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Paralisação em antiga mina de Eike faz cidade do AP viver crise financeira

G1

Com expectativa de gerar seis milhões de toneladas de ferro em 20 anos, a extração do minério em Pedra Branca do Amapari, a 183 quilômetros de Macapá, parou antes mesmo de completar uma década após a primeira exportação, realizada em 2007. Restou à pequena cidade no meio da selva amazônica cultivar o saudosismo do auge da mineração, atividade iniciada pelo empresário Eike Batista e atualmente administrada pela Zamin Amapá, multinacional indiana. A interrupção nas minas gigantescas abertas no solo aconteceu em 2014 por causa do desabamento do porto que escoa a produção e resultou em consequências negativas ao município, principalmente na economia.

O G1 viajou para a região e ouviu os relatos de quem investiu tudo no sonho do "eldorado amapaense".

O "boom" econômico vivido por sete anos em Pedra Branca do Amapari levou vários imigrantes para região, provocando crescimento populacional de 4,2% ao ano, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE),  que estima 13 mil habitantes no município. O número triplicou ao registrado em 2000, antes da extração de ferro nas minas. Eram apenas quatro mil habitantes naquele ano.

Com a paralisação da extração de ferro, moradores relatam a mudança na rotina da cidade por causa da saída de pessoas que trabalhavam na região e empresários mostram insatisfação pela queda nas vendas do comércio. A prefeitura de Pedra Branca do Amapari também foi afetada com perdas na arrecadação de impostos.

O motivo para mudança repentina na cidade ainda é resultado do desabamento do porto particular da mineradora Zamin Amapá, em Santana, a 17 quilômetros de Macapá. O terminal era a única saída do minério para exportação. O acidente, em março de 2013, deixou quatro mortos e dois desaparecidos. A empresa diz que investiu R$ 300 milhões na reconstrução do porto, mas não informou data para conclusão da obra, alegando “fatores externos para demora”.

Um ano depois do desabamento, a Zamin anunciou a interrupção das atividades na mina localizada no município amapaense por causa do “término da capacidade de estocagem de ferro, tanto em Pedra Branca quanto em Santana, e o atraso nas obras de reconstrução do terminal de embarque de minério".

A medida causou a demissão em massa de dois mil funcionários, segundo a própria mineradora. Um deles foi Jhonathan Rocha, de 24 anos. Morando em Pedra Branca do Amapari desde 2012, o jovem natural de Itaituba, no Pará, buscou nas minas amapaenses a chance de ganhar dinheiro com o minério. Ele ainda trabalhou por dois anos como controlador de materiais no almoxarifado. Depois de duas promoções no emprego, o sonho de alcançar cargos mais altos foi interrompido com a paralisação da empresa.

“Nem se compara o salário de quando eu trabalhava na mineradora com o que ganho agora no comércio”, disse Jhonathan Rocha. Depois da demissão, ele passou a atuar como vendedor em uma pequena loja de eletrônicos em Pedra Branca.

Além da mudança de emprego, também teve o impacto financeiro, passando a receber R$ 400 mensais ante ao R$ 1,2 mil pago pela mineradora. O dinheiro é usado para sustentar as duas filhas, de 2 e 5 anos, e a esposa, que conheceu em Pedra Branca do Amapari. “A gente dá um jeito no orçamento”, brinca o vendedor na cidade que em 2012 registrou a maior renda per capita, com R$ 22 mil.

'Janelas fechadas'
O ex-servidor da Zamin não foi o único a tentar a sorte no “eldorado amapaense". Vários comerciantes de outras regiões se instalaram em Pedra Branca do Amapari para aproveitar as “janelas de oportunidades”, bordão econômico usado para destacar o momento propício de certa atividade. Poucos empreendimentos, no entanto, resistiram quando as "janelas" fecharam.

Não é difícil andar pela cidade e encontrar estabelecimentos trancados em horários comerciais. O declínio na economia afetou todos os ramos – desde o de alimentação até a hospedagem, passando pelos varejistas e o da construção civil.

O comerciante Edinaldo Alves, de 30 anos, largou os estudos há três anos para montar um comércio com o pai. O movimento dos dias atuais, segundo ele, não se compara ao vivido antes da paralisação da extração de ferro no município amapaense. O faturamento diário no estabelecimento passou de R$ 2 mil para R$ 200, gerando demissão de funcionários.

Não é difícil andar pela cidade e encontrar estabelecimentos trancados em horários comerciais. O declínio na economia afetou todos os ramos – desde o de alimentação até a hospedagem, passando pelos varejistas e o da construção civil.

O comerciante Edinaldo Alves, de 30 anos, largou os estudos há três anos para montar um comércio com o pai. O movimento dos dias atuais, segundo ele, não se compara ao vivido antes da paralisação da extração de ferro no município amapaense. O faturamento diário no estabelecimento passou de R$ 2 mil para R$ 200, gerando demissão de funcionários.

Outro ramo econômico afetado de forma mais intensa em Pedra Branca do Amapari foi o de hotelaria. Com trabalhadores naturais de outras regiões do Amapá e do país, empresários locais investiram milhões para levantar empreendimentos que serviam de alugueis a funcionários da Zamin Amapá.

O caso mais emblemático é do empresário Ocir Lobato, de 53 anos. Ele disse ter desembolsado R$ 4 milhões na construção do maior hotel da cidade. O prédio foi erguido em onze meses com 92 quartos, todos com banheiro, acabamento em porcelanas, ar-condicionado, internet e TV a cabo. A área interna do hotel também contava com restaurante próprio. Tudo encontra-se sem uso.

"Eu tinha todos os quartos alugados, com valores que chegavam até R$ 1,5 mil por mês. Agora, com a saída da empresa, não consigo nem por R$ 300", lamentou Lobato, que disse ter lucrado até R$ 100 mil mensais com os alugueis aos trabalhadores.

Hoteis mais modestos também foram afetados. O empresário Ruy Lobato, de 69 anos, vive o mesmo drama. Com um prédio de 32 quartos, o empreendimento não passa de quatro ocupados diariamente. "Quando a mineradora atuou aqui foi o melhor período do meu negócio", lembra.

Impacto na administração
A extração de minério de ferro rendeu frutos a Pedra Branca do Amapari durante o período de atividade das empresas, elevando a economia do município para a quinta maior do estado entre os maiores valores do Produto Interno Bruto (PIB) das 16 cidades do Amapá. O último dado divulgado pelo IBGE refere-se a 2012 e calcula que o município teve R$ 269,9 milhões em riquezas no ano.

A atividade mineral tornou-se o "carro-chefe" da arrecadação municipal, representando a maior parcela do PIB de Pedra Branca do Amapari, com 34,88%.

De acordo com o prefeito Genival Gemaque (PR), a principal queda econômica aconteceu no Imposto Sobre Serviços (ISS) e no de Compensação Financeira Sobre Produtos Minerais (Cefem). Os tributos geravam receita acima de R$ 1 milhão mensais a cidade, que ainda tem 78,4% das ruas com esgoto a céu aberto e um Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) calculado em 0.626, abaixo da média nacional de 0.727.

Pouco tempo depois da Zamin anunciar paralisação, a prefeitura de Pedra Branca do Amapari reduziu em 30% o salário dos cargos comissionados dos servidores municipais. O corte resultou na economia de R$ 137 mil por mês. O salário do prefeito, por exemplo, passou de R$ 12 mil para R$ 8 mil. "Tomamos essa medida para não demitir e assegurar o pagamento do salário", disse Gemaque.

Império “X” na selva
O sonho de muitos em Pedra Branca do Amapari foi motivado por Eike Batista, empresário que à época ocupava a lista dos homens mais ricos do mundo. Ele ergueu a estrutura em apenas 15 meses no meio da selva amazônica, batizando a mina de Sistema Amapá, administrada pela MMX. Os investimentos da empresa renderam até o título de cidadão amapaense a Eike Batista.

Apesar dos investimentos, a MMX anunciou a venda do Sistema Amapá em Pedra Branca do Amapari um mês depois da primeira exportação, em dezembro de 2007. O complexo da mineração incluía uma mina, a Estrada de Ferro do Amapá (EFA) e um terminal portuário em Santana.

A Anglo American comprou o controle do Sistema Amapá por 5,5 bilhões de dólares, a maior aquisição realizada pela mineradora no país. Quatro anos depois, o empreendimento foi adquirido pela Zamin Amapá, por 136 milhões de dólares. A intenção da empresa indiana era triplicar a produção no Brasil, mas atualmente, a mineradora está com os maquinários parados e com o pátio comportando montanhas de ferro em Pedra Branca do Amapari e Santana. Além de acumular dívidas milionárias. A última trata de um empréstimo de 136 milhões de dólares com um banco italiano, dando como garantia a estrada de ferro.

Em nota, a Zamin Amapá negou a hipoteca da ferrovia e sobre possíveis retornos das atividades afirmou que "encontra-se em entendimentos com o Governo do Estado" e "conta com o apoio dos setores envolvidos na atividade de mineração, inclusive no que diz respeito ao transporte ferroviário". Apesar do comunicado, a mineradora não informou prazos.
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