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Notícias / Picante

Sem sigilo

Da Redação

Olhar Jurídico, editoria do portal Olhar Direto responsável por cobrir o que há de mais relevante na Justiça de Mato Grosso, surpreendeu-se negativamente com a Vara de Execuções Penais do Tribunal de Justiça deste Estado. É público e notório a relevância social desta Vara e do processo envolvendo a soltura do ex-bicheiro João Arcanjo Ribeiro, após 15 anos de prisão. Com código 145560/Cuiabá Criminal, a ação que deferiu a libertação do Comendador é pública e por tanto acessível a todo cidadão de bem, portador de um CPF. Ao menos deveria ser. A reportagem tentou acessar os volumes da ação (pastas contendo o inteiro teor do processo), mas foi impedida por decisão do juiz responsável, Jorge Luiz Tadeu Rodrigues, conforme informou a assessoria do II Gabinete daquela Vara. Os autos só seriam acessíveis ao repórter se houvesse “um servidor do lado, fiscalizando"; “por uma questão de cuidado”; para evitar que “suma algum papel” ou que amanhã "todos da imprensa" exijam o mesmo direito. Mesmo constrangida, a reportagem solicitou agendamento para a tal visita “fiscalizada”. Nenhuma data foi oferecida. Conforme informado, o processo no momento se encontra acessível apenas “para as partes”. Logo, conclui-se que o único caminho seria recorrer ao advogado que tem acesso aos autos, para solicitar cópia. Ocorre que uma das partes é justamente o Ministério Público Estadual (MPE), representante legal da sociedade (e portanto do cidadão) em todo e qualquer processo, sobretudo o criminal. Não há meio termo: ou uma ação é sigilosa ou é pública, e se é pública, é aberta, acessível, sem subterfúgio, sem "jeitinho brasileiro".
A desembargadora do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,  Suzana Camargo, deixou clara sua posição sobre isso em  agosto de 2005 (2004.03.00.008540-9 MS 256719). "Prevalece, como regra geral, o princípio da publicidade dos autos. Só cabe sigilo em processos que invadam a intimidade das partes, conforme estabelecido em lei". Ora, não estamos falando de prejuízo à intimidade, nem mesmo à eventual investigação, que se poderia alegar caso concedido fosse, à imprensa, acesso aos autos. Estamos falando de uma decisão que já ocorreu, de uma soltura que já foi cumprida, de um cidadão que já pagou por seus crimes. Simples. Diz a Lei 2.848 de 1940: “A ação penal é pública, salvo quando a lei expressamente a declara privativa do ofendido. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)”. É necessário acrescentar que não estamos a fazer qualquer juízo de valor à conduta de magistrado "A" ou "B" ou de servidor público, que (muitas vezes constrangido) cumpre apenas as ordens dos seus superiores. Trata-se de reivindicação cara à imprensa (que tanto lutou na história deste país pela liberdade que hoje desfruta [ou deveria desfrutar]): respeito ao princípio da publicidade dos fatos, daquilo que é de interesse público, bancado com dinheiro público e, por fim, ao princípio da presunção da inocência - inclusive de repórter durante processo de apuração (por mais inconvenientes que muitas vezes sejamos [é nossa função]). Como afirmou temer a Vara, é possível que amanhã "toda a imprensa" queira acesso àquilo que Olhar Jurídico quis. Sim, é bem possível e que bom que assim seja, pois é desta forma que exerceremos a imprensa livre e a justiça transparente. Caso contrario, a justiça impede a imprensa de apurar. E amanhã, a impedirá de noticiar?
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