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Relator propõe ação penal contra Azeredo por mensalão; STF retoma julgamento amanhã

Folha Online

O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Joaquim Barbosa pediu nesta quarta-feira a abertura de ação penal para investigar o senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG) pelo crime de peculato --caracterizado quando funcionário público se apropria de recursos públicos utilizando o cargo.

No entanto, Barbosa --que é o relator do chamado mensalão mineiro-- ainda não concluiu a apresentação de seu voto e pode aceitar outra denúncia contra o tucano por lavagem de dinheiro.

O julgamento foi suspenso e só deve ser retomado amanhã. Dez ministros ainda precisam apresentar seus votos. Para Azeredo se tornar réu é preciso que seis ministros votem pedindo a investigação.

Barbosa acolheu parcialmente a denúncia do Ministério Público Federal contra o tucano por suposta participação em um esquema de arrecadação ilegal de recursos para sua campanha de reeleição ao governo de Minas Gerais em 1998, o chamado mensalão mineiro. Ele é acusado de ter cometido por sete vezes o crime de peculato e seis o de lavagem de dinheiro.

"A meu ver tratam-se de indícios da prática de peculato, planejada pelo acusado [Azeredo]. A ordem partiu de autoridade de alto escalão do seu governo. As estatais que deram recursos eram politicamente controladas pelo acusado. Assim, conduta criminosa, autoriza seu recebimento em relação ao crime de peculato", disse.

No entendimento do ministro, os indícios são claros de que Azeredo "tinha conhecimento do desvio de recursos" e participou ativamente na criação de um caixa dois para sua campanha à reeleição.

Segundo a denúncia, foram desviados R$ 3 milhões --por meio de contratos de publicidade firmados com empresas como a Copasa (Companhia de Saneamento de Minas Gerais), Comig (Companhia Mineradora de Minas Gerais) e Bemge (Banco do Estado de Minas Gerais) pela SMPB, agência de Marcos Valério (apontado como o operador dos dois mensalões)-- para financiar a campanha de Azeredo.

O esquema envolveu patrocínio de três eventos esportivos, entre eles o Enduro Internacional da Independência, que recebeu R$ 1,5 milhão da Copasa e mais R$ 1,5 milhão da Comig. Dos R$ 3 milhões, apenas R$98 mil foram realmente aplicados no patrocínio, o restante foi parar nas contas das empresas de publicidade de Marcos Valério e na campanha de Azeredo.

O relator disse que chama atenção um recebido assinado pelo senador no valor de R$ 4,5 milhões ao publicitário Marcos Valério e que não foi contestado pela defesa do acusado.

"Ele [Azeredo] recebeu dinheiro para saldar compromissos diversos um montante de R$ 4,5 milhões em plena campanha. O recibo assinado pelo acusado Eduardo Azeredo. A defesa nada alegou sobre esse documento. Não há na defesa uma única palavra sobre esse documento, sobre esse recibo de R$ 4,5 milhões, citado expressamente na denúncia", afirmou.

Para tentar disfarçar o desfalque nas empresas do Estado, a operação contava com empréstimos fictícios feitos pela empresas de Marcos Valério no Banco Rural.

Segundo o relator, o mensalão mineiro foi planejado --que é considerado o embrião do mensalão federal, esquema organizado pelo PT de pagamento de propina em troca de apoio parlamentar e que transformou 39 acusados em réus.

"Os crimes ocorreram e foram planejados com antecedência pelo acusado [Azeredo]. Há indícios, ainda que provisórios, que apontam para a atuação dolosa de Azeredo. Fortes indícios da natureza criminosa da campanha. Os indícios de que o acusado tinha conhecimento do esquema e queria realizá-lo estão presentes na denúncia", disse.

Barbosa lembrou que houve uma curiosa ligação entre Azeredo e Marcos Valério, sendo que a campanha publicitária da candidatura do tucano foi feita pela empresa de Duda Mendonça, que participou da eleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2002.

"Em depoimento, Marcos Valério disse que não participou de nenhuma propaganda para a campanha, que teria sido feita pelo publicitário Duda Mendonça. Marcos Valério não tinha qualquer vínculo formal, legal com a campanha. O problema é que inúmeras testemunhas afirmaram que Marcos Valério era presença constante no comitê de campanha de Azeredo. Alguns documentos demonstram que Azeredo conhecia essa razão. Embora negue, indícios mostram que ele teria participado [do esquema de captação ilegal de recursos]", disse.

O Ministério Público denunciou outras 14 pessoas, entre elas o ex-ministro Walfrido dos Mares Guia e o próprio Marcos Valério. A pedido deste último, Barbosa decidiu em maio deste ano desmembrar o inquérito. Os demais acusados são processados na primeira instância.

Durante o julgamento, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, defendeu que o senador fosse investigado porque havia "certeza do crime e imputações veementes da autoria" em relação ao esquema de desvio de recursos.

"Todos os denunciados tinham consciência que a captação de recursos teriam como formado o quadro delituoso descrito que não teria tido sucesso sem a cúpula do governo de Minas Gerais e da campanha de reeleição de Azeredo. Foram empréstimos fictícios em favor da campanha cujo o implemento partiu de recursos públicos e de empresas privadas com interesses no Estados", afirmou.

Gurgel disse que ficou claro o envolvimento do comando da campanha do tucano com o publicitário Marcos Valério. "O senador e o comando da campanha mantinha intenso relacionamento com o núcleo que operou o esquema. Houve uma série de telefonemas a Marcos Valério. Foram 72 ligações, sendo 57 telefonemas do próprio Marcos Valério", disse.

O advogado de Azeredo, José Grossi, criticou a denúncia do Ministério Público. "Não diz onde, quando e de que maneira [os fatos ocorreram]. Leia e releia essa denúncia longa e confusa de se encontrar um fato que a justifique que seja recebida [a denúncia]", afirmou.

O Supremo analisa se a denúncia apresenta indícios de autoria e materialidade dos crimes apontados pelo procurador. Presentes os indícios, a denúncia é recebida e a Corte abre ação penal contra o investigado, que se torna réu. Se os ministros considerarem ausentes esses indícios, a denúncia é rejeitada e o inquérito é arquivado.
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