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Brasileiro preso na Indonésia via perigos imaginários, diz voluntária

G1


Uma moradora de Santos, no litoral de São Paulo, morou na Indonésia, entre 2006 e 2007, realizando trabalho de atendimento social voluntário por cerca de seis meses aos dois brasileiros condenados por tráfico de drogas naquele país. Um deles, Marco Archer, foi fuzilado no último sábado (17). Já Rodrigo Gularte, de 42 anos, está no corredor da morte aguardando uma data para ser executado.

Fabiana Mesquita, que é educomunicadora, profissional que usa o diálogo como forma de contribuir com a educação, conversou com oG1 e falou sobre o comportamento e rotina deles dentro da prisão. Ela afirma ser contra a pena de morte e diz que ainda acredita na libertação de Gularte. "Isso não era nem parte do meu trabalho, era uma coisa de compaixão, mas é uma pena ainda maior porque umaprisioneira australiana foi liberada e eles não", comentou após saber da decisão do Governo da Indonésia de rejeitar o pedido de clemência feito Itamaraty, divulgado na última terça-feira (20).

Fabiana conta que fazia visitas semanais e passava as tardes na carceragem após viagens de até 3h em direção ao local. Ela acredita que Gularte tenha problemas mentais e que uma psicóloga poderia ter ajudado a mudar o rumo dos fatos. “Imagino que Rodrigo devia ter problemas mentais desde cedo. Infelizmente o preconceito com essa questão leva as pessoas a protelarem o pedido de ajuda. Com ajuda psicológica isso tudo talvez pudesse ter sido evitado”, afirma.

A Embaixada Brasileira em Jacarta, capital da Indonésia, chegou a solicitar a presença de um profissional de psicologia no local após Rodrigo Gularte tentar suicídio. Como não houve voluntários, Fabiana decidiu se candidatar ao posto e auxiliar como 'ouvinte'. Fabiana tem experiência em trabalhos humanitários em Santos, junto a Agenda 21, Doutores da Folia, além da Cruz Vermelha. Ela também participou de missões contra a Aids no exterior acompanhando o marido nas Filipinas e Vietnã. "Essas experiências me deram a sensibilidade necessária para lidar com o assunto", afirma.

Fabiana destaca que, mesmo condenado à pena máxima em 2005 por ingressar na Indonésia com seis quilos de cocaína escondidos em pranchas de surf, Gularte demonstrava esperança e era instável. “Um dia estava cheio de esperança, fazendo planos, no outro estava cheio de patuás (santinhos) amarrados pelo corpo para protegê-lo de algum perigo imaginário que rondava sua cela”, conta.

Segundo a educomunicadora, os dois brasileiros tinham perfis distintos. Enquanto Gularte era ‘doce’ e ‘amigável’, Archer era ‘um cara difícil’. “A relação com o Marcos era muito pequena. Ele não fazia questão de muito contato, nem de conversa, nem de companhia. Ele criou uma rede de amigos dentro da cadeia e preferia estar com eles. O Marcos não era um cara fácil. Exigente, vivia reclamando e acusando o governo por sua situação”, comenta.

Ela acrescenta ainda que várias vezes se sentiu mal na presença dele, mas o trabalho de levar uma palavra de amparo e conforto aos presos era o objetivo em mente. “Às vezes eu me sentia bem mal com a maneira como ele me tratava. Mas então lembrava que estava ali para amar e não para ser amada, para ajudar e não para ser ajudada”, revela.

Já no caso de Gularte, Fabiana reafirma a importância da presença de uma psicóloga para ajudar a entender os motivos que o levaram até a prisão. “Desde o primeiro minuto não entendi o que levou o Rodrigo a fazer o que fez. O que eu sentia é que ele queria ser ouvido. Ele nunca se envolveu com os bandidos da cadeia”, destaca.

Fabiana relata que o brasileiro frequentava diariamente cultos evangélicos e desenvolveu um ‘profundo senso de arrependimento’. De acordo com a voluntária, Gularte dizia que queria uma chance para trabalhar com juventude, mas também dizia que estava pronto para seu encontro com Deus. “A habilidade emocional do Rodrigo era imensa”.

Trabalho social
Mesmo diante da sensação de perigo constante de permanecer em um local com acusados de crimes civis e ideológicos, ela conseguiu criar uma relação de lealdade e desenvolver seu trabalho. “Nunca houve nenhum incidente. Fora a revista que era um pouco constrangedora, tudo valia a pena. Eu só queria dar aquele momento meu para aliviar o sofrimento deles. Quando fui ao presídio pela primeira vez, imaginei aquele corredor da morte de filme americano. O que encontrei foi uma cadeia que mais parecia uma escola, do ponto de vista de configuração física”, destaca.
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