Imprimir

Notícias / Brasil

Linchamento de dona de casa no Guarujá está ainda longe da punição

O Gobo

 A morte brutal da dona de casa Fabiane Maria de Jesus, de 33 anos, linchada por dezenas de pessoas no Guarujá, no litoral paulista, em maio, produziu respostas tímidas do poder público e do Judiciário. Cinco acusados pelo crime estão presos, mas só devem ser julgados no fim de deste ano. Os donos do site que divulgou o retrato falado de uma suposta criminosa, com quem Fabiane foi confundida antes de ser morta, não foram sequer indiciados, e a criação de uma lei que propõe punição para quem usa a internet para incitar crimes não avançou no Congresso.

Confundida com uma mulher acusada de sequestrar crianças nas ruas do Guarujá para fazer rituais de magia negra em 3 de maio, Fabiane foi agredida a socos e pontapés em frente a um mercado no bairro Morrinhos, perto de onde morava. Ela foi arrastada por cerca de 100 metros e atingida na cabeça por um pedaço de madeira e pelo pneu de uma bicicleta, embora dissesse que era inocente. Depois da surra, a mulher foi jogada em um córrego. A dona de casa ainda ficou internada por um dia até que tivesse morte decretada.

A divulgação de vídeos do linchamento na internet ajudou a polícia a identificar cinco homens, que estão presos desde a semana seguinte ao crime. O Ministério Público ofereceu denúncia contra os acusados em 30 de maio, mas a Justiça ainda não decidiu quando eles serão levados a júri popular. Segundo o advogado Airton Sinto, que representa a família de Fabiane, o julgamento deve acontecer em outubro ou novembro de 2015. Duas mulheres devem responder por “incitação ao crime”, que prevê seis meses de detenção.

— Infelizmente, por total falta de uma legislação específica, não foi possível colocar o dono da página que divulgou o retrato falado que levou à morte de Fabiane no indiciamento — contou Sinto. — Mas há um efeito didático nessa história. O site parou de divulgar notícias e, no Guarujá, as pessoas estão tomando mais cuidado ao divulgar informações sensacionalistas, como a que causou a morte da Fabiane.

IMAGEM ERA DE 2011

Moradores do bairro Morrinhos confundiram Fabiane com um retrato falado divulgado pelo Facebook do site Guarujá Alerta. O perfil era acessado por muitas pessoas, e a imagem foi compartilhada por celular. Descobriu-se depois que a foto, na verdade, havia sido feita por policiais civis do Rio de Janeiro em 2011. Além disso, a notícia era falsa. Na época do crime, não havia, nas delegacias do Guarujá, nenhum registro de criança sequestrada na rua.

O advogado Airton Sinto acredita que o responsável por divulgar o texto e a foto poderia ser responsabilizado se houvesse uma lei específica para esse assunto. A família da dona de casa defende a aprovação da chamada Lei Fabiane de Jesus, que prevê detenção de até seis meses para quem “publicar, por meio de rede social ou de qualquer veículo de comunicação virtual, conteúdo que incite a prática de crime ou de violência à pessoa”. Se houver morte, o responsável pela publicação responderá por homicídio.

O projeto de lei 7.544/2014 foi apresentado pelo deputado federal Ricardo Izar (PSD-SP) em maio, semanas após o linchamento. De lá para cá, só uma movimento aconteceu com o texto: foi designado um relator para dar um parecer na Comissão de Constituição e Justiça. Não há previsão de quando ele poderá ser votado.

Embora tenha responsabilizado cinco pessoas, a investigação da Polícia Civil foi incapaz de identificar outras dezenas de moradores que aparecem nas filmagens batendo em Fabiane. Jair Batista dos Santos foi identificado como sendo o homem que faz um “interrogatório” da vítima, perguntando se ela era a criminosa cujo retrato falado ele vira na página do Facebook. Ele também foi visto jogando o corpo de Fabiane em um córrego, segundo a denúncia apresentada pelos promotores Samir Chukair da Cruz e Carlos Eduardo Perez Fernandez.

Lucas Rogério Fabrício Lopes, o “Lagartixa”, bateu com a roda da bicicleta na cabeça da vítima. Com Abel Vieira Batalha Junior, o Pepê, ele amarrou o pulso de Fabiane com um fio de eletricidade e arrastou a mulher pelo chão. Carlos Alex Olveira de Jesus, o Pote, chutou a cabeça da dona de casa. Com outro fio, ele amarrou as pernas de Fabiane e, puxando-a pelos cabelos, levantou sua cabeça e a atirou ao chão.

O último denunciado pelo Ministério Público é Valmir Dias Barbosa, que foi flagrado nas imagens publicadas na internet dando uma paulada na cabeça de Fabiane.
Imprimir