fechar até 1h, como informou a coluna Gente Boa. A ideia é seguir o que já acontece no Baixo Gávea.

Na noite de terça-feira passada, véspera de feriado, os bares tiveram grande movimento. E, na página da Praça São Salvador criada no Facebook, foi grande o número de reclamações. Num dos posts, um morador disse: “Três noites seguidas de barulho e falta de respeito. Não é legal. Esperamos que os organizadores do debate e do forró garantam que não vamos para uma quarta noite sem dormir”.

A atitude da vereadora teria sido motivada por reclamações de moradores do entorno da praça. Leila acredita que o decreto é a única forma de ordenar a área:

— Os moradores não suportam mais. A cada madrugada é uma festa. Os bares terão que se adaptar, e vai ser preciso muita fiscalização. Mesmo depois do fechamento dos bares, os ambulantes vendem bebidas, e as pessoas permanecem no local.

O subsecretário da Ordem Pública, Marcelo Maywald, filho da vereadora, disse que a proposta está em fase de análise para elaboração do decreto. Segundo ele, é grande o número de reclamações feitas ao 1746 e também diretamente à Secretaria da Ordem Pública (Seop):

— Já fazemos o trabalho de ordenamento na São Salvador, mas não tem sido suficiente. Acho que o decreto para que os bares fechem à 1h é a solução, mas é preciso que os agentes atuem para impedir a ação dos ambulantes. Com bares fechados e sem venda de bebida, os frequentadores vão se dispersar.

VENDEDORES AMBULANTES

Para donos dos bares, no entanto, essa espécie de toque de recolher prejudicará as vendas e não resolverá o problema.

— Entre domingo e terça, o movimento é fraco, daria para fechar à 1h, mas, a partir de quarta, por causa das transmissões dos jogos de futebol na TV, seria um prejuízo grande fechar a essa hora. Acredito que perderíamos entre 35% e 40% do faturamento. Além disso, não são os bares que fazem barulho. O ruído é da praça — argumenta João Paulo Freire, sócio do Bar Casa Brasil.

Dono de outro bar no local, o Caneco 85, André Dias estranha que a determinação esteja sendo discutida agora. Segundo ele, a Seop já obriga os bares a fechar à 1h.

— Há mais de um ano a Seop passa aqui todo dia e manda fechar a essa hora. Não sei por que a vereadora está encrencando com isso agora. Normalmente a gente tem que pedir para os clientes pagarem a conta e fechar as portas. Só que isso não resolve o barulho: fecho a casa, mas a praça continua cheia, com todo mundo comprando bebida dos ambulantes. Poderíamos chegar a um meio-termo. De domingo a quinta, fecharíamos à 1h. Sexta e sábado, às 2h. Ficaria bom para todo mundo — sugeriu André.

A proposta da vereadora também divide opiniões entre os frequentadores do local. Para o analista de sistemas Leandro Custódio, 1h seria um horário razoável para fechar os bares.

— Acho justo. Aqui é um ambiente residencial, e, vendo o lado dos moradores, deve ser difícil mesmo conviver com o barulho. Mas também acho que essa determinação não vai resolver o problema. Mesmo que os bares fechem, as pessoas vão continuar se divertindo na praça — disse.

REJEIÇÃO CONTRA GRADES

Para o professor Gabriel Combalia, o local vive um processo de mudança natural que deve ser respeitado, e é preciso se adaptar às características da região.

— Quando a prefeitura constrói um viaduto, uma estrada, transforma o entorno e prejudica muito os moradores desses lugares. Nem por isso derruba-se o viaduto. Aqui, é a mesma coisa, mas a mudança foi para melhor. Há alguns anos, era um lugar perigoso, os assaltos eram constantes — avaliou o professor. — Hoje, é um dos pontos mais vivos da cidade. Tem atividades diurnas, como feira de artesanato e música no coreto, e noturnas. A prefeitura deveria legalizar o trabalho dos ambulantes, fazer um cadastro e regulamentar a atividade.

Para o farmacêutico Fábio Barros, se os bares fecharem à 1h, a desordem tomará conta do local:

— Os bares oferecem estrutura: lugar para ir ao banheiro, comer. Quando fecham, as pessoas permanecem na praça, mas a banca de jornais vira banheiro, a árvore vira mictório. Hoje a praça é muito bem ordenada. Há guardas municipais, lixeiras para recolher latas e garrafas. E é a cara do Rio, gente se divertindo ao ar livre e gastando pouco.

Morador de um prédio junto à praça, Orni Rodrigues reclama do barulho e acha que a mudança pode ser válida:

— Se for resolver, acho bom. Não é só o barulho das pessoas que incomoda, há também o ruído dos bares, de funcionários arrastando barris de cerveja, das cozinhas e outras coisas.

Leila do Flamengo defende ainda o gradeamento da praça. Ela encaminhou à prefeitura ofício pedindo o cercamento do espaço para evitar a realização de eventos durante a semana. Contrários ao gradeamento, moradores e frequentadores criaram no Facebook a página “Eu não quero grade na São Salvador”.

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