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Do comércio à criação de aplicativos, crianças se jogam no mundo dos negócios e ficam milionárias

R7

Uma loja de balas, bolas de gude, produtos de beleza, roupas ou mesmo criação de aplicativos. Não importa o tipo de negócio em que uma criança queira investir, ele sempre será uma boa ideia, a menos que o desejo de empreender ou o foco do empreendimento não tenham partido do filho, e sim de seus pais.

É o que explica a consultora financeira Cássia D’Aquino, autora de livros como Como Falar de Dinheiro com Seu Filho e Ganhei um Dinheirinho, o que Eu Posso Fazer com Ele?, e que é favorável ao que ela chama de “micro-micro-negócios”, mas sempre com moderação.

— Todo negócio em que a criança é só o veículo de distribuição ou atenção vai trazer malefícios para ela. Vejo com atenção estes casos que tomam um corpo enorme, crianças ganhando milhões. De maneira geral, as crianças têm este espírito empreendedor. Todo mundo brincou de lojinha na infância, fantasiou um comércio, fez algo para vender na escola. É algo comum, mas isso não significa que todos que fazem isso vão crescer e virar empresários.

Mãe de uma empreendedora mirim, a contadora Raquel Barrios, de São Caetano do Sul (SP), sempre estimulou a filha Renata, de sete anos, a seguir o desejo que tinha desde muito nova de comercializar suas obras de arte.

A garota, que adora desenhar e sonhava em mostrar suas criações para o mundo, pediu à mãe, em 2014, para abrir uma loja virtual, em que seus desenhos fossem expostos e colocados à venda. Em um ano, mais de 300 desenhos já foram comprados, cada um custando R$ 2.

A mãe, que administra a página e o dinheiro que ela gera, conta que a família já recebeu propostas para associar a arte de Renata a linhas de produtos, como canecas e camisetas comerciais. No entanto, todos os projetos foram recusados por Raquel, que teme que o negócio extrapole o campo da brincadeira e do aprendizado para se transformar na exploração do trabalho de uma criança.

— Não ganhamos dinheiro nenhum com a loja. Não quero ter que um dia precisar me defender de acusações de que exploro minha filha. Não sei como ela vai querer conduzir isso quando crescer. Se quiser se tornar profissional com os desenhos, e receber propostas, aí vai poder decidir por ela mesma.

Cássia D’Aquino enxerga a possibilidade de ensinar às crianças valores não só financeiros, mas também humanos, como o maior ponto positivo do empreendedorismo na infância

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Para a consultora, é uma ótima oportunidade para mostrar como se calcula o valor de um produto, qual a melhor maneira de promovê-lo, e especialmente princípios éticos, como, por exemplo, como se deve tratar os clientes.

— É uma chance para apresentar a ideia de que, se prometemos entregar alguma coisa, temos que cumprir com a promessa. É uma maneira de fazer a criança perceber o capitalismo de uma maneira completamente diferente. Por isso, não vejo razão para que os pais não tirem o maior proveito disso. É preciso apenas ficar atento à perspectiva que se vai atribuir a essa experiência da criança. Se os pais ficarem siderados com questões como quanto se está ganhando, ficar pensando no lucro, isso será uma deformação do negócio.

E mesmo aquelas crianças que não se interessam pelo mundo dos negócios nem nas brincadeiras podem — e devem, segundo Cássia — ser doutrinadas financeiramente, tudo de maneira lúdica e sem cobranças.

Uma excelente ideia é começar com ações do dia-a-dia, como, por exemplo, a confecção da lista do supermercado. Cerca de 80% da população brasileira não faz um levantamento do que falta em casa antes de partir para as compras. Para a consultora, isso denota às crianças uma desorganização perigosa no trato com o dinheiro.

— Os pais estão passando a ideia de que em casa lidamos com o dinheiro no improviso. É possível pedir o auxílio dos filhos para fazer a lista. Mesmo uma criança de três anos já consegue ajudar. Ela pode, por exemplo, verificar se acabou o sabonete. E, no mercado, ser avisada de que ela é a responsável desta vez por procurar e escolher este produto. Com isso, ensinamos que há um plano antes das compras.

Pais muito obcecados com dinheiro, que comentem com frequência sobre o quanto anseiam por trocar de carro, viajar e consumir passam aos filhos à imagem de um núcleo que vive em torno de algo que deveria ser, nas palavras de Cássia, apenas um ator coadjuvante, e não o grande astro.

Famílias que, por sua vez, convivem em um ambiente sempre cercado pela incerteza e instabilidade financeira, em que se comente o tempo todo sobre as dificuldades para pagar as contas no fim do mês, também enviarão aos pequenos sinais de que o dinheiro é um problema.

— Tanto alguém fixado quanto alguém que trata o dinheiro com irresponsabilidade mostram que falta alguma educação para esse assunto. A percepção dos filhos acerca do dinheiro virá do exemplo dos pais, podendo ser uma reprodução imediata. Como em tudo, a virtude está no meio. O ideal é mostrar para a criança que dinheiro tem, sim, importância, mas que isso não é o assunto principal.

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