Marie Claire
O controle de alimentação, calorias e exercícios é o que diferencia uma grávida anoréxica daquela naturalmente magra. Um referencial mais exato pode estar no IMC (Índice de Massa Corporal).
“Quando ele está abaixo de 18,5, é sinal de desnutrição. Neste caso, a recomendação é de um ganho de peso em torno de 12,7kg a 18kg. Mas também não quer dizer que uma pessoa com um índice maior não vá ter grandes problemas de transtorno alimentar”, esclarece a psicóloga.
Ela explica, ainda, que desenvolver algum distúrbio só durante a gestação é raro. Na verdade, o histórico de anorexia ou bulimia pré-gravidez pode contribuir para o quadro durante a gestação. O que acontece, segundo Irema, é que, em alguns casos, a patologia existiu, mas nunca foi diagnosticada. E daí a futura mãe pode ser surpreendida de alguma forma.
“Essas mulheres tendem a comer exatamente aquilo que o médico sugere, nenhum grama a mais. Eu já vi paciente emagrecer, engordar só três quilos ou então engravidar pesando apenas 34kg. Essas jamais vão se adaptar nutricionalmente para a vinda do bebê. Elas vão é fazer muito exercício físico”, diz Irema.
A especialista também descarta que os distúrbios possam aparecer em alguém sob influência de grávidas saradas ou famosas magras. “Isso só acontece se as seguidoras ou admiradoras tiverem tendência a apresentar algum distúrbio psicológico.”
Para Irema, a anorexia é um mal-estar muito mais profundo do que a simples questão de querer se adequar a certo padrão de beleza. “É muito mais sobre não querer ter aquele corpo de mulher, mais profundo do que querer parecer uma modelo de capa de revista.”
Na verdade, o quadro se manifesta como uma forma de controlar tudo aquilo que ela puder – corpo e alimentação -, quando não é possível dominar algum conflito interno. "É exatamente por isso que ela acontece, principalmente, na gravidez e na adolescência – dois momentos de transição significativos", diz.
BENEFÍCIOS DA ATIVIDADE FÍSICA EM GRÁVIDAS
Coordenador do Centro de Medicina do Exercício e do Esporte do Hospital Nove de Julho, o médico Ricardo Nahas não vê maiores problemas em que mulheres já ativas continuem a praticar atividades físicas durante a gravidez, desde que a gestação seja normal e sem riscos.
Para ele, a prática de algum tipo de ginástica irá auxiliar a futura mãe a lidar com as mudanças corporais. "O trabalho aeróbico é importante à medida em que a gravidez avança, assim como exercícios de postura, pois existe uma mudança no centro de gravidade. A gestante, às vezes, sente dor nas costas pela necessidade de compensar a nova postura", afirma.
O que deve ser levado em conta, na opinião do médico, é a diferença entre a energia gasta com as atividades e o total ingerido por meio da alimentação, pois o bebê necessita dessa energia para se desenvolver. Daí a necessidade dos exames feitos pelo obstetra para verificar se o tamanho e peso da criança estão normais. "Conforme o bebê vai ganhando volume, exige-se mais demanda. [A grávida] vai ter que adaptar o exercício à sua situação."
Atividades de alto impacto, no entanto, devem ser evitadas, segundo Nahas. "O que a gente tem certeza é que exercícios de luta devem ser evitados. A partir do sétimo mês, a literatura sugere que os esportes aquáticos também deixem a ser feitos. A água poderia fornecer alguma contaminação para o bebê."
Tomadas estas precauções, ele lembra que a gestação, para mulheres que levam uma vida saudável, tem a ver com adaptação, e que depois poderá retomar suas atividades aos poucos. "[A gravidez] não exige grandes mudanças e neuroses; depois de nove meses a gestante terá a rotina normal de volta."
Para a psicóloga Irema Barbosa Magalhães, o sinal de alerta surge quando a gravidez não muda muito o corpo da futura mãe, que pode desenvolver um problema na construção da identidade materna. “A grávida anoréxica não se depara com uma mudança de vestuário e a barriga não cresce tanto. Além disso, elas falam pouco com o bebê, como uma maneira de praticamente negar a gravidez. Então, fica muito complicado para ela se reconhecer como mãe.”
O problema, ela diz, pode se estender à relação com o filho, uma vez que 70% das mulheres que apresenta um quadro de anorexia na gravidez desenvolve depressão pós-parto.
A maioria dessas mães, afirma, não consegue amamentar e se relaciona com os pequenos de maneira fria. A criação é deixada em segundo plano. “Eu já ouvi algumas dizerem, ‘Se estou fazendo bicicleta indoor e o bebê está chorando, eu não vou parar o meu exercício para ir até ele’.”, conta a especialista que também participa de grupos de discussões formados por mães anoréxicas e bulímicas.
A mãe anoréxica costuma ser mais rígida e transmitir pouco afeto; enquanto a bulímica cria uma confusão de limites, ora dando muito, ora oferecendo pouco aos filhos, assim como a relação que estabelecem com os alimentos.
Como consequência, quase 100% dos bebês nascem com peso e estatura abaixo do normal, nesses casos. Por conta do risco de o bebê não conseguir crescer dentro do útero, a maioria dos partos precisam ser adiantados. “Existem casos gravíssimos de mães que não podem sair da cama, de tanto exercício que praticam. A prática intensa faz aumentar as contrações. Então, o bebê tem grandes chances de nascer prematuramente.”
E, quando crescidos, os filhos sempre percebem que as mães sofrem de algum problema alimentar, segundo Irema. Isso porque a alimentação regrada acaba sendo transferida para a rotina deles. “Elas impedem que os filhos comam fast food, controla tudo o que eles ingerem e, em alguns casos, querem comer menos do que eles. Pesá-los com frequência é outra prática constante. E se a filha é menina, esse controle tende a ser ainda mais intenso.”
Por isso, Irema alerta sobre a importância do acompanhamento médico. “Normalmente, essas musas fitness não menstruam devido ao excesso de exercícios. O endocrinologista precisa saber disso e também perguntar sobre algum histórico de transtorno alimentar assim que ela explicitar o desejo de engravidar.” Se esse quadro existiu ou ainda existe, entra em cena a importância de ser acompanhada por uma equipe multidisciplinar formada por psicólogo e psiquiatra, que ajudam a fazer a gravidez evoluir da melhor maneira possível.
*Colaborou Thiago Baltazar