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Cartazes contra disciplina de empreendedorismo são espalhados na UFMT e professores entram em desacordo

Da Redação - Vinicius Mendes

Cartazes da Associação dos Docentes da Universidade Federal de Mato Grosso (Adufmat) se espalharam pelo campus de Cuiabá. Em favor da pauta dos estudantes contra o aumento do preço do Restaurante Universitário (RU) e contra a implementação da disciplina de empreendedorismo na universidade gerou controvérsia. Alguns professores se posicionaram contra o cartaz e pedem o fim da greve estudantil. A Adufmat afirmou que existe um contexto por trás do posicionamento contra a implementação da disciplina e afirmou que é a favor da pauta dos estudantes.
 
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O vice-presidente da Adufmat, o professor Maelison Silva Neves, disse que existe todo um contexto por trás do motivo para serem contra a implementação da disciplina de empreendedorismo em todos os cursos da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT).

Segundo ele, tem que ser levado em consideração o sucateamento da UFMT, que gerou a greve de 2015 e em seguida a ocupação dos estudantes em 2016, contra a Proposta de Emenda Constitucional 55 (PEC 55), que acabou se tornando a Emenda Constitucional 95, sobre a limitação de gastos. “A universidade está sofrendo sistematicamente, e agora está numa fase aguda, corte de gastos. Este é o cenário”, disse o professor.

O professor disse que há alguns anos a gestão da Universidade vem inserindo um projeto para fomento do empreendedorismo na UFMT. A princípio com os professores.
 
“De um tempo para cá, desde as gestões anteriores também, a partir do Núcleo de Inovação Tecnológica, a universidade tem utilizado uma campanha, um projeto de fomento do empreendedorismo dentro da universidade, oferecendo cursos para os professores, seminários, debates, e dentre estes debates surgiu a proposição de se incluir a disciplina de empreendedorismo nos cursos de graduação da universidade”.

Neves explica que a crítica não é com relação à disciplina já oferecida por alguns cursos, mas som com o projeto de trazer o empreendedorismo como projeto pedagógico, para o projeto de educação da Universidade em geral.

“A gente avalia que o recurso ao empreendedorismo tem sido utilizado como uma estratégia para se fomentar uma cultura privatista no âmbito da universidade em que, os professores ‘aprendendo a serem empreendedores’, começam a pensar seus projetos numa lógica de negócios, uma perspectiva mercadológica dentro das relações de trabalho da universidade, envolvendo inclusive a formação de nossos estudantes, então é diante disso que a gente se contrapõe, porque nós entendemos que isto vai contra os valores da universidade pública, gratuita, autônoma, socialmente referenciada, laica e todos estes valores de uma universidade pública que é uma instituição construída pela sociedade brasileira e mantida a duro esforço, que correm o risco de desaparecer”.

A professora Cecília Arlene Moraes, da Faculdade de Administração e Ciências Contábeis da UFMT, é uma das que se posicionou contra os cartazes. Ela afirma que há um equívoco com relação à disciplina.

“A disciplina de empreendedorismo é para impulsionar o desenvolvimento socioeconômico, e ela já existe no curso de administração, é uma disciplina regular, e em várias universidades federais ela é oferecida a todos os cursos. O empreendedorismo é uma atitude de identificar problemas da comunidade, do cotidiano e apresentar soluções. Então ser contra é uma visão míope”.

O professor Maelison Neves diz que com este cenário, da aplicação da Emenda Constitucional 95, a falta de recursos poderia justificar a privatização da UFMT.

“É neste cenário que a gente está discutindo empreendedorismo e se contrapondo a ele. Porque a aplicação de uma cultura organizacional empreendedora em uma universidade pública, legitima a interferência do mercado dentro das relações de trabalho e estudo da universidade, favorecendo uma privatização por dentro, e nós não acreditamos que a privatização da universidade seja a solução”.

Já Cecília reforça que a disciplina, na realidade, pode ajudar a solucionar problemas da sociedade e não deve ser vista com maus olhos.

“Problema é o que não nos falta, esta juventude é quem tem que se debruçar, pesquisar, para solucionar, nós precisamos avançar. Então não tem nada a ver com ideologia, de privatizar a universidade, isto é uma ideia equivocada, mas tem pessoas que pararam no tempo, temos que respeitar isso, agora impor e dizer isso no nome de todos os professores é uma inverdade”.

O vice-presidente da Adufmat de defendeu dizendo que a intenção do cartaz não é ir contra o empreendedorismo em si, apenas contra a prática dentro da universidade.

“É claro que muitos estrategicamente vão usar o argumento de que a gente é contra as pessoas abrirem o seu próprio negócio, num momento de crise, abrir um carrinho de pipoca, uma barraca de baguncinha, uma pequena empresa, mas não se trata disso. A gente não está querendo interferir no que acontece lá fora, a gente está querendo interferir no que acontece aqui dentro, que tipo de formação nós daremos aos nossos estudantes, que seja uma formação efetivamente crítica e que não seja tutelada pela lógica privatista do mercado”.
 
Greve dos estudantes
 
Outro ponto citado nos polêmicos cartazes é com relação ao apoio à pauta dos estudantes, que deflagraram greve, contra o aumento nos preços do RU. Neves afirmou que a Adufmat não vai interferir sobre os processos da greve, dando autonomia aos estudantes, mas que apóia a pauta.

“Quando nós olhamos para a pauta de reivindicações que os estudantes colocam, quando nós avaliamos o processo de negociação, a Adufmat, enquanto diretoria, tem se posicionado a favor da pauta dos estudantes, inclusive entendendo que as estratégias de negociação utilizadas até agora pela reitoria foram estratégias de divisionismo do movimento estudantil e não apresenta uma resposta concreta”.

Um dos pontos que a Associação apóia é com relação ao fim da terceirização do Restaurante Universitário, que poderia trazer alternativas à solução do problema.

“Quando a universidade assume a administração do Restaurante Universitário, acaba com o contrato de terceirização, ela tem um corte de custos considerável porque não tem mais a mediação do lucro, porque a atual empresa não está fazendo caridade, ela lucra com isso e não é pouco, e este lucro poderia ser revertido para baratear os custos com alimentação, entre outros aspectos”.

Já a professora Cecília é uma das que é contra a continuação do movimento de greve. Ela disse que muitos alunos têm sido prejudicados e que a reivindicação pela permanência do preço do RU em R$ 1 é um pretexto ideológico comunista.

“Alguns alunos perderam o estágio já em algumas empresas, então está prejudicando vários alunos que querem estudar. O RU a R$ 1 é pretexto de uma imposição ideológica comunista e aí a gente vê que se comunismo fosse bom os venezuelanos não estariam aqui pedindo abrigo, então significa que o movimento socialista não é bom”.

Moraes ainda afirmou que acredita que o movimento tem sido financiado por alguém de fora e questionou vários gastos por parte dos estudantes que ocupam o campus.

“Eu acredito que eles estão sendo financiados, porque repare, quem não tem dinheiro para pagar R$ 1 em um prato de comida não teria dinheiro para pagar R$ 4 numa coca-cola e nem em uma latinha de cerveja, então não faz sentido isso. Existem algumas barracas de primeira linha por lá, com qual dinheiro conseguiram aquelas barracas? Quem paga os cartazes? As comidas?”.
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